Histórico

Podem me chamar de???

Adriano Justino
14/05/2006 22:00
Todos temos frustrações e algumas nos acompanham para a vida toda. Se não é o grande amor da vida que foge com um cantor, é a promoção no trabalho que nunca chega. São coisas, enfim, que marcam fundo a vida do indivíduo e que nunca saem da cabeça. Uma das minhas frustrações é não ter um apelido – e nem um nome fácil. Por mais que isso pareça besta, acho que se eu tivesse um apelido, minha vida teria sido mais sossegada. Azeitona, que fosse. “Ei, Azeitona, chega mais.” Pronto! Eu estaria enturmado.
Recebi o nome de Vinícius – e com acento. Penso que se eu tivesse passado minha infância em Curitiba seria inevitável que me chamassem de Vina. A parte da minha família que mora na capital até me chama assim. Mas eu cresci no interior do Paraná, onde se tem a terrível mania de chamar salsicha de salsicha (?!?). Vina, então, nunca foi um apelido de verdade para mim. Vini soa muito íntimo para a maioria. Vi, então, é coisa quase exclusiva das namoradas.
Por falar em namoradas (que eu não tenho no momento, já que a última fugiu com um cantor), essas conseguem apelidar com uma facilidade imensa, é verdade. Mas esses apelidos amorosos não saem da intimidade e não valem como substituto do nome. Até porque eu não gostaria de ser chamado de “xuxu” pelo ponta-esquerda do futebol de quinta-feira à noite. Nem ouvir um “guti-guti, vem aqui” do colega da faculdade.
E como eu tenho inveja do meu irmão Guilherme, que apesar de ser Gui ou Guigo para os familiares, recebe um apelido novo por dia. Um mais legal que o outro. Lembro que, quando criança, ele era chamado pelos amigos de Penadinho porque era branquinho, pequeno e parecia o fantasminha da Turma da Mônica. Depois cresceu e hoje é conhecido como Vacão ou Podre (prefiro não explicar o porquê), com muito orgulho.
Eu não. Eu sempre fui o Vinícius. Mesmo criança. E criança pequena chamada de Vinícius não combina – perdoem-me mães de Vinícius, inclusive a minha. Mas o fato é que meu time de basquete tinha Xuxa, Napa, Chulapa, Bebeto, Fanho e… Vinícius. Com esse nome, eu devia ficar no banco, apesar de ser o mais alto deles.
Na verdade, analisando a fundo essa questão tão fundamental, percebo que minha frustração começa mesmo pelo meu nome. O nome não é feio, mas é sério demais e não rima com nada. O meu pai, para me sacanear, rimava-o com hospício e estrupício. Ele queria que meu nome fosse Pedro, que não rima com pedra nenhuma, mas é muito mais simples. Eu me contentaria em ser chamado de Pedrão. Não é exatamente um apelido, mas um aumentativo decente bastaria para acabar com a minha frustração, já que minha única característica marcante e visível a olho nu (não o corpo) é o fato de eu ser alto – e, digamos, robusto. Como Viniciusão ou Vinicião são impronunciáveis, nada feito.
O meu xará mais famoso e demorado, o Poetinha, declamaria: “eu sei e você sabe, já que a vida quis assim”. A vida e a minha mãe, que escolheu o nome. Ela se defende dizendo que leu em um dicionário de nomes que “Vinícius é o que tem boa voz”. Tem gente com voz melhor, mãe. E nome mais fácil. Digo isso, porque o que eu ouço me chamarem de Maurício não está no gibi. Maurício é fácil – e Mauricião até que é simpático. Mas fui condenado. Meu nome é Vinícius, com acento e sem direito a apelido. Curiosamente, um repórter – que deve ter um apelido – acaba de passar por mim e me chamar de Vinagrete. Pensando melhor, antes Vinícius do que mal apelidado.
Maurício, quer dizer, Vinícius Dias
não tem apelido.
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