Moda e beleza

A engenharia preciosa de Antonio Bernardo

Larissa Jedyn
24/11/2011 02:33
Seu pai tinha uma loja de artigos para relojoeiros. Esse ambiente influenciou na sua formação?
Desde menino, eu me interessava pelas ferramentas de ourives e relojoeiro que eram vendidas na loja do meu pai. Sabia exatamente a função de cada uma e como usá-las. Sem perceber, já estava me familiarizando com o fazer das joias.
Quando e como você resolveu se iniciar na produção joalheira?
Eu cursava engenharia e ainda no ciclo básico buscava outros caminhos. Como qualquer jovem não sabia exatamente se era aquilo que gostaria de fazer. Eu sentia necessidade de produzir algo concreto. Como gostava de mexer com as ferramentas da loja do meu pai, comecei assim. Eu tinha 22 anos. Quando crio joias, faço pequenos protótipos e penso nas peças se movimentando, nos sistemas de articulação, nas proporções.
Suas peças revelam a destreza no trato do material, no estudo das formas, na engenharia das peças. É a alma de um ourives que fala nessa hora?
É justamente esta mistura do conhecimento básico de engenharia com a destreza do ourives. Sou um autodidata e as inúmeras horas observando as engrenagens dos relógios vendidos na loja do meu pai me levaram às joias. Criar algo original e lúdico sempre me motiva e é o que me faz seguir. Foi assim desde o meu primeiro anel, em que duas partes idênticas podiam ser usadas de várias formas.
Ao mesmo tempo em que você se alia a preceitos e conhecimentos tão tradicionais, sua estética subverte os clássicos e se deleita em design puro. Como se dá esse processo?
Acredito que muitas das minhas joias sejam atemporais. Há modelos que faço há mais de 15 ou 20 anos. Às vezes uma boa ideia sugere diferentes interpretações e instiga a investigação. Procuro não seguir tendências, para que meu trabalho seja autoral. Muitas vezes é a possibilidade do material que conduz a minha criação. Gosto de abordar na minha joia um assunto de cada vez, para que possa ser bem compreendido. Talvez daí um certo despojamento e uma certa simplicidade que acabam resultando numa estética de design.
O seu design privilegia uma beleza essencial, sem sobras, exageros. De onde vem esse gosto?
Minhas peças em geral nascem do meu diálogo com o metal, das minhas observações do cotidiano e das minhas vivências. Mas basicamente são desdobramentos da minha primeira joia. Quando ela ficou pronta, eu imediatamente imaginei outra, como se fosse um desenvolvimento daquela.
A minha inspiração vem das próprias peças. Em geral, o que conta é trabalhar muito e o que compensa é a paixão pelo resultado.
Você trata o material quase como tecido, cheio de dobras, encaixes, movimentos. Seria um jeito mais racional, masculino, de trabalhar com joalheria?
Meu trabalho é muito pautado pelo movimento das peças e pelas possibilidades do material. Assim, quando as joias estão em contato com o corpo é como se ganhassem vida e acompanhassem os movimentos de quem as usa. Não acho que seja racional, é pura intuição e observação das múltiplas possibilidades que o ouro e as pedras oferecem.
Quando você lançou o pin Mosca, houve um flerte com o humor, a transgressão, não é?
O pin Mosca é uma história curiosa. Eu estava trabalhando quando percebi uma mosca em cima da minha bancada. Não notei que estava morta, e fiquei horas observando os incríveis detalhes daquele inseto. Na hora me deu vontade de reproduzir a mosca. Rapidamente solucionei os problemas para representá-la e, quando ficou pronta, achei incrível o resultado pela verossimilhança. Só que depois pensei, quem vai querer comprar um brinco em forma de mosca caseira? Foi o maior sucesso e, com isso, aprendi que quando se trabalha com criação não existe ideia absurda. O pin Mosca fala do humor, de dar valor ao que não tem valor e do lúdico como elemento chave do design.
Quais suas peças preferidas?
Não tenho preferências, pois gosto de cada joia que criei de um jeito. No momento eu estou gostando muito de criar brincos e anéis, mas isso varia bastante. Gosto muito de criar pulseiras também.
Você pensa em como conquistar públicos novos?
Não crio uma joia pensando em quem vai usá-la. Mas existe uma equipe por trás da marca que pensa e pesquisa o mercado. Acabamos de lançar duas coleções para novos públicos, o masculino e o infantil. Quando estou criando não penso numa pessoa específica, faço o objeto sem pensar num destino. O que eu busco é originalidade, surpresa e autenticidade.
Vamos falar um pouco da sua vida fora do ateliê. Li que você gosta de cultivar orquídeas. Ourivesaria e cultivo de flores são ações que merecem dedicação. O que isso diz sobre sua personalidade?
Minha paixão por orquídeas foi despertada com o nascimento de minha filha, quando fui presenteado com uma orquídea em flor. Quando a flor morreu, resolvi aprender a cuidar da planta até vê-la florir novamente. Um dia li no jornal que o Jardim Botânico estava procurando parcerias. Logo me prontifiquei a adotar o orquidário. Meu ateliê fica no mesmo bairro, tenho uma ligação com o lugar, com as orquídeas e achei que seria uma forma de contribuir para a cidade ficar ainda melhor. Cultivar uma planta exige paciência, mas o prazer de vê-la florir é indescritível. Talvez aí esteja algo da minha personalidade.
O que mais gosta de fazer? Ler o que? Música? Viagens? Algum lugar especial?
Gosto de jazz, seja cantado ou instrumental. Também foram fonte de muita inspiração a música brasileira, o rock, a música clássica e diversos outros estilos em diferentes períodos da minha vida. A música me transporta para outra dimensão, abrindo espaço para a interiorização e permitindo a concentração naquilo que estou fazendo.