Moda e beleza
Estilista João Pimenta aponta moda masculina como futuro da indústria fashion brasileira

Parece ser uma coisa complicada, mas não é. Eles são até mais exigentes do que as mulheres, mas o mercado todo está voltado para elas. Eu comecei fazendo feminino. Abri uma loja e percebi que os meninos vasculhavam as araras procurando qualquer coisa que servisse neles. Percebi um campo gigante ali. As pessoas acham que o homem brasileiro não quer experimentar, que não tem ousadia, mas isso é muito fora da realidade. O homem tem uma sede muito grande de inovação. É desafiador, porque as pessoas ainda associam orientação sexual com a cor da roupa e o tipo de sapato, e o homem ainda tem medo de se mostrar ousado. Parece complicado, mas é fácil porque existe um desejo muito grande do mercado masculino.
É engraçado, pois todos querem a mesma coisa: um pequeno diferencial. Eles não querem se vestir igual ao outro, mas também têm um certo limite. Um dos motivos para se vestirem bem é conquistar mulheres, e os mais inteligentes sabem que elas vão prestar mais atenção a alguém mais sensível. O homem ainda tem uma dificuldade muito grande com essa questão de delicadeza. A mulher sabe se divertir com a roupa, cada dia está de um jeito e assume isso como uma qualidade. Eles são travados neste sentido, mas não querem ser iguais.

Se tem um lugar para a moda crescer, é na ala masculina. Já se experimentou muito para o feminino, então querer inovar nessa área é até déja vu. Antes a mulher escolhia o que eles iam vestir, e hoje o homem compra as próprias roupas. Existe uma necessidade gigante no mercado de inovação, tanto dos estilistas quanto da indústria têxtil. Temos uma vontade tão grande de fazer moda brasileira e acredito que investir no masculino pode ser um mote forte. As semanas de moda do mundo hoje já têm pelo menos um dia voltado ao masculino, ou até uma semana totalmente para eles. Teve uma época em que a mulher brigou pelo seu espaço, e hoje a gente vê o contrário: o homem tendo de brigar pelo espaço dele. O sexo frágil agora somos nós (risos). O homem não quer tomar o espaço delas na moda, mas sim dividir.
Um homem francês ou italiano você identifica fácil. Agora, o brasileiro, não. Não existe uma moda brasileira masculina porque não se parou para pensar nisso. O que seria uma alfaiataria tropical? Somos um país quente, então o tipo de fibra e composição dos tecidos deveria ser pensado dentro da indústria. O que pode tirar o calor de um tecido? Que tipo de forro ajudaria? E a questão das cores também: o homem está muito acostumado a preto, marinho, cinza. Precisamos abrir essa cartela. Os malandros cariocas da década de 1930 são, para mim, o ícone. O homem negro se preocupa mais com moda do que o homem branco, e isso vem dessa história do malandro carioca, do samba. Vejo mais linguagem de moda neles do que em quem quer ser Prada ou Gucci. A gente precisa parar de olhar para o que acontece lá fora e olhar para dentro, ver o que encontramos aqui. Há uma desconexãoo muito grande de autoestima que precisa ser repensada.

Hoje eu faço roupas de noivos! (risos) A roupa de casamento para mulher, de noiva, parece ser algo muito complicado, mas não é. O traje de noiva é muito simples de fazer, porque é composto de efeitos. As pessoas que fazem alta-costura vão me matar por dizer isso! É uma roupa ornamentada, então, quanto mais você borda e dá volume, vai somando e transforma aquilo em algo incrível. Mas não é tão difícil como fazer alfaiataria para o corpo de homem. A mulher tem formas mais fáceis, mais bonitas de desenhar, enquanto o homem é mais reto, mais quadrado. O público masculino consome de uma forma mais consciente, não segue tendência, pensa que a roupa tem que ter qualidade. Quando o noivo percebe que tem espaço, ele sempre sabe exatamente o que quer ou não. Na prova de roupa, eles são extremamente exigentes, não aceitam uma costura que não esteja perfeita. Homens se preocupam com a matéria-prima, sempre me questionam a composição do tecido. Quando eu fazia feminino, não lembro de tê-las ouvido perguntando sobre isso. Valorizo o público masculino porque eles têm uma deficiência, por não ter opções, e sabem o que querem. A indústria precisa virar para eles e pensar: “Está aí!”.
É tão estranho quando você está com o armário lotado e pensa: “Poxa, vou ter que tirar coisas”. O quão importantes são aquelas peças de verdade, não é? Talvez mais importante seja o que está por vir.
Comecei trabalhando nas Casas Pernambucanas: me apaixonei por roupas vendendo tecidos. Entrei na loja para trabalhar como empacotador, com uns 17 anos. Foi quando comecei a observar os meninos montando vitrines. Neste tipo de loja, eles montam com o tecido e fazem as moulages, que são as amarrações. Pouco tempo depois, já estava fazendo as vitrines e aprendendo sobre os tecidos. Comecei a trabalhar em uma marca pequena de Ribeirão Preto (SP) criando peças e me apaixonei. Gosto muito de contrapontos, masculino e feminino, pobre e rico, reciclagem. Tenho um respeito muito grande pelos tecidos, gosto muito, mas não para mim, acredita?


A dificuldade de fazer moda me inspira, a dificuldade de não ter matéria-prima me dá vontade de fazer o tecido. Parece triste, mas a deficiência de moda que temos no Brasil me inspira muito. E também dá uma certa ira. Quando coloco um cara na passarela com uma saia arrastando no chão, também é para causar com as pessoas. Dizem que eu faço roupas que não vou vender, que coloco renda e quadril nos meninos, mas é para discutir. Me inspira muito ir na contramão. Quando não gostam, às vezes é bom. Dependendo de quem não gosta, então, é melhor ainda! (risos)