Saudade, sucessos e polêmicas: Curitiba recebe shows de Rock BR dos anos 80 a partir de maio
Filipe Albuquerque, da equipe Pinó
08/05/2023 10:00
Os integrantes dos Titãs em show da turnê Encontro. | Guilherme Leite Fotografia/Divulgação
Se você sabe o que fazer com uma fita cassete e uma caneta Bic, então esses shows são para você. O lado A do rock brasileiro dos anos 80, ou BRock, passa por Curitiba a partir deste mês de maio.
Em apresentações que começam neste final de semana e se estendem até agosto, Paralamas, Titãs, Camisa de Vênus, Paulo Ricardo e Dado Villa-Lobos e Marcelo Bonfá, os remanescentes Legião Urbana, desfilam guitarras e hits pelos palcos da cidade.
As visitas celebram décadas de carreira e discos de sucesso. Juntas, as bandas matam a saudade de quem viveu aquela época, de quem só ouviu falar – e recupera vídeos de shows pelo YouTube e os discos pelas plataformas de streaming –, enquanto colecionam hits executados por FMs ainda nos dias de hoje e algumas polêmicas.
Camisa de Vênus
Marcelo Nova, líder, vocalista e principal letrista do Camisa de Vênus. Foto: reprodução/Facebook
Camisa de Vênus inicia a lista de shows nostálgicos do rock nacional. A banda comemora 43 anos de estrada na Ópera de Arame no próximo dia 13. Liderado por Marcelo Nova, o grupo baiano estreou em LP em 1983, com LP homônimo, e desde o início colecionou polêmicas – a começar pelo nome da banda. Além de músicas censuradas, letras com palavrões e um disco recolhido das lojas por não ter sido submetido ao órgão censor antes de seu lançamento (Viva, de 1986), suspeitas de plágio estão na conta da turma – “Só o fim”, do álbum Correndo o Risco, de 1986, é muito semelhante a Gimme Shelter, dos Rolling Stones, de Let it Bleed, de 1969; “O Adventista”, do disco de estreia, está próxima demais de “I Believe”, da banda punk inglesa Buzzcocks, do álbum A Different Kind of Tension, de 1979.
Além de músicas censuradas, letras com palavrões e um disco recolhido das lojas por não ter sido submetido ao órgão censor antes de seu lançamento (Viva, de 1986), suspeitas de plágio estão na conta da turma – o refrão de “Só o fim”, do álbum Correndo o Risco, de 1986, é muito semelhante ao de "Gimme Shelter", dos Rolling Stones, de Let it Bleed, de 1969; “O Adventista”, do disco de estreia, está próxima demais de “I Believe”, da banda punk inglesa Buzzcocks, do álbum A Different Kind of Tension, de 1979.
Em 1995, quando a banda retomou as atividades, Nova e Samuel Rosa, então guitarrista e vocalista do Skank, trocaram cotoveladas via imprensa. E em 2021, em meio à pandemia da covid-19, Marcelo Nova deu uma entrevista a uma emissora de TV da Bahia afirmando que não se submeteria ao distanciamento social solicitado pelas autoridades sanitárias e que faria suas próprias regras.
O show do Camisa de Vênus acontece no sábado, dia 13, na Ópera de Arame, com abertura da banda paulista e também veterana Velhas Virgens. Os ingressos estão disponíveis no site da Bilheto.
Paulo Ricardo
Paulo Ricardo se apresenta no Teatro Guaíra no dia 26 com o show "Rock Popular". Foto: Leandro Godoi
O ex-líder do RPM, que não raro se estranha com os ex-companheiros de banda, apresenta no palco do Teatro Guaíra, no dia 26 de maio, o show “Rock Popular”. No setlist, os sucessos que fizeram de seu grupo um fenômeno de vendas: espere por “Loiras Geladas”, “Revoluções por Minuto”, “London London” (de Caetano Veloso), “Alvorada Voraz” e outras. O artista lançou, neste ano, o álbum Voz, Violão & Rock’n’roll Acústico.
No ano passado, o músico descartou uma reunião do RPM – o baterista Paulo Pagni morreu em junho de 2019. Disse achar triste que os ex-integrantes ainda entendam que a banda deve continuar e comparou o grupo ao Led Zeppelin, que encerrou as atividades (embora tenha feito retornos esporádicos) quando o baterista John Bonham morreu, em setembro de 1980.
Lançado em 1986, o disco Rádio Pirata Ao Vivo vendeu três milhões de cópias rapidamente. O que fez com que a gravadora CBS precisasse acionar a fábrica na Argentina para a produção de mais LPs.
