Cotidiano de Antigamente

Paulo José da Costa

Os melhores amigos do homem

Paulo José da Costa
25/04/2024 13:53
Thumbnail

Família com cãezinhos, registrados provavelmente em 1910. | Arquivo pessoal

“Meu cachorrinho dorme ao meu lado. Presto atenção no seu respirar sossegado, de puro descansar junto ao seu companheiro humano. Às vezes, ele até dorme em minha cama e, de tanto observá-lo, percebo que temos muitas coisas em comum. Eu respiro, ele respira. Ele tem dois olhos iguais aos meus, com certeza, mais atentos a tudo, mas, como se sabe, sem as mesmas cores que vejo em profusão. Seu olfato é mais acurado e isso lhe dá vantagens em diversos quesitos. Ele tem ouvidos mais sensíveis e alguém dirá que, apesar disso, não tem sentimentos para a música… quem garante? Ele se alimenta e eu também, ele adora pão com manteiga, eu menos que ele até. Ele tem língua, dentes, pelos, estômago, bexiga, rins… coração! Ele urina, defeca, fica enjoado, tem dor de barriga, tudo igual a mim. Ele é meio tolinho, disso não duvido, apesar de ser um poodle, mas o seu companheiro, Picasso, de mesma raça, é muito mais esperto e até penso que só falta falar. Então, como nós, alguns cães são mais inteligentes que outros, alguns são mais dóceis que outros. Alguns, pela educação ou natureza, são raivosos e mesmo perigosos. Se somos tão parecidos em tudo, exceto na aparência física, com certeza absoluta viemos de uma mesma forma ancestral, sabe-se lá em que milênio da história terrestre. De alguma maneira, somos filhos de uma mesma forma no passado que, em certo momento, teve mutações e cada um seguiu para seu lado. Mas o cachorro, apesar de tudo, permaneceu junto do homem, por comodidade ou por afinidade. Afinal, somos irmãos, vindos de uma mesma fonte. Neste mundo, os cães, como muitos outros animais, são nossos irmãos. No dia em que todos os homens perceberem isso e passarem a tratar esses seres como amigos, semelhantes vindos de uma matriz comum, talvez o tão decantado “éden” ressurja entre nós. Enquanto esse dia não chega, eu e meu Tobby temos nosso paraíso particular, aqui em casa mesmo. Eu me entristeço sem ele, ele fica triste sem mim”.
Escrito em 2019, esse texto em nada mudou, salvo o cãozinho Picasso, que foi para as estrelas e possivelmente está ao lado de minha filha Cecília, a veterinária da família que o adorava.
Os cães sempre me acompanharam, desde minha infância. Lembro de cada um deles porque todos eles me marcaram de alguma forma. O Quimo foi o primeiro e morreu atropelado em minha frente, cena que até hoje não gosto de lembrar. Depois, veio o Papageno, que, no fim da vida, resolveu fugir para morrer em algum lugar, tal como os elefantes. Eu logo consegui o Papageno 2, que em nada lembrava o primeiro no temperamento, mas que sumiu um dia da mesma forma – o bom para quem tem cães muito próximos em sua vida é adotar um segundo filhotinho para quando o primeiro partir, você ter o outro para lhe ajudar a suportar a dor. Nunca será o mesmo, mas é um consolo. E com o tempo o seu coração aceitará a falta do primeiro. Conselho de quem teve já 11 cães em sua já longa vida…
Depois do Papageno, veio o Caruso, um pinscher ladino que sempre foi o queridinho da minha esposa Valéria. Depois a Conchita, que tinha um defeito nas patas traseiras e, por isso, era adulada e paparicada. E foram vindo outros, a tal ponto que um dia nos vimos com quatro em nosso quintal. Entre eles, a Chimbica, uma cachorrinha guapeca, apareceu do nada com a barriga cheia de filhotes e nos adotou, enchendo a casa de alegria com seus pimpolhos.
Há uma tendência de castração geral de todos os cães, mas eu acredito que, com responsabilidade e cuidado na doação para pessoas responsáveis, sempre haverá lugar para uma ninhada nas casas aparelhadas, principalmente quando houver crianças. Isso é sabido, elas se tornam humanos melhores em tudo quando têm contato com os bichinhos, desde a saúde até a sociabilidade.
Hoje em dia falar sobre os cães é quase como discorrer sobre obviedades, tantos os escritos sobre eles que inundam a imprensa. Por isso encerro, não sem antes falar sobre a foto do acervo que escolhi para ilustrar esta matéria: a de uma família curitibana que alguém possivelmente me ajudará a identificar – e, se for o caso, colocarei aqui a informação. O ano é provavelmente 1910. Mas vejam se não é formidável e raro eles colocarem os dois cãezinhos para comporem o quadro. E os braços afagando! E como os dois estão comportados! Nem se mexeram, só esperando o clique do fotógrafo. Isso sim é uma foto de família!
O autor segurando o cãozinho Quimo. A seu lado, seu irmão Sérgio. Ponta Grossa, estação ferroviária, 1962.
O autor segurando o cãozinho Quimo. A seu lado, seu irmão Sérgio. Ponta Grossa, estação ferroviária, 1962.