Crise da fabricante da Barbie aponta para mudança de estereótipo
Amanda Milléo, com informações Infomoney
07/03/2019 17:00
Queda nas ações da fabricante das bonecas Barbie poderia ser mais que reflexo de uma crise econômica? (Foto: Pixabay)
As ações da fabricante de brinquedos Mattel, sendo os mais conhecidos as bonecas Barbie, tiveram a pior queda dos últimos 20 anos, em meados de fevereiro. A redução foi vista depois de a empresa anunciar ao mercado que esperava vendas mais baixas, e uma margem de lucro menor, para 2019. Mas talvez a redução na procura pelos brinquedos possa significar algo mais comportamental do que algo fruto de um reflexo puramente econômico.
Embora a empresa tenha investido em modelos diferentes da boneca nos últimos anos, visando uma diversidade na forma como as mulheres são representadas, ainda é muito comum associarmos a Barbie a um estereótipo de beleza única: a mulher alta, magra, branca e loira.
Esse modelo é inalcançável — e nem mais desejado — por uma boa parte das meninas. Atualmente, também, está cada vez mais presente nas famílias o discurso de que a mulher é linda da forma que ela for.
“O papel da mulher mudou muito, e a Barbie não acompanhou. A Barbie é uma boneca ainda muito passiva na sociedade. Embora tenham aquelas que são médicas e professoras, a maior parte ainda representa uma mulher dependente. Ela também representa uma pessoa baseada nas aparências. Quantas mulheres no Brasil são altas, loiras, bem vestidas, maquiadas e magras? Uma minoria. A criança não se vê representada assim”, explica Tatiany Honório Porto Aoki, psicóloga clínica e professora do curso de Psicologia da PUCPR.
Incluir bonecas mais representativas nos quartos das crianças pode ser parte da solução — mas a medida não deve ser isolada. A maneira como os pais apresentam os brinquedos aos filhos também afeta a forma como eles irão interpretar o mundo ao redor.
Pode não parecer, mas entre falar que a boneca é “linda” e ressaltar o quanto ela é “inteligente” há um abismo na compreensão de mundo dos filhos.
“A primeira sociedade que a criança conhece é a família. O que os pais valorizam? A beleza da boneca ou o fato de ela ser inteligente e ter alcançado um feito único? De uma forma ou de outra, isso mostra para as crianças o que é valorizado, o que é importante. O que os pais valorizam será o que ela irá se preocupar no futuro”, reforça Tatiany Aoki, psicóloga.
Uma vez recebido esse discurso positivo na infância, a criança cresce com a percepção de que há possibilidades de ser reconhecida por outros por motivos que vão além da própria beleza.
“As exigências sobre a aparência física estão presentes, não tem como ignorar. Mas a criança entende que há algo além, que ela pode investir nisso, caso não se encaixe nesse estereótipo. O impacto na autoestima dessa pessoa é visível: ‘eu não me encaixo, mas sou valorizada porque eu estudo, eu corro atrás, eu tenho um ideal de profissão'”, afirma a psicóloga.
Adultos, os culpados
Os objetos de consumo das crianças são criados com base no mundo dos adultos. Crianças que brincam com galhos, como se fossem espadas, hoje têm armas muito parecidas às reais para tornarem as brincadeiras mais realistas.
“É uma retroalimentação. O consumo na criança é criado por nós, adultos. Essa mulher, que na infância almejava ser a Claudia Schiffer [modelo alemã], hoje é aquela que se submete a dietas. Hoje temos uma variedade de princesas representativas, e isso reflete na criança que também se vê como bonita, mesmo não tendo o cabelo liso, nem sendo magra”, explica Cláudia Cibele Bitdinger Cobalchini, psicóloga, mestre em Psicologia da Infância e Adolescência, professora do curso de Psicologia da Universidade Positivo.
Do lado positivo, além dos brinquedos mais representativos, também cresce as linhas de itens que valorizam mais a infância e menos a adultização. “A Barbie é uma mulher. Ela tem seio, tem namorado, tem uma casa. As crianças brincam numa perspectiva adulta e não de criança”, reforça Cobalchini.