Comportamento

“Não preciso de um rostinho de Barbie. Eu quero viver”, diz paranaense com hemangioma

Talita Boros Voitch
05/04/2017 20:00
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Luciana nasceu com uma pintinha no rosto quase imperceptível. Parecia mais uma marca de picada de mosquito. Aos 8 meses, sua gengiva começou a sangrar sem parar. Sem saberem o que fazer, os pais levaram a filha para o hospital. Foi a primeira das 19 cirurgias que Luciana fez na vida. Nascida em Pato Branco, no Sudoeste do Paraná, Luciana Dorini tem hemangioma, uma formação anômala de vasos sanguíneos na pele ou nos órgãos internos. No caso dela, a pequena mancha evoluiu para um volume no lado direito do rosto. O hemangioma cresceu junto com ela, como costuma dizer.
Hemangiomas são uma forma de tumor benigno, que se parecem com marcas de nascimento, mas não desaparecem nos primeiros meses de vida. Pelo contrário, os hemangiomas progridem durante o primeiro ano de vida do bebê, mas em metade dos casos há uma regressão antes de a criança completar cinco anos. Não é o caso de Luciana. No local onde deveria ter apenas uma veia, Luciana tem mais de 200, irrigadas por quatro artérias. O risco de tentar retirar cirurgicamente o volume no rosto pode levá-la a morte.
Isso não quer dizer que a adolescente Luciana, aos 14 anos, incomodada com a aparência estética que o hemangioma lhe causava, não decidisse se arriscar. “Fiz uma cirurgia plástica com um médico que disse que seria possível retirar. Já na cirurgia ele viu que o meu caso era muito mais complicado havia previsto. Por sorte eu não morri. Foi um risco enorme. Depois disso aprendi a lidar com a estética e decidi que não ia fazer mais nada. Não preciso de um rostinho de Barbie. Eu quero viver”, diz.
De todas as outras cirurgias que passou, 13 foram emergenciais para estancar hemorragias. Além da alteração estética, hemangiomas mais extensos podem levar a sangramentos graves. Os outros 5 procedimentos foram preventivos, justamente para evitar esses tipos de incidentes. “Há cinco anos faço um tratamento que tenta fechar a irrigação das artérias para estes vasos com o intuito de ter uma qualidade de vida melhor. Hoje eu já vivo muito melhor”, diz Luciana. A última grande hemorragia foi há 10 anos.
Embora ainda tenha de enfrentar eventualmente olhares ou comentários maldosos, Luciana leva uma vida normal. Aos 37 anos, trabalha como contadora na Câmara de Vereadores de Mangueirinha, cidade vizinha a Pato Branco, cidade onde leciona à noite na universidade. Pratica caminhada, tem cuidados extras com o sol e sonha em pular de pára-quedas (ideia ainda não aprovada pelo seu médic0). “Tem gente que acha que o hemangioma é transmissível ou diz que a minha mãe passou vontade de alguma coisa na gravidez. Já ouvi bastante coisa, mas o que me machuca mais são os olhares de pena de algumas pessoas”, diz.
Para mostrar justamente que pena não é um sentimento que lhe serve, Luciana criou há dois anos um blog “Eu tenho um hemangioma…e daí?”, para contar sua história e ajudar pais de crianças com hemangioma. “No início eu pensei em passar só informações técnicas, indicando bons médicos, por exemplo. Mas logo apareceram muitas pessoas com dúvidas. A maioria de cunho emocional, sobre preconceito. Muitos querem saber como como se conviver bem numa sociedade que aponta as diferenças”, diz.
Além do blog, Luciana passou também a fazer palestras motivacionais de forma voluntária. “Eu passei muitos anos querendo que as pessoas não olhassem para meu hemangioma. Queria que me olhassem como um todo, mas aprendi que tenho uma diferença e que será para ela que as pessoas vão olhar primeiro. De qualquer forma, eu me respeito pelo o que sou e não é uma marca que vai tirar meu brilho e minha vontade de viver. Não são olhares ruins que vão me impedir de sair de casa. Quero que todos se amem, se respeitam e vivam”.

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