TDAH na vida adulta: diagnóstico tardio impacta qualidade de vida
Heloísa Lima, especial para a Pinó
04/10/2023 14:12
Os principais sintomas de TDAH envolvem dificuldade de concentração, hiperatividade e procrastinação. | Bigstock
Caracterizado por sintomas como dificuldade de manter a atenção, impulsividade e hiperatividade, o Transtorno do déficit de atenção com hiperatividade (TDAH) é um transtorno de neurodesenvolvimento em que o cérebro opera em um ritmo mais acelerado do que o usual. Segundo dados da Associação Brasileira de Déficit de Atenção (ABDA), estima-se que 2 milhões de brasileiros tenham TDAH. Normalmente ligado a crianças, o transtorno vem sendo cada vez mais diagnosticado em adultos.
Quando se aborda o TDAH da vida adulta, porém, existem algumas diferenças nos sintomas relatados em crianças. “A hiperatividade física começa a se manifestar mais intensamente na criança do que a hiperatividade mental ou cerebral. No caso do adulto, essa hiperatividade física é um pouco menos evidente, mas o déficit de atenção se destaca como um dos principais sinais de alerta”, explica Ana Gueixa, Psicóloga e Mestre em Ciências da Saúde. No caso dos adultos, entre diversos sintomas que podem se manifestar, os sinais de alerta incluem falta de atenção, hiperatividade, impulsividade, dificuldade em concluir tarefas, em manter uma linha de raciocínio e em se planejar.
É com base nesses sinais, que o adulto pode perceber a possibilidade de ter TDAH e, a partir desse momento, buscar um diagnóstico adequado, que depende da avaliação de um neurologista ou psiquiatra. “Após o diagnóstico, comecei a refletir sobre meu passado e a questionar muitas coisas. Acredito que seja até natural experimentar um tipo de luto e sentir que fui julgada ao longo da vida por coisas sobre as quais eu não tinha controle. Por isso, o período de terapia após o diagnóstico foi fundamental para que eu conseguisse lidar com essa espécie de luto e compreender o que ocorreu ao longo da minha vida”, compartilha Maria*.
O diagnóstico de Maria aconteceu quando ela tinha 36 anos, durante a pandemia, quando ela enfrentou uma série de mudanças no estilo de vida que acabaram afetando sua saúde mental e lhe causando dificuldades em lidar com novas situações. Os principais desafios envolveram a procrastinação, a complexidade de organizar o dia a dia, a constante distração e a dificuldade em finalizar atividades. “Ao conversar com o meu psiquiatra, ele me apontou algumas impressões que levaram ao diagnóstico do TDAH”, complementa.
Tipos de TDAH
Na atualidade, a ciência reconhece três tipos de TDAH, cada um deles caracterizado por um conjunto específico de comportamentos e sintomas:
Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade:
Nesse tipo, o indivíduo pode enfrentar dificuldades em concentrar-se, manter o foco e concluir tarefas. Essa condição pode impactar o desempenho tanto acadêmico quanto profissional dos pacientes.
TDAH Hiperativo/Impulsivo:
Nesse cenário, a pessoa sente uma constante necessidade de se movimentar e geralmente fica inquieta. Mesmo quando está sentada, é comum que ela mexa as pernas sem controle consciente, muitas vezes impulsionada pela impulsividade. A impulsividade também é muito frequente, a ponto desse indivíduo tender a ficar inquieto e interromper conversas devido à ansiedade pura.
TDAH Misto/Combinado:
Esse tipo é uma combinação de sintomas de desatenção, hiperatividade e impulsividade. Pacientes apresentam características de ambos os tipos anteriores de TDAH simultaneamente.
Sinais
Fique atento a alguns dos sintomas mais comuns do TDAH:
Falta de foco
Desafios na organização e planejamento
Adiamento constante
Problemas de memória
Agitação interna
Dificuldade em se relaxar
Iniciar múltiplas tarefas e abandoná-las
Complicações no controle emocional e tomada de decisões
Reincidência frequente em erros
Relutância em interagir
Tratamentos
Myenne Tsutsumi, psicóloga mestre em neurociências e comportamento pela Universidade Federal do Pará (UFPA) e doutoranda em Análise do Comportamento pela Universidade Estadual de Londrina (UEL), explica que muitas vezes é necessário tratamento farmacológico, mas que também existem outras formas de tratar o TDAH. “Uma alimentação saudável, uma dieta rica que atenda às necessidades nutricionais individuais, um sono adequado, limitação do uso do celular, evitar o consumo de café perto da hora de dormir e manter uma frequência apropriada de atividade física são fundamentais.”
Além disso, Myenne fala da importância de contar com uma rede de apoio, que possa auxiliar e apoiar individualmente cada pessoa em suas atividades diárias e rotina, tornando a organização uma necessidade além de uma simples motivação.
Doismilhões é a estimativa do número de brasileiros com TDAH, segundo dados da Associação Brasileira de Déficit de Atenção (ABDA).
Dificuldades ou transtorno?
Apesar do aumento do número de diagnósticos, principalmente pela conscientização da sociedade e da disseminação de informações, Myenne explica que o acompanhamento profissional é fundamental principalmente para evitar que os sintomas do TDAH sejam confundidos com as dificuldades cotidianas. “É importante entender que vivemos em uma sociedade altamente produtiva, na qual somos constantemente solicitados a realizar diversas tarefas simultaneamente. Não devemos generalizar impulsos, esquecimentos e outras dificuldades gerais como sintomas do TDAH”.
A psicóloga também enfatiza que receber o diagnóstico de TDAH não deve se tornar uma limitação ou uma justificativa para se deixar de fazer determinadas atividades. “A pessoa com TDAH é como qualquer outra. Embora possa enfrentar um pouco mais de dificuldade do que a maioria, ela é capaz de concluir todas as tarefas necessárias com um bom acompanhamento.”
E para aqueles que estão descobrindo o TDAH agora ou estão começando a questionar a possibilidade de ter esse transtorno, Maria recomenda: “é importante não se sentir rotulado por esse sentimento e pelo diagnóstico. Para mim, algo que foi fundamental é que, após esse diagnóstico, eu senti como se um véu tivesse sido retirado dos meus olhos. Passei a ter uma clareza muito maior sobre quem sou no mundo e por que enfrentar certas dificuldades.”
* Nome fictício para preservar a identidade da entrevistada.