Criar uma experiência para que pessoas neurotípicas pudessem, de alguma forma, perceber o mundo a partir da perspectiva de crianças autistas. É essa a proposta da Casa dos Sentidos, exposição imersiva e interativa criada em 2015 que está em turnê pelo Brasil – até 21 de abril, mês de conscientizar as pessoas em relação ao transtorno do espectro autista, a parada é em Curitiba; em seguida vem Brasília – e será levada aos Estados Unidos e a Portugal no segundo semestre de 2024.

“A nossa intenção sempre foi trabalhar com a inclusão. Então, eu sonhei com esse projeto e surgiu a ideia de algo cultural que unisse a arte e a inclusão. Fomos buscar ferramentas e mecanismos que trouxessem essa aproximação com o público geral e encontramos: uma casa. Afinal, uma casa é um objeto que todos conhecem, que todos vivem, em que todos se reconhecem”, explica a idealizadora da exposição e diretora da Montenegro Produções, Carolina Montenegro.

Com isso em mente, Carolina foi atrás de artistas que tivessem trabalhos voltados para área da inclusão e, também, fossem especializados em cenografia, afinal, sua ideia era que a casa fosse cenográfica e interativa. Além disso, também buscou arquitetos para apoiar a materialização da proposta. “Fizemos uma curadoria e selecionamos quatro artistas, sendo cada um responsável por um cômodo, e os colocamos sob a supervisão de arquitetos para apoio”.

Para desenvolver a Casa e conseguir efetivamente transmitir a percepção das crianças no espectro autista, a Montenegro Produções realizou um extenso processo de pesquisa, a partir de vivências com crianças autistas. Essa etapa foi toda acompanhada por profissionais formados em psicologia, pedagogia, psicomotricidade, fonoaudiologia e terapia ocupacional e teve apoio de uma startup de medicina e testes genéticos para autismo, a Tismoo, e de um laboratório que investiga os mecanismos fundamentais para o desenvolvimento do cérebro e de transtornos como o autismo, o Muotri Lab, ligado à Universidade de San Diego, nos Estados Unidos.

“Na primeira edição, durante a imersão, estava o Gabriel, que tinha entre 5 e 6 anos. Na oficina de fotografia, eu espalhei alguns lápis de cor em cima da mesa, pedi para ele escolher o lápis que ele queria, e ele tinha uma polaroid na mão. Então, pedi para ele fazer uma composição fotográfica. Ele pegou três lápis coloridos, deixou de um lado, três coloridos deixou do outro e, no meio, ele colocou um lápis quebrado e tirou a foto. Na hora de explicar, ele falou que não é só porque o lápis está quebrado que ele não pode fazer parte ou que é diferente. Isso, para mim, foi o maior aprendizado de todos, sabe? O quanto essas crianças têm a nos ensinar”, relembra Carolina.

Essa troca de experiências não apenas inspirou a criação dos ambientes da Casa, mas também enriqueceu o processo criativo, permitindo que as vozes das crianças fossem ouvidas e representadas de maneira autêntica.

Desde o seu surgimento, em 2015, a Casa dos Sentidos tem evoluído e se tornado mais imersiva e cenográfica. Hoje, está em sua segunda edição – em que se destaca o espaço Cérebro, assinado pela artista Daniélle Carazzai e pelo arquiteto Givago Ferentz, que criaram uma estrutura com dados de pesquisa e referências sobre diagnóstico autista.

Ali, além de encontrarem informações científicas sobre o autismo, os visitantes são incentivados a buscar um diagnóstico correto, promovendo a conscientização e a compreensão sobre o transtorno.

Outro destaque é o Banheiro. “Nesta edição, o banheiro foi construído pela artista Aline Provensi, que também é psicóloga e autista. E ela explica que esse cômodo é o ambiente mais desconfortável para ela dentro de uma casa. Então, o que ela fez para transformar o ambiente dela num ambiente favorável e um pouco menos desconfortável foi focar na água, que é algo de que ela gosta muito”, explica.

Já a Sala de Estar é assinada pela artista Bruna Alcântara, que trabalha conceitos como memória afetiva. A cozinha é de Bruno Romã, que propõe uma interação sensorial e, por fim, o Quarto, de Marcella Callado, resgata o universo infantil dos sonhos.

A versão atual vem circulando pelo Brasil desde 30 de janeiro. A primeira parada foi em Campinas, em São Paulo, onde ficou até 23 de fevereiro. A segunda, Curitiba, de 29 de março a 21 de abril. Na sequência, vai a Brasília (de 10 a 30 de maio) e São Paulo (datas a confirmar). No segundo semestre, a turnê ganha o exterior e, em 2025, a terceira edição do projeto deve ser inaugurada.