No litoral do Paraná, mulheres dominam o surfe desde criancinhas
Marina Mori
22/02/2018 12:00
Gabrielly Vasque, 10, e Luara Mandelli, 9: garotas paranaenses que já estão brilhando no surfe. Foto: Albari Rosa / Gazeta do Povo | Albari Rosa
Todo dia elas fazem tudo sempre igual: acordam cedo, tomam café da manhã juntas e, das 8h30 ao meio dia, caem no mar de Matinhos, no litoral do Paraná, com as pranchas nas mãos em busca de ondas inesquecíveis. Há um ano, esta é a rotina de Thiara Mandelli e sua filha, Luara, de apenas nove anos.
Juntas, as duas se preparam para os campeonatos de surfe que ocorrem ao longo da costa brasileira. “A gente aproveita esse momento para ter um momento de mãe e filha juntas. À tarde, quando ela vai para a escola, faço minhas coisas e no fim do dia caímos na água de novo”, conta a mãe.
Quando pisou pela primeira vez em uma prancha de longboard, há 14 anos, Thiara decidiu que sua vida não poderia mais ser vivida longe do mar. Foi assim que a caloura de direito de 18 anos, nascida e criada em Maringá, mudou-se definitivamente para Matinhos. “Eu ficava na areia vendo meu namorado surfar nos fins de semana, até que um dia cansei de só olhar”, relembra.
Três meses depois, começou a disputar campeonatos. Não parou mais. Hoje, aos 32 anos, a surfista profissional coleciona um título atrás do outro. É vice-campeã brasileira, heptacampeã paranaense, tetracampeã catarinense e vice-campeã sul americana de surfe. Por isso, não é de se espantar que a filha também esteja remando na mesma direção.
Luara esteve em contato com o surfe desde sempre. Com 35 dias de vida, acompanhava os pais em campeonatos pelo Brasil e pelo mundo, da China ao Peru; aos sete, equilibrou-se na prancha para valer e, desde então, treina diariamente ao lado da mãe. Da areia, o pai, também surfista, e um técnico registram as cenas para que em casa possam avaliar os erros e acertos.
Foi assim que, de onda em onda, a Mini Miss Fotogenia Brasil 2014 tornou-se campeã garopabense e vice-campeã brasileira, catarinense e paranaense na categoria sub 12 de surfe. Ao falar de suas inspirações no esporte, Luara tem dezenas de nomes na ponta da língua – todas surfistas mulheres, a começar pela mãe. “Ela me ajuda muito”, conta.
Meninas na disputa
Gabrielly Vasque, 10, descobriu o surfe há dois anos e já detém o título de campeã brasileira. Tudo começou como uma brincadeira durante o contraturno das aulas: Gaby foi uma das 500 crianças que participam anualmente do projeto Ondas do Saber, mantido pela prefeitura de Matinhos. Criado em 2009, o programa surgiu para incentivar as crianças a se aproximarem do esporte.
“Não há muitas meninas no curso. Por isso, quando elas veem que têm capacidade de surfar a gente incentiva muito”, conta a surfista Larissa Sadoski, que foi mentora de Gaby nas primeiras vezes em que a pequena subiu na prancha.
A garota demonstrou tanta agilidade e domínio dos movimentos que logo passou a competir com surfistas mais experientes, já que não havia nenhuma categoria feminina infantil nos campeonatos. Apenas no ano passado Gaby teve a chance de competir de igual para igual em Matinhos e, depois, em Santa Catarina e São Paulo.
“Ela e as outras meninas da idade dela se obrigavam a competir na feminino open, para meninas maiores de 18, 20, 30 anos”, conta o pai da campeã brasileira, Edson Luiz Vasque.
Time de ouro
Nas poucas horas em que as meninas não estão na água, brincam com outras crianças que também se dedicam ao surfe como gente grande. Junto com Anuar Chiah, 8, que já foi campeão paranaense de 2016, Ryan Coelho, 10, que subiu ao pódio na liga californiana do mesmo ano e faz parte do Instituto Gabriel Medina (em São Paulo), e Victor Hugo Inácio, 12, atual campeão paranaense, elas formam um time de ouro quando o assunto é pegar ondas.
As crianças se reúnem sempre no Aloha Surf Clube, nos fundos da casa de Antonio José de Barros (mais conhecido por Juca de Barros), 59. Lá – um espaço verde com varanda em madeira e decorado com motivos de surfe -, o ex-mentor de surfistas como Gabriel Medina, Miguel Pupo e Wiggolly Dantas dá conselhos aos pupilos de Matinhos.
“Eles são as promessas do surfe, pode ter certeza. Mas, antes de mais nada, criança tem que brincar. Para isso, é importante que a família seja bem estruturada e consiga administrar o momento de ela estudar, brincar, surfar”, diz Juca. Ao que depender desta nova geração de surfistas, a receita para o sucesso parece estar sendo seguida à risca.