Turismo

Nas dunas psicodélicas do Maranhão

Adriano Justino
07/06/2012 03:01
“Nestes mares, Mestre João? Sim, cá e code. Por amor de quê? Para sofrer menos. Sofrer de menos ou sofrer de mais? Tanto faz. Andando que rumos donde? Caminhos do Norte. Do Norte ou da morte? Tanto faz. Norte de que? Das águas, compadre. Das águas de mais ou das águas de menos? Tanto faz. Águas ou éguas? Tanto faz. Êta Maranhão grande aberto sem porteira”.
Escrito há 42 anos pelo ex-presidente do Brasil e membro da Academia Brasileira de Letras, o maranhense José Sarney, o texto acima, batizado de “Conversa de canoeiro”, sintetiza o Maranhão de ontem e de hoje, um estado subdesenvolvido, parado no tempo.
Cenário de novela e filmes, que retrataram a realidade brasileira do fim do século 19 e início do 20, o estado brasileiro com uma das maiores taxas de mortalidade infantil e analfabetismo é uma viagem ao passado, embora haja vislumbres de modernidade, principalmente na capital, São Luís.
No entanto, mesmo que sofra com limitações estruturais, catástrofes climáticas e a miséria, o Maranhão tem muito para apresentar. O Parque Nacional dos Lençóis Maranhenses, por exemplo, é uma paisagem única no mundo. Não existe nada parecido em nenhum outro lugar na face da terra.
São Luís, que neste ano recebeu o título de Capital Americana da Cultura, completa 400 anos de fundação em setembro, também merece uma visita. Baú a céu aberto da história do país, a cidade mostra como o povo, e não o poder público, é o verdadeiro detentor da capacidade de guardar e preservar a cultura e o folclore.
Maranhão é mistura de história e natureza
Não tente entender os Lençóis Maranhenses. Em­­bora haja uma explicação lógica para aquele deserto entrecortado por lagos de água doce, que secam por meses e renascem na estação das chuvas, a paisagem projetada incansavelmente pelo vento poderia fazer inveja a René Magritte ou Salvador Dalí. É surrealismo puro, não existe nada igual.
A região faz parte do Parque Nacional dos Lençóis Maranhenses, criado em 1981. Com 155 mil hectares de área, o parque é um campo interminável de dunas (que chegam a atingir mais de 20 metros de altura) extremamente brancas. Observadas à distância, parecem compor uma casca lisa e constante, mas é só se aproximar para perceber a textura imperfeita, varrida pelo vento forte que bate nas dunas o tempo todo.
Lá, as chuvas vão de janeiro a junho. É nesta época que as lagoas surgem, e atingem até 4 metros de profundidade e 1 km de extensão. Aliado a esse encanto, o sol contínuo e as temperaturas entre 31ºC a 39 ºC formam o cenário perfeito para um mergulho. Na seca, o número de lagoas é menor.
Sem resquícios de moradores por perto, os Len­­­­çóis Mara­­nhen­­ses podem ser considerados um deserto. Mas é só por isso. De acordo com o Ibama, chove lá 300 vezes mais do que no Saara – o que faz dele o deserto mais tropical do mundo.
As dunas que existem no Parque Nacional dos Lençóis foram formadas por um conjunto de fatores naturais. Primeiro os rios, sobretudo o Parnaíba, despejaram grande quantidade de areia no oceano. As correntes marítimas se encarregaram de redistribuir essa areia ao longo do litoral, e os ventos a levaram em direção ao interior do continente. As lagoas são formadas pela grande precipitação do período de cheia. As dunas absorvem bastante água e liberam parte para a formação das lagoas.
Para aproveitar
O polo turístico dos Len­­çóis Maranhenses se divide em três cidades Santo Amaro, Atins e Barreirinhas, esta ultima mais preparada para atender as necessidades dos turistas. Para chegar lá é necessário alugar um carro em São Luís ou ir de ônibus. A viagem de 270 km dura cerca de 3h30.
Sem infraestrutura, o acesso ao parque é feito por terra, com veículos de tração 4×4. Apenas os guias locais estão autorizados a entrar. É possível contatá-los em qualquer hotel ou pousada da cidade. Eles cobram, em média, R$40 por pessoa para conhecer os Lençóis.
Com o sol mais brando, o fim da tarde é período do dia mais recomendado para visitar o parque. A visita dura em torno de 4 horas. Para não passar apuros, é bom lembrar que não há banheiros e nem lojas por perto. Tudo o que se permite consumir, deve ser levado com o visitante, inclusive (e principalmente) água.
Para quem tiver pique e disposição, as agências locais também oferecem trekking nas dunas. São cerca de 30 km no primeiro dia (dez horas), 15 km no segundo (quatro horas) e uns 30 km no terceiro (sete horas, sendo metade pela praia). O trajeto atravessa o parque inteiro e passa por Barreirinhas, Atins e Caburé.
Outras opções
Barreirinhas é a cidade mais popular entre os que se aventuram a conhecer os Lençóis Maranhenses. Mas não deixe de conhecer as vilas de pescadores ao longo do rio Preguiças. Partindo de Barreirinhas rumo ao mar, as vilas surgem entre a mata: São Domingos, Alazão, Vassouras, Morro de Boi, Mandacaru, Caburé e Atins.
Pela posição geográfica, Caburé é uma das vilas mais interessantes, espremida num trecho de 300 metros de areia entre o mar e o rio. Outra atração é o Farol das Preguiças, na comunidade de pescadores de Mandacaru. Com 35 metros de altura e 160 degraus, a vista privilegiada do Parque Nacional dos Lençóis é sensacional. O passeio de lancha – com quatro horas de duração – custa, em média, R$50 por pessoa. A entrada no Farol das Preguiças custa R$2.
*O jornalista viajou a convite da BNTM

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