Recentemente, desavenças entre Paulo Ricardo e os ex-integrantes Pagni, Luiz Schiavon e Fernando Deluqui sobre o uso da marca RPM e a execução das músicas mais conhecidas, foram parar na justiça.
Branco Mello, Paulo Miklos e Arnando Antunes juntos novamente para a turnê 'Encontro'. Foto: reprodução/Facebook
A banda chegou a ter nove integrantes, tornou-se famosa como um octeto, e atualmente reúne sete integrantes originais – o guitarrista Marcelo Fromer morreu em junho de 2001 na turnê “Titãs Encontro – “Todos ao Mesmo Tempo Agora”. O nome é uma referência ao disco Tudo ao Mesmo Tempo Agora, de 1991, e a reunião celebra os 40 anos de história da banda.
O show será na Pedreira Paulo Leminski no dia 10 de junho e os ingressos estão à venda pelo Eventim. Os vocalistas Arnaldo Antunes, Paulo Miklos, o baixista e vocalista Nando Reis e o baterista Charles Gavin se unem novamente ao cantor Branco Mello, ao tecladista e vocalista Sérgio Britto e ao guitarrista Tony Belloto, que seguem com a banda. Juntos, executam músicas dos sete discos que contou com os oito músicos – Arnaldo deixou a banda em 1992 – e alguns sucessos pós-saída do cantor.
A excursão começou pelo Rio de Janeiro no dia 28 de abril, com show de 2h30. Nele, a banda executou sucessos como “Igreja”, “Estado Violência”, “Diversão”, “Desordem”, “Tô Cansado”, “Homem Primata”, “O Pulso”, “Comida”, “Polícia” e “Bichos Escrotos”. No momento mais leve, vieram “Epitáfio”, “Pra Dizer Adeus” e “Cegos no Castelo”. Alice Fromer, filha de Marcelo, cantou “Toda Cor”, do primeiro álbum, música de autoria do pai com Carlos Barmack e Ciro Pessoa (um dos fundadores do grupo, morto em 2020).
Entre palavrões, dardos disparados contra a igreja, o Estado e a polícia, e canções românticas, os Titãs carregam na bagagem álbuns com vendagens estelares. Acústico, de 1997, ultrapassou as 2 milhões de cópias vendidas. Na relação com a crítica, entre os anos 80 e 90, manteve uma relação de amor e ódio. Õ Blesq Blom, sexto álbum da banda (1989) foi chamado pela antiga revista Bizz de “obra de arte”. Já o seguinte, Tudo ao Mesmo Tempo Agora (1991), em que a banda abusou de distorções e letras escatológicas, foi destroçado pela mesma revista.
Titanomaquia (93) foi acusado de oportunista por soar grunge, subgênero do rock vindo de Seattle (EUA) no começo da década de 1990. Jack Endino, produtor de bandas como Nirvana, Mudhoney e Soundgarden, foi escolhido pela banda para trabalhar no disco, o que aumentou o sentimento, entre críticos, de que a banda queria surfar a onda do momento.
No ano passado, os Titãs – Britto, Branco e Tony – lançaram Olho Furta-cor. Em dezembro, a banda se apresentou no festival Prime Rock Brasil Curitiba, também na Pedreira.
Os Paralamas do Sucesso
Os Paralamas sobem ao palco do Teatro Guaíra no dia 14 de julho, em turnê de comemoração dos 40 anos de carreira. Os ingressos estão à venda pelo Disk Ingressos.
Um dos nomes mais bem sucedidos do rock brasileiro, com carreira sólida também no mercado latino, o trio formado por Herbert Vianna, João Barone e Bi Ribeiro promete disparar sucessos dos 13 discos de estúdio. Aí, lá se vão clássicos, como “Vital e Sua Moto”, “Mensagem de Amor”, “Lanterna dos Afogados”, “Alagados”, e versões próprias para “Gostava Tanto de Você” e “Você”, as duas de Tim Maia, “Trac-Trac” (do argentino Fito Páez) e “A Novidade”, de Gilberto Gil.
Em 1986, apontado por muita gente como o melhor ano do rock nacional, a banda lançou Selvagem?, terceiro disco da carreira. O álbum vendeu 700 mil cópias e credenciou a banda a uma apresentação no Festival de Montreaux, na Suíça, no ano seguinte. Entre 2000 e 2011, a banda faturou oito Grammys Latinos. O trio é também o segundo maior vencedor do antigo prêmio VMB, da MTV Brasil, com oito troféus, atrás apenas da cantora Pitty, com 15. Em 2015, receberam o Prêmio da Música Brasileira (criado em 1987 por José Maurício Machline) como o melhor grupo de pop/rock/reggae/hip hop/funk.
