Comportamento

No Dia Internacional da Mulher, elas ganham voz em depoimentos e hashtags

Camila Tremea, especial para a Gazeta do Povo
04/03/2016 22:00
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Da esquerda para a direita, a professora universitária Adriana Baggio, a administradora Valquiria Rosa, a professora Nivea Bona, a advogada Isabela Ribas e a produtora de moda Thainá Sagrado. Fotos: André Rodrigues.

Falar sobre empoderamento feminino é encorajar milhões de mulheres a levarem adiante uma mensagem com ideias práticas que valorizam uma luta com raízes ainda no fim da Segunda Guerra e teve o seu “divisor de águas” na década de 1960, com a famosa “Queima dos Sutiãs”. E nada melhor do que a proximidade do Dia Internacional da Mulher, nesta terça-feira (8), para discutirmos o tema.
Segundo a PhD em Educação, Zita Ana Lago, a mulher sempre foi relegada a uma condição de dependência e subserviência. No entanto, atualmente ela assume uma condição mais plural, buscando seu espaço de direito como protagonista da sua história. “Essa é a mulher contemporânea, construtora de uma sociedade mais justa e mais humana. Por ela que temos empreendido inúmeros esforços”, avalia. Para a analista cultural, Paula Abbas, equilíbrio é a palavra da mulher do milênio. “Ela quer ser respeitada em suas diferenças e não ter que escolher entre uma coisa e outra”, afirma.
SAIBA MAIS
O tema não é exatamente novo. Desde 2010, a Assembleia Geral da ONU criou a ONU Mulheres – entidade das Nações Unidas para a Igualdade de Gênero e o Empoderamento das Mulheres – para acelerar projetos dessa área. A organização tem ganho destaque com celebridades que passaram a erguer esta bandeira, como a brasileira Camila Pitanga e a britânica Emma Watson, ambas embaixadoras da ONU Mulheres.
Hashtags
Embora importantes avanços já tenham acontecido, é necessário manter estas discussões acesas diariamente. Por isso, em comemoração ao Dia Internacional da Mulher, o Viver Bem criou uma campanha que usa hashtags (#) para propagar a luta da mulher moderna. São várias frentes que devem ser discutidas em casa, no trabalho e na sociedade.
A igualdade de gênero está na rua, quando não julgamos pela roupa (#ChegaDeFiuFiu) ou pela aparência (#SouLindaAssimMesmo). Está presente também no escritório, quando a competência é mais importante do que vestir gravata ou saia (#PorUmSalárioIgual) e, inclusive, dentro de casa, quando o companheiro ajuda a cuidar dos filhos e do lar (#TodosAjudamEmCasa), sem fazer uso da força para exercer sua liderança (#ChegaDeViolência).
Nos relatos de cinco mulheres, a seguir, você vai acompanhar como acontece essa batalha diária para mudar o rumo da história feminina. Escolha sua hashtag e compartilhe essa luta!
Está na hora do basta: #diganãoàviolência
“Preciso apanhar para entender que a violência é uma coisa ruim? Ou as estatísticas e as dores das mulheres próximas bastam para me fazer brigar por uma posição mais igualitária? Claro que basta”. Foi de forma direta que a professora e pesquisadora Nivea Canalli Bona, 41 anos, descreveu uma situação presenciada por ela em sala de aula. “Tive uma aluna que escondia o olho e teve que abandonar a faculdade por causa do namorado ciumento. Será que é preciso ver muita violência até que se tenha uma sociedade realmente igualitária?”, questiona.  Nívea afirma que tenta mostrar a seus alunos, independente do gênero, que determinados comportamentos não são naturais. Não é normal alguém ser impedida de fazer algo porque os demais se acham no direito de assediá-la se estiver sozinha na rua, se estiver com determinada roupa. Segundo ela, a violência não se resume apenas àquela que deixa hematomas ou se repete até a morte. Há uma forma de violência sutil, mas que sussurra todos os dias. São cantadas e olhares  que culminam na mesma discussão sobre a roupa ou maneira de se comportar. “Qual mulher até hoje não olhou para o armário e evitou usar uma saia ou um vestido porque sabia que voltaria de ônibus à noite?”. Para ela, as mulheres precisam cada vez mais se posicionar. Ela acredita que ainda existe um imenso caminho até que o respeito seja predominante.
Desrespeito é recorrente: #ChegaDeFiuFiu
Falta de educação? De reflexão? De respeito? De consciência? De empatia? A advogada Isabela Vellozo Ribas, 38 anos, não sabe nem como descrever estes episódios de desrespeito à mulher que, segundo ela, são recorrentes . Ela conta que foi agredida em uma festa por não estar interessada em um rapaz, foi assediada no transporte coletivo, presenciou cenas constrangedoras na rua, esteve em relacionamento abusivo e, a clássica, ouviu cantada na rua que, para Isabela, os homens certamente não fariam às próprias mães. A grande reflexão trazida pela advogada diz respeito ao fato de viver numa sociedade que trata com humor um assunto tão sério, que vê as mulheres como objeto, que permite e encoraja o uso do corpo feminino para vender produtos e é permissiva com o assédio. E pior, chega a culpar mulheres vítimas de estupro porque, afinal, elas deviam estar querendo, vestindo aquela roupa. Outro ponto destacado por ela é a hipersexualização de meninas, que acaba incentivando a pedofilia e é um retrocesso às conquistas pela igualdade de gênero. “Acredito que o corpo da mulher é assunto só dela e que ninguém tem o direito de violá-lo, seja fisicamente ou querendo dizer o que ela pode – ou não – fazer com ele”. A discussão sobre o tema vem ganhando espaço, o que para a advogada é ótimo, e as mulheres estão aprendendo a não se calar, o que é melhor ainda.
