Abandone o espelho! Ficar sem se ver por um ano mudou a vida de americana
Amanda Milléo
17/08/2016 14:42
(Foto: VisualHunt)
Seis meses antes do seu casamento, a socióloga norte-americanaKjerstin Gruys tomou uma decisão radical. Passaria um ano sem se olhar no espelho. Isso porque, durante os preparativos para a cerimônia, percebeu que estava muito preocupada com a sua imagem, principalmente depois de comprar dois vestidos de noiva.
Embora encantada com o modelo e o acabamento, Kjerstin não conseguiu esconder do olhar que o primeiro vestido marcava algumas gordurinhas da cintura e do quadril – e aquilo mexeu com sua autoconfiança, criando um ressentimento (que só crescia) com a sua imagem.
“Eu perdi tempo e energia emocional no processo. Comprar o vestido me colocou no limite, e com os testes de maquiagem e cabelo para o casamento, eu teria muita vaidade ainda por vir. Alguma coisa precisava ceder. Era hora de olhar de frente para o espelho – ou não?”, publicou a também pesquisadora em autoimagem e feminismo no seu blog A Year Without Mirror, onde relatou toda a experiência longe dos espelhos, e que depois se transformou no livro “Mirror, Mirror Off the Wall”, publicado em 2013.
38 é a quantidade de vezes que as mulheres britânicas se olham no espelho todos os dias, de acordo com estudo publicado na revista científica Behaviour Research and Therapy. Em comparação, homens se olham apenas 18 vezes por dia.
Das regras que Kjerstin separou para o período, as principais foram: reflexos nas superfícies contam também, então vitrines e qualquer superfície reflexiva precisam de atenção especial; olhar para aprópria sombra é permitido; quando usar skype ou outros programas de vídeo chamada, desabilitar as funções que permitem que veja a própria imagem; além de ter ummês de período de transição, para entender como vai funcionar a rotina diária de maquiagem, arrumar o cabelo, colocar lentes de contato – sem a ajuda do espelho.
E a maquiageme o cabelo? “Good enough” virou um mantra para a pesquisadora. Ou seja, bom o suficiente é bom o suficiente, e quanto menos cor usar, mais longe de parecer alguém que acabou de beijar um palhaço maquiado. Ao longo dos dias, Kjerstin aprendeu a diminuir os produtos que usava, como passar a base e o protetor solar juntos, ao invés de dois produtos separados. Deixou de lado cores muito fortes, e treinou bastante para passar o rímel sem precisar de ajuda do espelho.
O que ela queria descobrir?
“Era possível que, removendo os espelhos da minha vida, isso poderia causar mais obsessão ou insegurança sobre a minha aparência? Será que eu perderia completamente a habilidade de aplicar minha maquiagem ou ajeitar o meu cabelo, ou selecionar roupas chiques e que me trouxessem elogios?”
E o que ela descobriu?
Foram muitas as conclusões que a pesquisadora encontrou, mas as principais foram: “Quando se trata de corpo e beleza, as pessoas que importam não se preocupam com isso, e as pessoas que não importam, elas sim se preocupam”; “Meu corpo está perfeito, mas a minha mente precisa de uma melhorada” e “Sentir-se bonita é mais importante do que parecer bonita.”
E eu? Largo o espelho de vez?
Embora para Kjerstin o abandono do espelho tenha funcionado, essa não é uma solução que cabe a todo mundo. Antes de começar o jejum dos reflexos, vale pensar em como está a sua autoestima.
“Ter autoestima é ter um autoconhecimento. Se você não gosta do que vê no espelho, você talvez esteja deixando que o externo, que os outros, que o espelho dite como você deveria estar, o seu estado de humor, se você deveria estar feliz ou triste. Fazer um jejum do espelho talvez não seja a solução, mas trabalhar o crítico que existe dentro de todos nós, e não deixar que esse crítico tenha tanta voz e impacto no que a gente sente”, explica Tatiana Leite, psicóloga terapeuta de casal e de família.
Calar o “crítico”interno pode não ser uma tarefa fácil, principalmente porque atribuímos valores a nós mesmos com base nos elogios e críticas que recebemos desde a infância, a partir dos pais, colegas e professores. Somos categorizados como inteligentes, bonitos, bem sucedidos, dentro do “padrão” de beleza ou não, de acordo com Vera Regina Miranda, psicóloga e professora aposentada da Universidade Positivo, e tentamos refletir essas características no espelho. Quando elas não estão lá, nos sentimos mal.
“Quando a Kjerstin deixou de olhar no espelho, deixou de ser escrava da vaidade visual. Ela não ficava mais tendo, o tempo todo, um feedback de como a sua imagem estava refletindo ou de como os outros estavam olhando para ela”, comenta Vera Regina, que ressalta uma das conclusões da pesquisadora: não se importar tanto com o que os outros viam nela.
Para diminuir essa autocrítica exagerada, vale outros exercícios.
Um exemplo: olhe-se no espelho e mentalize que você é mais do que sua aparência, mais do que aquilo que reflete no espelho, aquilo que você está vendo ou que os outros enxergam em você. Diga em voz alta: eu tenho um valor maior, eu me aceito, eu me gosto do jeito que eu sou.
Cultive valores e ideais que não apenas estejam relacionados ao próprio corpo, conforme sugere a psicóloga Maria de Brito, pós doutoranda pela Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP) e professora afiliada da disciplina de Cirurgia Plástica da mesma instituição. “Aceitar as imperfeiçõesdiárias da vida, e consequentemente do corpo, aprender a falar sobre as emoções, desvinculando-as do corpo, e proporcionar um modelo de autopercepção saudável e ter consciência crítica pode ajudar a criar uma autoimagem mais segura”, diz.
“O autoconhecimento é para a vida toda. Sempre teremos coisas na vida que não nos servem mais e precisam ser mudadas. As pessoas amadurecem e nunca estaremos prontos, não existe uma versão final. Mas, quanto mais a gente conhecer sobre nós mesmos, mais confortável ficaremos no nosso corpo, com as nossas limitações, com os nossos medos, com os nossos gostos”, diz Tatiana.