Regras claras, coerentes e consistentes e tempo e paciência estão entre os princípios fundamentais para uma boa educação. Em entrevista para o Viver Bem, a psicóloga Lidia Weber, professora e pesquisadora da Universidade Federal do Paraná (UFPR) e autora do livro Eduque com Carinho: Equilíbrio Entre Amor e Limites (2005, Editora Juruá), fala sobre como os pais devem encarar o castigo – não como uma punição, mas como uma forma de educar as crianças. Confira alguns trechos.
Como a psicologia define o castigo e como deve ser a sua aplicação?
Castigos são penalidades impostas quando a criança não cumpre uma regra anteriormente explicada e combinada. Geralmente são muito arbitrárias, ou seja, os pais fazem no sentido de “punir” mesmo e não de ensinar e educar. Por exemplo, a criança de seis anos xinga o irmão e a mãe diz, agora você vai ficar sem sobremesa. Nada a ver. Se a criança xinga o irmão e já foi ensinada previamente a regra de que xingamentos não são permitidos naquela família, pode-se dizer para a criança pedir desculpas, em seguida, pedir para ela dizer três coisas que ela mais gosta no irmão. Esse segundo tipo de “castigo” é chamado de consequência lógica: algo relacionado com a infração e uma regra estabelecida. Por exemplo: Nivel 1, a mãe diz: “Filho, vá guardar seus brinquedos antes do jantar”. Se o filho obedecer, a mãe deve elogiar seu comportamento: “Muito lega, você fez o que pedi rapidinho!”. Se o filho resmungar e não obedecer, a mãe vai ao Nivel 2: explicar o porque e avisar sobre a conseqüência (castigo): “Filho, se os brinquedos ficarem espalhados alguém pode tropeçar e cair. Se você não guardá-los, amanhã não poderá brincarcom eles”. Se o filho não foi ensinado desde pequenos a seguir regras, poderá ainda não obedecer. Neste caso a mãe segue ao nível três, explicando novamente e afirmando a conseqüência. “Meu querido, deixar brinquedos espalhados atrapalha e pode machucar as pessoas. Você não obedeceu meu pedido (ela deve pegar os brinquedos, senão contradiz a questão do machucar-se) e mostrou que ainda não tem responsabilidade para com os seus brinquedos, e amanha não poderá brincar com eles”. Obviamente, no dia seguinte, tem de cumprir e não permitir que o filho brinque com aqueles brinquedos. Os pais devem ter bom senso para não exigir o que a criança não está preparada para fazer, não fazer da vida somente um campo de batalhas e regras sem espaço para espontaneidade, diversão e muito afeto, apoio e compreensão, e os pais devem ter autocontrole com suas emoções negativas sobre os filhos e observar comportamentos corretos, elogiar,dizer que tem orgulho dos filhos.
Há uma frase repetida na cultura brasileira que diz que uma pessoa que tem um mau-comportamento o tem por não ter apanhado quando criança. Como vê essa questão? Surra já foi sinônimo de boa educação?
Foi durante milênios. Em um contexto em que a criança não era compreendida, não era valorizada, era considerada um ser imperfeito. E em um contexto de modelo familiar hierárquico, autoritário e patriarcal. Hoje estamos em outro mundo, então é preciso mudar urgentemente nosso modelo de educação. Há alguns anos fiz uma pesquisa sobre punição e castigo em Curitiba, com mais de 499 crianças e adolescentes, 88% responderam que apanharam ou ainda apanham dos pais… Não é só o brasileiro, é mundial.
Quais são os tipos de castigo mais usados pelos adultos?
Os resultados de pesquisas, em todo o mundo, sobre incidência de puniçãocorporal mostram que ela ainda é muito utilizada para educação dos filhos em todos os países. A história mostra que esse tipo de modo de “deseducar” uma criança veio com os nosso colonizadores, pois a maioria dos nossos índios não batem em seus filhos. Infelizmente, é a mãe quem mais utiliza esse recurso. Assim, a punição física mostra-se como uma prática banalizada e, até mesmo, legitimada pela sociedade. Outro recurso também muito inadequado é o abuso verbal: gritos, palavrões, humilhações. Usa-se pouco o que mais deveria ser usado: regras claras, coerentes e consistentes e tempo e paciência para explicar como o mundo funciona.
O efeito educativo, ou corretivo, pode ser imediato, ou o castigo é algo que deve ser feito repetidamente até que haja o aprendizado?
Depende da situação você pode aplicar imediatamente: a criança xingou alguém,você pode dizer para ela pedir desculpas, ao fazer o time-out (cantinho para pensar); se a criança quebrou de propósito um brinquedo do irmão, vai ter de economizar sua mesada para comprar outro. A educação é sistemática, às vezes tem de ser repetida muitas vezes, com paciência, afinal crianças são crianças. Quando desmontam seu aparelho para depilar, por exemplo, ou jogam seus perfumes cheirosos (e caros!) nos bichinhos de pelúcia, e elas não tem o mesmo desenvolvimento cognitivo dos adultos, nem sua moral. Por isso devem ser ensinadas, modeladas; elas não nasceram malvadas (como se acreditava antigamente).
Como saber o tempo ideal e até que idade o “time-out” funciona?
O objetivo é retirar da criança a possibilidade de receber qualquer coisa boa por um tempo. Funciona até aproximadamente seis anos e a regra é usar um minuto de tempo por idade, três anos, fica três minutos. É difícil de ser usada de modo correto, pois deve ser um canto sem atração, os pais não podem falar com a criança nesse tempo, se a criança chorar ou gritar, os pais devem agüentar, se ela sair do lugar, os pais devem colocá-la lá novamente, sem falar com ela. Se a criança aprendeu a seguir regras e os pais são maduros emocionalmente funciona até de maneira mágica! É como a história de dizer: “Vá fazer isso, vou contar 1, 2 e …”. Às vezes é preciso dar um sinal mesmo para a criança.
Como saber qual é a medida certa de um castigo?
Primeiramente colocar um princípio na sua vida: bater, humilhar, xingar, jamais! E saber que antes dos castigos é preciso educar: ensinar a regra, o porque da regra, quando a regra deve ser utilizada, quando é possível negociar e quando não, ser coerente com a idade dos filhos (aprender um pouco sobre desenvolvimento da criança), e ser consistente: não deixe que seu estado de espírito influa sobre a regra: se a hora de dormir é 21hs, sempre será 21hs, não é porque você está chateado ou muito feliz que o horário deve mudar. Pode até ser negociado se um dia for aniversário do irmão, por exemplo. Crianças aprendem com muita facilidade se os pais forem consistentes, mas também aprender facilmente a manipular, a burlar a regra, quando os pais são incoerentes. (AC)
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