Não existe meio de transporte que seja mais a cara da Europa do que o trem. E se existe um país do Velho Continente que merece ser explorado por trilhos de ponta a ponta é a Suíça. Afinal, a curta distância entre cidades e vilas de montanha permite viagens confortáveis. E quando se chega a um local, outra boa surpresa: o desembarque sempre ocorre em estações localizadas na região central, pertinho de tudo. Explorar a Suíça de trem permite criar itinerários intensos, com mais de uma localidade em um mesmo dia, sem que o deslocamento faça o viajante perder o dia em estradas ou aeroportos.
E foi o que o repórter comprovou em sua aventura pelo cantão (divisão administrativa) que fala alemão. Foram sete dias explorando sobre trilhos a capital Berna, Interlaken (com sua imperdível montanha Jungfrau) e a charmosa Lucerna. Na realidade, os três destinos foram “bases” para que pudéssemos desbravar de trem (de teleféricos e de barco) vilarejos, lagos e montanhas sempre cobertos de neve, tudo em meio a paisagens alpinas deslumbrantes. Nesta primeira reportagem, mostramos as atrações de Berna, que foge do clássico padrão de cidade suíça à beira do lago. Charmosa e fácil de explorar, a capital do país (e do cantão que leva o seu nome) realmente merece ser visitada. Interlaken e Lucerna serão apresentadas nas duas próximas edições.
Quem planeja mais viagens dentro do país deve avaliar as vantagens de comprar o Swiss Travel Pass, passe que dá direito a viagens ininterruptas de trem, ônibus, barco e transportes urbanos por períodos de quatro dias a um mês. Custa entre 204 francos suíços (quatro dias) a 494 francos suíços (um mês), em segunda classe, e o passe ainda dá descontos entre 25% e 50% em bilhetes de teleféricos e trens de montanha.
Uma viagem no tempo pela capital suíça
A uma hora de trem de Zurique, nosso ponto de desembarque no país, Berna é uma joia do urbanismo medieval. A parte antiga da cidade foi construída em uma península cercada pelo Rio Aare e o centro histórico – declarado Patrimônio da Humanidade pela Unesco – é repleto de construções com longas arcadas (com lojas, bares e restaurantes) e atrações imperdíveis como a Torre do Relógio (Zytglogge), cartão-postal na Kramgasse, a rua principal do centro velho, construído no século 13 e que fazia parte dos muros que protegiam a cidade.
Os relógios originais da Zytglogge foram substituídos pelos atuais em 1530, quando apareceu o relógio astronômico, que indica os dias do mês, a semana, as estações, as fases da lua, o posicionamento da Terra em sua órbita e até os signos. Completam o conjunto, figuras animadas, entre as quais um divertido galo de latão, que canta e bate as asas antes de cada hora cheia. Visitas guiadas levam ao interior da Torre do Relógio, onde é possível ver a complexa engrenagem, que funciona sem parar há 511 anos, e ter uma vista perfeita do centro histórico de Berna e do Aare, de águas claras.
Depois de subir e descer a Torre do Relógio, é provável que o turista esteja precisando se hidratar. Aí, é só andar alguns metros, em plena Kramgasse, para matar a sede na Simsonbrunnen, uma das 12 fontes espalhadas pela Berna antiga que fornecem água limpa a qualquer hora do dia. Em cima de cada fonte, uma estátua remete a um aspecto da vida medieval da cidade, que recebeu no início do século passado nada mais nada menos que Albert Einstein. O apartamento, onde em 1905 o físico alemão finalizou a Teoria da Relatividade, fica em frente Simsonbrunnen e foi convertido em museu (Einstein Haus).
Ainda perdendo-se pela Cidade Antiga, ruas estreitas se abrem em pequenas praças, como a em frente ao Rathaus (prefeitura), em que cafés espalham mesas e cadeiras pelo calçamento em paralelepípedo, que pode ainda levar a Münsterplatz, em frente à Catedral de Berna (Münster), construção com uma imponente fachada e figuras de santos (preservadas, mesmo após a reforma protestante) e sua torre de 100 metros de altura, onipresente na paisagem da cidade.
Na ponta da península, do outro lado do rio (passando a Nydeggbrücke, ponte com grandes arcos de pedra), fica o Parque dos Ursos (BärenPark), uma das atrações mais inusitadas da cidade. Em um espaço às margens do Aare vivem ursos-pardos, que passam o dia vagando pelo gramado, descansando sobre troncos e se refrescando no pequeno fosso junto ao rio. Grades separam a área dos bichos e, ao lado do novo parque, está o antigo fosso onde eles viviam até 2009 e que hoje apresenta uma exposição sobre a relação entre a cidade e o animal. Reza a lenda que Bern significaria, no antigo dialeto local, urso. Por ali, há um ótimo biergarten, o Altes Tramdepot, com produção de cerveja artesanal. Grande, amplo e agitado de dia e de noite, o local é uma ótima opção para quem quer desfrutar da gastronomia da região, como a salsicha de porco assada com chucrute, mostarda e pão (17,5 francos suíços).
Jardim de rosas
Para se ter uma visão total da península onde está a Cidade Antiga, o melhor “camarote” é o Rosengarten, um grande jardim com 220 tipos de rosas. O espaço fica no alto de uma colina de onde se vê, de frente, a acentuada curva do Aare, as várias pontes que ligam as duas margens do rio (como Nydeggbrücke) e a imensidão de telhados avermelhados do centro histórico, com a torre da catedral em destaque. Sentado na área externa do Restaurant Rosengarten, o visitante poderá saborear um dos bons pratos do cardápio internacional, como um frango servido com molho de vinho, batata assada e vegetais da estação (26,50 francos suíços), acompanhado de uma weiss (cerveja de trigo), em meio a uma vista inesquecível.
No quesito vista panorâmica, outra atração é o parque localizado no alto do Monte Gurten. A subida é feita por funicular, com teto de vidro que facilita a observação. No alto, o cenário é exuberante e permite uma vista sem igual de Berna. Além disso, há atrações para todas as idades: pais e filhos passeiam em minilocomotivas, há espetáculos ao ar livre e existem dois restaurantes, além de lanchonetes. Chamam a atenção ainda as vacas com pelos longos e grandes chifres, um dos adoráveis símbolos dos Alpes, que pastam calmamente pelo monte.
À noite, não deixe de se programar para jantar no restaurante Kornhauskeller. Ao entrar, o visitante é surpreendido pela imensa escadaria, a amplitude da galeria e a exuberância dos afrescos de Münger, que cobrem o teto. Construído entre 1711 e 1718, o local foi depósito de grãos e vinhos e sua arquitetura é um exemplo do estilo barroco. O menu tem inspiração mediterrânea, mas também traz especialidades da região, como o Bärner-platte, que vem com carne cozida, presunto e bacon, linguiça de porco, chucrute e batatas cozidas (35 francos suíços). O restaurante encerra com chave do ouro a estada na capital da Suíça.
No próximo domingo, Interlaken e a majestosa Jungfrau, montanha mais alta da Europa aonde se pode chegar de trem.
* O jornalista viajou a convite do Switzerland Tourism e a Swiss Air Lines.
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