Por Palhaça Lupita (Sabrina Almeida), Centro de Atenção Psicossocial - CAPS
— Ela tem medo de palhaço!
Foi assim que foi anunciada a Mariana, uma coincidência enorme, já que nós também costumamos ter medo de quem tem medo. Medo contra medo, fomos nos adaptando.
Mudamos a ordem da entrada nos cômodos e até o horário, tudo para evitar que ambos desmaiassem por causa das ameaças dos perigos existentes nesse encontro. De repente:
— Cuidado! Não vão até aquela sala… tem gente lá!
Pensamos: “Caramba, o que está acontecendo? Virou uma epidemia de medo de palhaço?”
Sem muitas opções de fugir, sentamos, quando de repente tã tã tãããã…
Lá vem ela, andando em nossa direção, meio sem saber se queria vir ou sair correndo. Um encontro épico do medo, EU, minha dupla, FRUTUOSO e MARIANA, que medo!
Paralisamos e tratamos logo de respirar devagar, uma cena típica de programa da Discovery Channel, em que a leoa se aproxima da caça. E a leoa se senta ao nosso lado, quase caindo do banco.
Ficamos ali por uns instantes com um olho em Mariana e outro na rota de fuga. Depois de tanta vesguice, tivemos o primeiro contato verbal:
— Podemos falar com você? — pergunta Frutuoso.
— Sim — acenando Mariana com a cabeça.
Travamos ali uma comunicação para tentar entender o que se passava na cabeça de Mariana. “Será que somos tão feios assim?” Nããão, claro que não… lindeza que somos [era o que se passava na minha cabeça].
Mariana responde:
— Sim, são muito feios!
Surpresos com esta informação e com a sinceridade da moçoila, aceitamos, afinal, nem todos percebem a beldade que somos. Mas, pronto, tínhamos um motivo do medo dela. Conversa vai, papo furado vem; Mariana que estava na beira do banco já parecia mais confortável e nós também. Mas já era hora da leoa almoçar, ou melhor, buscar a sua caça… que obviamente não seria nós dois, porque éramos muito feios.
Ela se foi, olhando para frente e para trás… só para se certificar que estávamos sentados da mesma forma.
Ficamos até Mariana sumir pelo refeitório e seguimos o nosso rumo em busca do nosso almoço. Afinal, palhaços feios também têm fome.
Leia mais uma história do livro "Encontros, risos e outras molduras: um breve retrato da arte da palhaçaria em hospitais": Encontro de partida.