Elas ainda ganham menos que um colega: #PorUmSalárioIgual
A professora universitária, Adriana Tulio Baggio, 41 anos, sabe como é ganhar menos que um colega homem. “Numa agência em que trabalhei, meu salário era menor enquanto tínhamos o mesmo cargo e continuou até depois que assumi um cargo superior ao dele”, conta. Lançando mão das estatísticas fica mais claro perceber a discrepância. O Relatório de Desigualdade Global de Gênero 2015 ,do Fórum Econômico Mundial, mostra que a renda feminina é menor que a masculina, para o mesmo cargo e qualificação, no Brasil e em muitos outros países. O dado trata apenas de salário, mas há tantas outras situações profissionais que precisam ser discutidas. Para Adriana, as condições de trabalho, oportunidades e salários deveriam ser equiparadas entre homens e mulheres. “Desqualificar o feminino é uma forma de dizer que ela só pode ocupar o mercado de trabalho se for de um jeito masculino”, aponta. Normalmente, essa diferença dificulta a atuação de ambos nos relacionamentos, na família e, claro, no ambiente profissional, avalia. “Além disso, em países onde a igualdade de gênero é maior, há um melhor desempenho econômico”, acrescenta. Na visão da professora universitária, já existe um saudável crescimento dos espaços de discussão sobre o tema e as redes sociais têm contribuído bastante para isso.
Beleza não tem raça ou biotipo: #SouLindaAssimMesmo
A autoestima está diretamente ligada à valorização da origem étnica e cultural. E para a produtora de moda Thainá Sagrado, 25 anos, a mulher negra é pouco retratada em revistas, editoriais de moda e na publicidade. “Essa situação reforça o preconceito com a mulher negra, que é vista sempre como um objeto sexual, de forma estereotipada, exótica e subalterna”, lamenta. Para ela, essa ausência acaba por determinar como padrão estético feminino apenas a beleza branca do liso, magro e loiro, o que não inclui grande parte das mulheres brasileiras. “Sou negra e passo por inúmeras situações diariamente. Mas todos os dias eu quero vestir a minha pele e a minha estética, que mesmo os outros dizendo que é feia, acho linda! ”, completa. Thainá reforça que ações afirmativas são fundamentais. “As marcas precisam se posicionar em relação à diversidade, pois na falta de referência, as mulheres têm se tornado referência uma das outras”, destaca. Por esse motivo, ela desenvolveu no ano passado o projeto “Noivas Negras do Brasil”. “Algumas pessoas me acham utópica. Eu sigo lutando. A gente conseguiu mudar a Barbie! Tem noção? (fazendo referência às diferentes versões da boneca que foram lançadas recentemente)”, afirma.
Jornada delas é o dobro: #TodosAjudamEmCasa
De um lado a sociedade à moda antiga, com a mulher cuidando dos filhos e da casa. De outro, a entrada da mulher no mercado de trabalho. Dois momentos na vida de muitas brasileiras que têm culminado em uma estatística alarmante: a jornada delas em casa é o dobro da dos homens, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) de 2014. Mas por que não compartilhar com o cônjuge as horas de trabalho em casa? Esta sempre foi uma grande dúvida da administradora Valquiria Porto da Rosa, 40 anos, que foi surpreendida por uma frase da filha de seis anos para os dois irmãos mais novos: “Não pede nada para a mamãe. Vocês não veem que ela está sempre cansada?”. O comentário foi tão marcante que fez Valquiria refletir sobre o exemplo que estava sendo para os filhos. “É triste eu estar sempre cansada, porque não era assim que eu gostaria de estar”, confessa Valquiria, hoje divorciada. Assim, ela resolveu juntar-se a outras mães que passavam pela mesma situação e fundou o Mamaworking, um espaço dinâmico de trabalho e, também, de desenvolvimento dos filhos. “O que falta é uma boa reflexão masculina”, avalia ela. Para a administradora, grande parte dos problemas conjugais hoje está relacionada à divisão de tarefas. “Impossível trabalhar 16 a 18 horas por dia (entre escritório e casa) e, ainda, ter um relacionamento afetuoso”, lembra. As próprias mulheres têm dificuldade em se posicionar. “É difícil delegarmos. O homem não levanta para limpar, mas a mulher também não sabe sentar”, afirma. Para mudar, ela defende o exemplo para as novas gerações. “Só mudamos a cabeça dos nossos filhos quando conseguimos concretizar o discurso.”
INICIATIVAS
Conheça alguns projetos de apoio às mulheres:
Fight Like a Girl
Chega de Fiu Fiu
Empodere Duas Mulheres
Projeto Mulheres
Vamos Juntas
Agradecimento
Maquiagem: Gabriela Tiemi Mori – (41) 9910-1820