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Meses de coragem

Nariz Solidário
Nariz Solidário
11/06/2024 14:28
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Por Palhaço Rosenvelt (Eduardo Roosevelt), Hospital Infantil
Estávamos na UTI pediátrica e aquele olhar grudou em mim, e da mesma forma foi levado à enfermeira que sutilmente acariciava o rosto do pequeno Enzo. Nos aproximamos lentamente, contemplando aquela cena digna de um meteoro em nosso peito.
Ele sentia dores e se esforçava para passar por tudo aquilo, com um olhar penetrante nos olhos daquela enfermeira que tocava seu cabelo e segurava seu queixo. Poucos anos, alguns meses e muita coragem.
Nós aqui, eles ali… Por pouco tempo, nós e muitos nós na garganta, enquanto nossa caixinha de música preenchia um espaço de tempo vazio na dor. Digno, Enzo não segurou uma lágrima. A lágrima escorria pelo seu rosto e me afogou.
Mergulhei naquele olhar pequeno e naquela relação de cuidar que assumia ali diversos papéis, uma delas, a figura materna, impressa na enfermeira trazendo segurança para aquele garoto. Fomos nos dis- tanciando, observando e reproduzindo a caixinha de música, deixando ela soar.
Depois de um certo tempo como palhaço, a gente se acostuma a estar no hospital, vai criando mecanismos sentimentais para estar íntegro para o outro, para estar atento o suficiente para contribuir com esse ambiente de forma sensível e com muita disposição, mas ali, naquele recorte, me vi pai e me vi Enzo.
A caminho de casa, do céu caiu um temporal que desabou sobre mim. Só não caiu aquela imagem. Um menino, uma grande luta, aquele cuidado da enfermeira, uma caixinha de música e dois palhaços rendidos. Ao chegar em casa, de joelhos entreguei o abraço que não pude dar ao Enzo para meu filho Lucas…
Leia mais uma história do livro "Encontros, risos e outras molduras: um breve retrato da arte da palhaçaria em hospitais": Entre fases.