A relação da banda com a crítica, quando isso ainda era relevante, nunca foi das mais calmas. Em 1994, os três assinaram um artigo publicado no caderno Ilustrada, da Folha de S.Paulo, para rebater uma resenha de Luiz Antônio Giron ao disco Severino, lançado naquele ano. O jornalista, chamado pelos músicos de ‘burro’ e 'mulher-barbada' no texto, escreveu no mesmo caderno (“Severino anima chá de cucarachas”, 28 de abril de 1994) que o disco conta com “guitarras babosas”, que "o resultado é murcho" e chamou Herbert de "narciso enlouquecido". Registrou que, com as letras socialmente engajadas, a banda "glamouriza a miséria", e afirmou que a “desorientação estética [do álbum] é flagrante”. “U2 Latino? Melhor seria chamar os Paralamas de Roupa Nova Inglês, a animar chá das cinco do pop cucaracha”, imprimiu.
Na resposta, Vianna, Barone e Ribeiro acusaram Giron de fazer retórica requentada que esconde um “ódio pessoal assombroso” e “ausência de argumentos críticos”. Condenou o que chamaram de jornalismo feito de polêmica artificial e tom "engraçadinho", e afirmaram ainda que o crítico adota um “modelito Freak-palhaço” para fazer jornalismo cultural. Outros tempos.
Dado Villa-Lobos & Marcelo Bonfá
Dado Villa-Lobos e Marcelo Bonfá, que se apresentam em agosto no Guaíra. Foto: reprodução/Facebook
Em 26 de agosto, projeto de Dado Villa Lobos & Marcelo Bonfá ocupa o palco do Teatro Guaíra com apresentação da tour “As V Estações”. A excursão toma como base os discos da Legião Urbana As Quatro Estações (1989) e V (1991). Guitarrista e baterista vêm acompanhados de André Frateschi nos vocais, Lucas Vasconcelos na guitarra, Mauro Berman no baixo e Pedro Augusto nos teclados.
A excursão, que teve início em Sorocaba (SP), se encerra em novembro, em Fortaleza (CE). No repertório, músicas como “Há Tempos”, “Pais e Filhos”, “Quando o Sol Bater na Janela do Seu Quarto”, “Meninos e Meninas” (de As Quatro Estações), mais “Vento no Litoral”, “O Mundo anda Tão Complicado”, “O Teatro dos Vampiros” (de V) e outras - "Tempo Perdido", "Será", "Geração Coca-Cola", "Que País é Este" entre elas.
Números não oficiais registram que As Quatro Estações vendeu mais de 2 milhões de exemplares. A banda é cultuada até hoje mesmo por gerações que não puderam assistir aos shows com Renato Russo. Morto em outubro de 1996 em decorrência da aids, o líder e letrista do grupo era conhecido também por sua dificuldade com as apresentações ao vivo. Uma delas, realizada em 18 de junho de 1988 no antigo estádio Mané Garrincha, em Brasília, se transformou em batalha campal. Do lado de fora, antes do início do show, ônibus foram apedrejados, e a polícia agiu de forma violenta para conter os vândalos. Enquanto tocavam, a banda foi alvo de bombas de São João, e Renato foi agarrado pelo pescoço por um fã, que conseguiu driblar a segurança e subir no palco. A banda decidiu interromper a apresentação, e se recusou a retornar para a sequência do show. Parte do público, então, deu início a um quebra-quebra de dimensões assustadoras.
Nos últimos anos, Dado e Bonfá enfrentaram problemas com Giuliano Manfredini, filho de Renato Russo, pelo uso da marca - Giuliano é proprietário da Legião Urbana Produções Artísticas LTDA. Em outubro do ano passado, o STJ manteve decisão que desobriga os músicos a pagarem um terço dos lucros ao herdeiro do cantor. O caso ainda será julgado no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro. Mas a dupla afirma que não tem a intenção de utilizar o nome da banda.
Em entrevista recente ao jornal Folha de S.Paulo, o guitarrista afirma que o grupo deixou de existir com a morte de Renato. E que a ideia do projeto com Bonfá tem a intenção de manter viva a história da banda, e satisfazer um desejo do público.