Arte

A história por trás do salto da bailarina do Museu Oscar Niemeyer

Yuri Casari, especial para Pinó
24/07/2023 16:50
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Quem nunca ouviu uma música ser tocada pela primeira vez no rádio e sentiu uma emoção que se repete ano após ano, intacta, como se ainda fosse a primeira execução? Ou viu um filme que logo na estreia se mostrou atemporal? Nas artes costuma ser assim. Há obras que demoram décadas (ou até séculos) até serem reconhecidas. Enquanto outras se tornam um clássico imediato.
A bailarina que salta sobre o espelho d’água do Museu Oscar Niemeyer (MON) é um exemplo da segunda categoria. Alinhada à grandiosidade de todo o complexo cultural, o desenho do arquiteto Oscar Niemeyer é um marco da capital paranaense. O MON, também projetado por Niemeyer, é uma obra única também por carregar o traço artístico do arquiteto, algo incomum em sua trajetória.
No movimento da bailarina pintada na cor preta em um fundo chapado na cor amarela, seus braços desenham uma forma que imediatamente nos remete ao “olho” que está logo acima, e que é o símbolo do Museu. Pouco se sabe sobre o conceito artístico por trás do desenho da mulher em movimento e das “ondas” que completam o painel. A própria “bailarina” é a vitória da interpretação popular.
A execução do painel de azulejos que circunda externamente a torre – e também parte de sua área interna – foi assinada pelos artistas plásticos Maria Helena Saparolli e Elvo Benito Damo. A dupla recebeu a reportagem de Pinó no ateliê de Maria Helena e relembrou o desafio de compor a obra de Niemeyer em apenas 45 dias. “Um dos engenheiros da obra era conhecido nosso e quando surgiu a ideia do painel, ele perguntou se eu topava participar de uma licitação para fazer o painel. Foi um domingo à noite. Falei ‘topo’. E já liguei pro Elvo”, conta a artista.

O trabalho

O prazo era apertadíssimo. Após a chegada do projeto original, Maria e Elvo fizeram os estudos e apresentaram oito versões de amarelo. A cor certa foi definida pelo próprio Niemeyer. Depois disso, o trabalho de queima dos mais de 25 mil azulejos contou com o apoio de uma indústria em Campo Largo. “Todos os azulejos eram do mesmo lote, para não ter diferença na hora da queima. E trabalhamos direto. Dia e noite. Senão não teria como dar conta”, relembra Elvo. Ainda assim, foram adicionados mais 15 dias para a conclusão. Todo o trabalho acontecia paralelamente às obras de finalização do Museu.
A queima da tinta nos azulejos também rendeu percalços ao trabalho, principalmente os que carregavam os contornos da bailarina. “A gente recortava o preto, aplicava sobre o amarelo que já estava queimado e voltava pra queima do preto. Teve uma fornada, ou melhor, umas fornadas, em que a temperatura passou e mudou o tom da cor. Tivemos que fazer tudo de novo. Foi um desafio, do início ao fim”, relata Maria.
Um destaque da peça é a fidelidade ao projeto original, nos detalhes da mulher às cores utilizadas. “É uma responsabilidade de quando você está trabalhando pelo outro. É muito maior. E temos um compromisso com a memória e com a história do artista que estamos representando. É um trabalho muito mais delicado”, destaca Elvo.

O autor

Oscar Niemeyer dispensa apresentações, é verdade, mas é sempre bom relembrar o maior nome da arquitetura brasileira. Nascido no Rio de Janeiro, em 1907, Niemeyer viveu 104 anos a pleno, criando projetos únicos pelos quatro cantos do país e também a outras plagas pelo mundo.
Assim como o Museu do Olho se transformou rapidamente em um cartão postal de Curitiba, outros projetos de Niemeyer também conseguiram uma dimensão simbiótica nas cidades em que foram construídos, como o Museu de Arte Contemporânea de Niterói, a Catedral de Brasília, o edifício Copan em São Paulo e a Igreja da Pampulha em Belo Horizonte.

Os executores

Um projeto arquitetônico de Oscar Niemeyer decorado por um desenho de Niemeyer: característica incomum que deixa a “bailarina do MON” ainda mais representativa.
Um projeto arquitetônico de Oscar Niemeyer decorado por um desenho de Niemeyer: característica incomum que deixa a “bailarina do MON” ainda mais representativa.
Maria Helena Saparolli e Elvo Benito Damo estão entre os profissionais mais reconhecidos das artes plásticas do Paraná. Polivalentes, criam e executam peças de estilos diferentes e com diversos materiais. A curitibana Maria possui uma íntima relação com a arte em cerâmica, enquanto o catarinense radicado na capital paranaense Elvo é comumente lembrado por suas esculturas, em especial o índio Tindiquera, exposto no Parque Tingui.
A bailarina do MON não foi a única obra que ambos os artistas trabalharam em parceria, embora tenha sido o primeiro grande projeto realizado juntos. Um exemplo disso é o mural de azulejos localizado na Universidade Positivo, no Campus Ecoville, do artista Sergio Ferro - que ilustrou a capa da Pinó no mês de janeiro de 2022 e foi a primeira dessa série de capas colecionáveis. Além disso, a dupla é responsável por reproduzir e restaurar a obra do muralista Poty Lazarotto.

O MON

A história do Museu Oscar Niemeyer começa décadas antes de sua inauguração. O prédio principal foi projetado ainda na década de 1960 para abrigar o Instituto de Educação do Paraná (IEP). No fim das contas, o espaço não teve a destinação original, e serviu para abrigar algumas secretarias do governo estadual. Durante o governo de Jaime Lerner, já no início dos anos 2000, Niemeyer foi convidado a adequar o espaço existente para abrigar um museu. O arquiteto, por sua vez, condicionou o projeto a criação de um anexo que pudesse simbolizar a futura instituição.
Inaugurado em novembro de 2002 com o nome pouco inspirador de Novo Museu, foi renomeado no ano seguinte. Oficialmente Museu Oscar Niemeyer, o espaço também é chamado pela sigla MON e, carinhosamente, é celebrado pela população como Museu do Olho. O maior museu da América Latina é grandioso não apenas por suas dimensões, mas também por seu alinhamento com a imagem de Curitiba: moderno, culturalmente rico e impactante para todos que o visitam.

Curitiba e a arte

Durante todo o ano de 2022, a Pinó contou com doze capas colecionáveis que estamparam obras de arte que estão expostas por toda Curitiba. A proposta foi tão bem recebida, que se estendeu para 2023, chegando nesse julho a dezenove capas.
De janeiro do ano passado até a atual edição, foram dez murais, sete esculturas, um mosaico e uma obra arquitetônica. Mas poderiam ser muitas edições mais. Afinal, há tanta arte espalhada pela capital, desde obras antigas, tradicionais e compostas por grandes nomes do nosso histórico artístico, quanto novas, modernas, revelando um sem número de talentos da nossa terra ou de distantes paradeiros.
Em todas as edições, os cliques que deram uma cara toda especial à Pinó foram feitos pelo fotógrafo curitibano Leo Flores, que apresentou sua interpretação de obras icônicas de nossa cidade, destacando detalhes e nos fazendo ter um outro olhar sobre locais que passamos diariamente no caminho de casa para o trabalho ou em passeios do fim de semana.