Os prós e contras de quem decide deixar o Brasil em busca de uma vida melhor
Marina Mori
19/07/2017 18:00
Isadora e a família. Foto: Arquivo Pessoal
No ano passado, mais de 18,5 mil brasileiros disseram adeus ao Brasil, segundo a Receita Federal. O número é mais que o dobro em relação a 2011, quando 8 mil deixaram a pátria em definitivo. Mas nem todos se mantêm firmes na decisão, ou acham fácil trocar a crise por países de primeiro mundo. A saudade de casa e a dificuldade de adaptação a uma nova cultura são alguns dos fatores que trazem muita gente de volta ao lar.
“Várias pessoas acham que vão ter uma vida mais confortável por ter escolhido um país desenvolvido. Isso pode ser verdade, mas é preciso lembrar que existirão outros aspectos bem mais desconfortáveis. Além disso, o fato de mudar de país não vai resolver os problemas de ninguém”, afirma a psicóloga e coach Raquel Sá, que atua com brasileiros expatriados. Depois de ter vivido na Austrália por um ano e meio, ela criou o Lar Além Mar como uma forma de ajudar quem tem dificuldade de adaptação em outra nação.
Para a especialista, muitas pessoas acreditam que a vida vai ser muito melhor fora do Brasil. Isso até pode ser verdade nos primeiros meses, enquanto tudo está envolto em uma aura de glamour. Aos poucos começam os problemas: contas para pagar, trabalhos que não correspondem à formação que a pessoa tinha aqui, saudade de casa.“Morar fora é se propor a fazer uma imersão em uma zona de desconforto. Quando crescemos, fazemos isso em etapas mas, em um intercâmbio, tudo ocorre ao mesmo tempo: é preciso se acostumar com a distância, aprender a conviver com uma nova cultura e recomeçar uma nova vida de uma vez só”, explica.
Uma forma de contornar a tristeza é se manter vinculado às pessoas queridas, segundo Raquel. “A dica é conversar frequentemente com a família e os amigos. Mesmo que virtualmente, dividir conquistas e frustrações de ambos os lados faz com que o expatriado se sinta incluído ao compartilhar sua rotina”, sugere.
Quer deixar o Brasil?
Quem tem vontade de ir embora deve prestar atenção a alguns detalhes. Segundo a coach, a dica é analisar se a partida representa uma fuga ou uma busca por experiências novas. Além disso, é importante trabalhar o autoconhecimento: quais seriam os fatores mais difíceis de suportar à distância?
O essencial, porém, é tirar o caráter de definitividade das resoluções. “Muitas pessoas tomam a decisão de partir como se a possibilidade de voltar ao Brasil fosse inviável e representasse um fracasso. Isso não tem nada a ver, é natural e pode acontecer, sim. Não significa que você não possa aprender com a sua experiência”, garante a coach.
Saudade de casa
Isadora Ricardo Guerra, 26, cursava o primeiro período de medicina, em Curitiba, quando descobriu que estava grávida. A partir de então, sua vida mudou por completo. Ela e o marido, Bruno, escolheram o Canadá para criar Olívia e, há quase dois anos, vivem em Winnipeg – ele trabalha como designer gráfico e ela como confeiteira. “Viemos sem nada, só com os vistos. Mas não sabíamos que seria tão difícil, principalmente pelo frio. São cinco meses com temperaturas negativas que chegam a -40°C no inverno”, conta.
Mas, ao sair do Brasil por causa da falta de segurança, o casal também se afastou do conforto da família. “O mais difícil é isso. Nossos pais não veem a Olívia crescendo e nós ficamos longe de quem amamos. Todos os dias dá vontade de voltar”, desabafa Isadora.
Apesar da saudade, a família não pretende voltar, por enquanto. Em poucos meses, Isadora dará à luz uma nova filha, Betina, e, por isso, seguirá tentando se acostumar com a distância. Ela publicou, recentemente, um post em seu Facebook sobre as dificuldades de ser uma expatriada. “Tento me convencer de que está e vai ficar tudo bem. E na verdade eu tenho é medo de admitir que tomei a decisão errada. Ou pior! Tenho medo de voltar atrás e me arrepender duplamente por ter desistido duas vezes. Faz sentido? Mas o que importa nessa vida?”, escreveu.
Eles voltaram
Um mês após chegar na França, Leonardo Zappa começou a sentir os efeitos do choque cultural. Com apenas 20 anos, o jovem deixou o Brasil para morar por cinco anos em Lyon, onde cursaria a faculdade de engenharia. O plano não deu certo. Leonardo voltou a Curitiba no fim de junho, após passar um ano vivendo no velho continente.
“Eu me sentia muito deslocado. É difícil se relacionar quando você não é fluente na língua – você não entende as piadas, não parece ter maturidade quando fala. Isso fazia com que os franceses se afastassem”, conta. Outro fator que o incomodava era o modo como ele percebia as relações em geral. “Percebi um individualismo bem forte, eu sentia que ninguém se importava com o outro.”
Para tentar curar a saudade, Leonardo passou a ter consultas com a psicóloga da faculdade. Mas a dificuldade em traduzir os sentimentos para outra língua o fizeram buscar ajuda do outro lado do oceano, no Brasil, através de atendimento online. “Cheguei à conclusão de que eu não estava feliz com a forma com que eu estava construindo a minha vida, longe das pessoas que eu amo. Foi aí que decidi voltar”, conta.
A experiência se tornou essencial para o crescimento do estudante. “Antes eu tinha um excesso de autoconfiança, até uma arrogância em relação a alguns aspectos da vida. Hoje, depois de tudo, me sinto mais maduro, com os pés no chão. Me conheço melhor”, diz.
O estudante Silvio Maranhão, 21, também retornou ao Brasil antes do previsto. Ele foi para a Austrália com o intuito de cursar cinema e ficar por lá mas, assim que terminou o curso de um ano, voltou. “Em um certo ponto eu não sabia mais o que fazer. Tinha saudades da minha casa, de sentar no meu sofá, de dormir com o meu cachorro”, conta. Mesmo com a cidadania australiana, obtida para a mudança definitiva, algumas questões falaram mais alto, como a dificuldade em conseguir um emprego.
“Sempre fica um pouco daquela frustração de dever não cumprido, mas tentei ignorar porque teoricamente meu dever estava cumprido. Fui para estudar, acabei o curso e tirei meu diploma. Ao mesmo tempo penso: será que desisti muito cedo? Acho que eu podia ter aguentado, mas não me arrependo da decisão de ter voltado”, revela.