Paulo José da Costa é de Ponta Grossa, comerciante livreiro, memorialista, blogueiro, youtuber, dono de acervo e criador das comunidades Cotidiano de Antigamente em Curitiba e Antigamente em Ponta Grossa, no Facebook.
Cinco postais, cinco histórias
Paulo José da Costa
08/04/2022 20:06
Cartão enviado por
De Bona para Freyesleben, em 12 de outubro de 1929.
Arrisco dizer que um cartão postal ou uma fotografia pode mudar a história. Quem os coleciona às vezes não atina para o valor documental desses pequenos papéis retangulares arquivados em álbuns de família e muitas vezes jogados fora por herdeiros descuidados. A eles, sempre digo: antes de rasgar e colocar no lixo os papéis guardados por um antepassado, passe para alguém da família que se interesse ou lembre daqueles abnegados que solitariamente e sem nenhum apoio cuidam da memória dos antigos.
Nesse caminho, quero mostrar alguns exemplares de meu acervo, que atingiu a marca de mais de oito mil cartões postais de grandes fotógrafos do Paraná, como Wischral, Foggiatto, Linzmeyer, Armin Henkel, Groff, mas também de amadores e anônimos, que sempre estamos em busca de pistas para identificar.
O primeiro é de Arthur Wischral (1894-1982), conhecido por suas imagens da Serra do Mar e sua ferrovia, mas também por documentar a transformação urbana de Curitiba. Arthur registrou inúmeros momentos históricos, e um deles, quando tinha 17 anos apenas, foi a formação da Guarda Civil de Curitiba. Isso foi antes de ir para a Alemanha se aperfeiçoar e onde permaneceu em Würzburg trabalhando como aprendiz da arte fotográfica no período da Primeira Guerra Mundial (1914-1919).
Do grande lote de 15 imagens desse evento, selecionei uma, tirada na Praça Zacarias em 25/11/1911, em que aparece a primeira formação da Guarda e se destacam, sentados, o seu comandante Dario Fagundes Gaertner (centro), o fiscal Generoso Nascimento (esquerda) e o fiscal Pedro Lago Marques (direita). A Guarda foi extinta nos anos 1960.
João Baptista Groff (1897-1970) tinha um olhar especial para captar o bulício das ruas, o vai e vem de automóveis e bondes, mas resolvi escolher uma vista da rua José Bonifácio (antiga rua Fechada), que normalmente vemos fotografada no sentido inverso, desde a praça Tiradentes e em direção ao Largo da Ordem (cartão 2) Essa imagem não foi colorida por computador e sim pelo próprio artista, à época (sim, havia fotos coloridas, como mostraremos futuramente em outro artigo), e captura de modo quase cinematográfico o movimento dos imigrantes com suas carroças a vender frutas e verduras, registro de uma Curitiba que sumiu e que nos enche de saudades de um tempo que não vivemos mais.
A importância das mensagens nos postais
Existem postais com chamuscados de acidentes de aviões, com colecionadores ávidos. Mas o que escolhi (cartão 3) é menos dramático, mas não menos importante: em 12 de dezembro de 1929, Theodoro de Bona enviou para seu amigo Curt Freyesleben, de Veneza, Itália, um cartão em que diz:
“ … a vida aqui está cada vez mais pesada, mas não importa, o futuro é dos fortes e por isso é preciso não perder a coragem. Doutro lado do cartão está um quadro do Sorolla J. Bastida que mede 3 metros por 2,5… este quadro não é ruim mas o auctor faz apparecer mais a habilidade do que a arte…”
De Bona estava em Veneza estudando com dois mestres italianos com bolsa do estado do Paraná e da Prefeitura de Morretes (que tempos fantásticos aqueles!) e retornaria apenas em 1934, com enorme bagagem artística que incluía prêmio em concurso de Roma e diversos quadros seus incorporados aos acervos da galeria de Veneza e a prefeitura da mesma cidade.
Vejam a importância de uma mensagem num simples cartão postal ao revelar as preocupações da vida de um grande pintor paranaense em terra estrangeira, bem como algo de suas tendências estéticas. É onde o postal entra no campo da fonte primária de história.
O quarto cartão que escolhi para o leitor é de 1905 e é um documento etnográfico enviado por um admirador de uma senhora Palmyra Seiler, residente à rua José Bonifácio em Curitiba. O carimbo é de Bela Vista de Palmas e tem a data de 27 de março de 1905. Diz o tal admirador, cujo nome não desvendamos:
“Palmyra, embora no meio dos índios nunca a esquecerei. Saudações do admirador transviado por estas paragens.” E escreve de punho a legenda importante: “Índios caigangs. Bella Vista de`Palmas, Paraná.”
Nossa viagem pelas imagens do passado termina com um registro editado na França na primeira década do século 20, em Miguel Calmon, uma colônia de eslavos na região onde hoje é o município de Ivaí, no Paraná. Possivelmente, são ucranianos e impressiona a alegria demonstrada nas feições de muitos deles. O único ser vivo que parece não gostar e vira o rosto para o fotógrafo é o cachorrinho, bem à direita na imagem (cartão 5). Ou estava interessado em outra coisa, vai lá saber.
Até a próxima!
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*Paulo José da Costa é de Ponta Grossa, comerciante livreiro, memorialista, blogueiro, youtuber, dono de acervo e criador das comunidades Antigamente em Curitiba e Antigamente em Ponta Grossa, no Facebook.