Histórico

Especial mães

Adriano Justino
13/05/2007 20:28
Noeci
Abrantes Boroni
Idade: 71 anos• Filhos: Ivo Luis e Marisa
Onde vive: Rio Grande (RS)
“Estou em dívida com a minha mãe. Se não me engano, a última homenagem que lhe fiz foi um retrato de memória, traçado com lápis de cor. O detalhe era a cabeleira armada com esponja de aço, que nada tinha a ver com o cabelo lisinho dela. Acho que ficou decepcionada, mas não demonstrou. Talvez imaginasse que meu péssimo senso de estética, revelado aos cinco anos no jardim de infância, melhorasse com o passar do tempo.
Será que melhorou, mãe?
Também não sei. Mas tenho certeza que a presença doce e generosa de minha mãe, em todos os momentos da minha vida, fez de mim uma pessoa melhor. Nem a distância geográfica entre nós diminuiu a sensação de calor que me alcança quando penso nela.
Não herdei a delicadeza de seus gestos, o tom moderado da voz, a infinita paciência e a capacidade de perdoar, sempre. Nem o talento para empreiteira de obras, que faz dela, aos 71 anos, a pessoa que mais reforma a própria casa na distante cidade de Rio Grande (RS). “Aquela que tem a praia do Cassino, com 200 quilômetros de extensão”, lembra minha orgulhosa mãe, sempre que se apresenta a quem não é seu conterrâneo.
Mas acho que herdei, sim, sua disposição para a luta. Desde a infância extremamente pobre, minha mãe provou ser uma guerreira de valor, que não se queixa das dificuldades, nem se amargura com as perdas. Em vez disso, com alegria juvenil nos olhos verdes, mostra que sempre é tempo de recomeçar. Te amo, mãe.”
Marisa Valério é editora de Economia
Maria Judite Fernandes
Idade: 65 anos
Onde vive: Curitiba (PR)
Filhos: Cecília, Clarisse, José Carlos e Rodrigo
“Conversa o tempo todo, mas não é muito de falar de si mesma. Vez ou outra, solta uma confidência. Foi assim que fiquei sabendo que já chorou de saudade ouvindo o hino nortista ‘Ita no Norte’. E que a música de sua vida é ‘A Noite do Meu Bem’, de Dolores Duran. Viraram para mim a trilha sonora da Judite – a mulher que sonhou ser freira e professora. E que ainda se pergunta: ‘Será que eu vou aprender a cantar?’
Proseia com todo mundo. Já fez amizade com gente que ligou por engano. Animou mais de um velório. E quando sai do consultório médico, tem-se a impressão que deixou na sala de espera suas velhas amigas de primário. Desde que me conheço por gente, minha vida tem sido responder se ‘a Judite está boa?’ e entregar ‘lembranças para Judite’.
Me protejo. Nunca vou à praia com ela. Como há sempre uma conhecida no meio do caminho, o mar fica a léguas e léguas dali. Me nego a buscá-la na saída da missa – esperá-la é uma via-sacra de não-sei-quantas estações. Se vai comigo ao mercado – as alfaces murcham no porta-mala.
Ela fala com Deus e todo mundo. Com Deus, tem hora marcada. Lá pelas tantas, diz ‘boa noite’, se tranca na sala e, suponho, manda para as alturas o que ouve no consultório, no velório, na porta da igreja, nos telefone e no caminho da praia. Depois estica as pernas e devaneia. Ora lê com apetite receitas de doces nas revistas, ora gargalha gostoso com a Hebe.
A Judite é minha mãe. Mas também de mais três filhos. E dois netos. Além de 50 sobrinhos devotos, conhecidos e incontáveis afilhados de batismo, crisma e casamento. O primeiro lhe foi dado quanto tinha 11 anos de idade. Somando tudo, dá mais de meio século de popularidade. Arrisca ser por isso que se perde nas canecas de arroz. Não falta almoço nem palavra para todos aqueles a quem a Judite dá sua luz.”
José Carlos Fernandes é repórter especial
Maria do Rocio Galdi Ferreira de Camargo
12/03/1942 – 28/04/2000
Filho: Paulo
“Quando minha mãe morreu, há 7 anos, vítima de um melanoma (a forma mais agressiva de câncer de pele), meu mundo caiu. Perdi, de uma só vez, minha primeira e mais profunda referência de amor, mas também uma amiga, confidente de todas as horas, capaz de repensar seus valores para compreender meus pontos de vista, minhas opções de vida. Falávamos sobre tudo, sem temer a discordância.
Ao mesmo tempo delicada e forte, minha mãe, Maria do Rocio, foi e é para mim um símbolo da capacidade que muitas mulheres têm de aliar sensibilidade à perseverança, à capacidade de sobrevivência diante das piores adversidades – e sem jamais perder a ternura. Ela foi embora, mas o amor e a admiração que sinto pela pessoa que foi continuam mais vivos do que nunca. Suas lições de solidariedade, tolerância e curiosidade pelo mundo continuarão ecoando nos meus ouvidos e coração, disso tenho absoluta certeza. Para sempre.”
Paulo Camargo é editor do Caderno G
Maria do Carmo Silva
Idade: 77 anos
Onde vive: Curitiba
Filhos: Marcia, Mario, Manoel, Margaret, Marleth e Marlene
“A convivência diária é um poderoso anestésico. Vemos a nossa mãe todos os dias e pouco paramos para pensar como ela é. Mas a perdemos (ou nos deparamos com a possibilidade da perda definitiva) e uma cortina se abre: tudo que sabemos sobre ela passa a ser percebido de forma diferente. Minha mãe está aqui, mas sua presença está se desmanchando por causa da doença (Alzheimer). Me pego, para meu espanto, pensando nela e lembrando como era elegante, como era discreta – jamais fazia fofoca, falava pouco de si mesma, não se descontrolava. Minha mãe, que nasceu em uma fazenda no interior de Minas, onde começou a trabalhar ainda criança para ajudar o pai. Minha mãe, que se tornou uma grande costureira e fez de mim e de meus irmãos as crianças mais bem-vestidas da vizinhança. Minha mãe, que me mandou uma sopeira com canja quentinha para me consolar quando meu gatinho morreu. Minha mãezinha, te amo.”
Marleth Silva é editora-executiva de Cadernos
Maria Filomena Cardoso André (Filó)
Idade: 48 anos • Onde vive: Cascavel (PR)• Filhos: Vinícius e Guilherme
“Não tenho lembranças de minha mãe de antes do acidente automobilístico que a deixou tetraplégica, em 1987. Ela tinha 28 anos. Eu, cinco. Lembro, sim, que os primeiros anos que se seguiram foram difíceis e doloridos para cada um de nós – sobretudo e incomparavelmente para ela. Mas já cantou o poeta que é preciso ter força, é preciso ter raça, é preciso ter gana sempre. E, como uma iluminada Maria, minha mãe teve tudo isso e muito mais. Presa fisicamente a uma cadeira de rodas, mas com o espírito livre, ensinou (e ensina) a todos que a cercam lições de superação, de grandeza e de amor. Advogada, funcionária pública no município paranaense de Cascavel, hoje ela dedica praticamente todo o seu tempo à causa da pessoa com deficiência. E em sua luta diária por si e pelos outros é apaixonada e corajosa. Como toda boa mãe.”
Vinicius Dias é editor interino de Turismo