Mulher Maravilha atravessa gerações como símbolo da revolução feminina
Marina Fabri
02/06/2017 18:00
Foto: Divulgação.
A Mulher Maravilha acaba de ganhar as telas de cinema pela primeira vez em um filme só seu – honra que já vinha (e continua) sendo concedida a seus colegas heróis do sexo masculino há muitas décadas. O Superman e o Batman, por exemplo, nasceram nos quadrinhos em 1938 e 1939, enquanto a Mulher Maravilha veio logo depois, em 1941. E apesar de suas outras adaptações para a TV, foi só em maio de 2017 que Diana Prince, seu nome “civil”, virou protagonista do seu próprio filme. Não só: ele está atualmente entre os filmes de super herói com as melhores avaliações no site norte-americano Rotten Tomatoes, que reúne opiniões de críticos de cinema certificados – 93% de aprovação.
“Essa estreia faz muito sentido no momento que vivemos hoje e vem para consagrar uma tendência – a de oferecer às meninas e mulheres exemplos de protagonistas fortes, que tomam a dianteira”, explica o professor universitário e mestre em cinema Paulo Camargo. Dirigido por Patty Jenkins, a diretora de Monster – Desejo Assassino, Mulher Maravilha vem justamente para mostrar as origens míticas da personagem, criada para ser uma guerreira em ilha sem a presença masculina.
Vivida pela israelense Gal Gadot, que pela segunda vez empresta seu rosto à Mulher Maravilha (a primeira foi durante Batman x Superman, em que faz uma participação), essa versão da personagem vem diferente de suas representações anteriores. “Lynda Carter, que interpretou a protagonista na série de TV dos anos 1970 era uma Mulher Maravilha mais alegre, bobinha até, enquanto a de agora, apesar de continuar tendo seus momentos divertidos, é uma guerreira”, explica a pesquisadora Mariana Oliveira, que está fazendo sua tese de mestrado em Comunicação e Linguagens sobre a ressignificação da Mulher Maravilha.
Um dos exemplos disso é o figurino – se antes, a Mulher Maravilha de Lynda Carter vestia sua roupa tradicional meio que por mágica (ela só rodopiava e já estava pronta), a de Gal Gadot a veste como uma armadura. “Isso é importante especialmente porque a maioria das mulheres da DC Comics retratadas nos cinemas tem imagens negativas, como a Mulher Gato, que é uma vilã, e a Arlequina, que vive um relacionamento abusivo com o Coringa”, complementa Mariana.
A origem da Mulher Maravilha
A historiadora da Universidade de Harvard, nos Estados Unidos, Jill Lepore, autora do livro A História Secreta da Mulher Maravilha, explica, em sua obra, que a personagem nunca foi uma heroína “comum”. Ela foi criada em 1941 por William Moulton Marston, um homem com uma história de vida bastante inusitada, e já nasce com um ícone feminista. Tanto é que ela é apresentada pela primeira vez da seguinte maneira: “A Mulher Maravilha tem braceletes soldados aos pulsos; ela pode usá-los para repelir balas. Porém, se deixar algum homem soldar correntes a estes braceletes, ela perde o seu poder”.
E isso tem muito a ver com a história singular de seu criador, uma pessoa inquieta que tentou ser professor, psicólogo e advogado, mas acabou sendo conhecido mesmo por ter inventado o detector de mentiras – na esfera pessoal, Marston era polígamo e se relacionava com mulheres intimamente ligadas ao nascimento da causa feminista nos Estados Unidos. Uma de suas mulheres foi Sadie Elizabeth Holloway, aluna da primeira universidade que aceitava mulheres no país, além de fazer parte de uma liga que pedia direito de voto, educação e controle de natalidade para todas. Olive Byrne, que também foi sua mulher, tinha ligações com o comitê feminino do Partido Socialista e militava pelo controle de natalidade.
“Ela é o elo perdido numa corrente que começa com as campanhas pelo voto feminino nos anos 1910 e termina com a situação conturbada do feminismo um século mais tarde. O feminismo construiu a Mulher-Maravilha”, disse Jill em seu livro.
Mulher protagonista
Diane Prince e seu alter ego, como explica Cátia Damasceno, mastercoach em relacionamento e especialista em autoestima feminina, não só refletem as mulheres de hoje como também servem de inspiração. “Para mim, a lição mais importante que a Mulher Maravilha nos traz é a de que devemos ficar livres da imposição de padrões e qualquer outra opressão social que cria indivíduos inseguros, presos a preconceitos e que vivem dependentes da aprovação externa – trata-se de tomar para si o poder de controlar o próprio corpo, as próprias vontades e a própria vida”, diz.