Comportamento

Você consegue jantar sem olhar o celular? Restaurante americano lança o desafio

Claire Ballentine, The Nwe York Times
20/08/2018 18:00
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Foto: Dan Gold/Unsplash.

Quando Marc e Kara Lyons saem com a família para jantar, normalmente entregam aos dois filhos seus telefones celulares para que joguem e vejam vídeos no YouTube. Algumas vezes, os pais pegam os aparelhos de volta para checar seus e-mails e mensagens.
Em uma noite recente no Hearth, porém, um restaurante de inspiração italiana no East Village, os garotos, de 5 e 7 anos, passaram o tempo jogando e pintando e em um papel branco com giz de cera. Os pais conversaram sobre os pontos altos de sua viagem a Nova York – eles moram em Fort Lauderdale, na Flórida – para celebrar o aniversário de 40 anos de Marc.
A razão do jantar sem tecnologia? Os celulares estavam escondidos em uma pequena caixa decorada sobre a mesa, uma iniciativa que Marco Canora, o chef e dono do Hearth, começou em novembro para ajudar os clientes a se desconectar de seus aparelhos por um tempo.
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O vício em tecnologia, e o que olhar para os celulares o tempo todo faz com a cognição, com o bem estar e a produtividade, tornou-se uma das principais preocupações no Vale do Silício. Recentemente, o Google anunciou uma série de atualizações de “bem estar digital”. A Apple, que enfrenta pressão de dois grandes investidores, disse que a próxima versão de seu sistema operacional móvel vai fornecer estatísticas sobre o tempo gasto nos dispositivos.
Mesmo empresas de fora do setor estão abordando o problema. A FedEx pede aos funcionários que deixem seus celulares pessoais em casa, enquanto os executivos da Brown Parker & DeMarinis Advertising e da United Wholesale Mortgage impuseram restrições ao uso dos aparelhos pelos trabalhadores para melhorar a produtividade.

Há limites

Alguns restaurantes, em parte por causa da irritação causada quando os clientes fotografam a comida, colocam limites no uso do celular em suas salas. Outros, incluindo alguns em Chicago e em San Antonio, baniram os smartphones totalmente.
O Hearth está adotando uma abordagem mais suave – não há regras, apenas uma caixa em cada mesa. Uma mensagem em cima dela diz: “Abra-me!”. Dentro há um convite para guardar o telefone ali durante a refeição.
Há dois anos, Canora começou a pensar em como tentar conter o comportamento cada vez mais distraído de seus clientes. Primeiro, achou que podia perguntar a eles se queriam deixar seus celulares no balcão, como fariam com seus casacos, mas preocupou-se com a possibilidade de criar brigas entre os casais na parte da frente do restaurante. E não quis ficar responsável por telefones perdidos ou esquecidos.
Outra ideia foi pedir aos clientes que entregassem seus dispositivos na hora que se sentavam, mas achou melhor não dar mais uma tarefa a seus garçons.
Finalmente, decidiu pelas caixas vintage, que a gerente geral e diretora de vinhos do restaurante, Christine Wright, comprou na Etsy. Todas são diferentes – algumas são caixas antigas de doces, outras de charutos. Elas complementam a decoração singular do restaurante, que inclui copos de tipos diversos.
Os garçons ignoram as caixas, deixando os clientes descobrirem a opção sozinhos.
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“Não acho que alguém pensa que estamos sendo condescendentes”, afirma Erik Gullberg, bartender e garçom que trabalha no Hearth há quatro anos.
Poucos clientes passam a refeição inteira sem checar o celular, diz Canora. Se um companheiro de mesa vai até o banheiro, por exemplo, o dispositivo aparece.

“Isso realmente reforçou nossa crença de que é um verdadeiro vício. Você vê as pessoas sucumbirem a ele a noite toda”.

Mesmo que os clientes não sigam a sugestão completamente, ele acha que é melhor do que nada. As pessoas pelo menos começam uma conversa sobre o impacto da tecnologia em nossas vidas.
Alguns clientes afirmam que não precisam da caixa para evitar a tecnologia durante a refeição. Janie Quinn e Elissa Epstein, amigas que moram em Manhattan, viram a caixa, mas não colocaram seus telefones ali. “Minha bolsa é a mesma coisa. Eu não preciso de uma caixa”, explicou Janie. Ela ficou preocupada com a possibilidade de esquecer o celular na hora de ir embora. “Sério?”, brinca Canora. “Eles estão contando os segundos antes de pegá-lo de volta”.

Reflexões sobre o “vício” virtual

Joy Habian, que mora em Tribeca, conta que queria esquecer o celular dentro da caixa, falando do imenso papel que a tecnologia tem em sua vida. Embora tente não checar o telefone enquanto está comendo em restaurantes, ela diz que só tem sucesso cerca de 75% do tempo. “É um hábito inconsciente. Não é racional ou significativo”.
No Hearth, ela colocou o celular na caixa decorada e tentou focar mais em apreciar a refeição. Os clientes também costumam usar os smartphones durante as refeições para publicar fotos de sua comida no Facebook ou no Instagram, em geral marcando o restaurante, o que se torna uma fonte de publicidade gratuita. Por causa das caixas do Hearth menos clientes estão fazendo isso.
No início, alguns dos membros da equipe do Hearth se preocuparam com a possibilidade disso prejudicar os negócios. Depois, Canora decidiu que o público fiel que o restaurante atraiu em seus 14 anos significava que eles não precisavam depender do Instagram.
Isso não quer dizer que a plataforma de rede social não tenha conteúdo sobre o Hearth. “Vemos as pessoas publicando no Instagram sobre as caixas, então não sei se perdemos ou ganhamos aqui, mas acho que ainda é bom para nós”, brinca Wright.
Ainda assim, ela diz que a maioria dos clientes não tinha ouvido falar das caixas. O restaurante ainda não recebeu reações negativas do público, e a maioria faz comentários entusiásticos.
Marc Lyons com certeza se tornou fã da estratégia do Hearth, observando que ele e a mulher gostaram de conversar sem distração. Seus filhos pediram os celulares apenas uma vez, e ele rapidamente descartou o pedido. Em vez disso, os meninos se divertiram com um jogo da velha, e Marc Lyons os ensinou a jogar forca. Ele está até planejando copiar a ideia de Canora. “Estamos precisando de uma caixa dessas em casa”, afirmou.
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