Saúde e Bem-Estar

Amamentação em discussão: EUA tentam barrar resolução da ONU pró-aleitamento

Roberta Braga, especial para a Gazeta do Povo
10/07/2018 12:00
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Brasil é referência em amamentação com legislação avançada e ações de promoção do aleitamento materno. /Foto: Bigstock

Em mais uma atitude polêmica, o governo Trump se posicionou contra uma resolução da Assembleia Mundial da Saúde, da ONU, de apoio ao aleitamento materno — uma reportagem do jornal The New York Times, publicada no último domingo (8), trouxe a discussão sobre o tema para o centro das atenções. Segundo o jornal, a delegação norte-americana tentou alterar parte do texto que dizia que os governos deveriam “proteger, promover e apoiar a amamentação” e também retirar trecho que tentava restringir a promoção das fórmulas alimentícias.
O periódico afirma ainda que pelo menos doze países retiraram o apoio à resolução por medo de represálias do governo americano.
Cibele Domingues Prado da Luz, que é chefe da Divisão de Saúde da Criança e do Adolescente e coordenadora das Políticas de Aleitamento Materno do estado do Paraná, lembra que o Brasil tem uma legislação que protege o aleitamento materno, com destaque para a NBCAL, um conjunto de normas relacionadas à comercialização de alimentos para lactentes e primeira infância.

Brasil é mais protegido pelas leis, diz especialista

A especialista ressalta que, nesse caso dos Estados Unidos, os representantes do governo pediam a retirada de termos que se relacionam com a legislação (o “protege”) e a comercialização (o “promoção”). “No Brasil, estamos mais seguros, pois temos leis que protegem o aleitamento e ditam as regras de venda e publicidade”. Ainda na comparação com os Estados Unidos, Cibele conta que no país é muito mais comum que os recém-nascidos comecem com fórmula logo nos primeiros dias de vida.
O pesquisador especialista em nutrição e saúde materno-infantil Cesar Victora corrobora a afirmação de que o Brasil é referência em amamentação.

“Temos um controle muito rígido da comercialização e propaganda de substitutos do leite materno; desde os anos 1980, órgãos federais, estaduais e municipais treinaram milhares de profissionais de saúde em aspectos práticos da promoção e apoio ao aleitamento e temos a maior rede de bancos de leite materno em todo o mundo.”

Todo esse aparato contribuiu, conforme explica o professor, para aumentar a duração mediana do aleitamento de três meses, nos anos 1970, para mais de um ano atualmente. “O Brasil é o melhor exemplo de progresso em amamentação que eu conheço”.

Nutrição e imunidade

A recomendação dos especialistas e entidades de saúde é que o aleitamento materno seja exclusivo, sem nenhum outro alimento ou bebida como água ou chá, até os seis meses. Dos seis meses aos dois anos, o leite deve ser complementado com alimentos. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS) e o Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) a amamentação na primeira hora de vida protege os recém-nascidos de infecções.
Cibele explica que o leite materno traz anticorpos e proteção que nenhuma fórmula traz. “O primeiro leite liberado é o colostro e, depois, o chamado leite maduro. Ambos são formados por calorias, gorduras, proteínas e lactose essenciais para o desenvolvimento da criança. Além disso, o leite transmite toda a imunidade da mulher para o neném e, por isso, é considerado como a primeira vacina”, ressalta.
Ela completa que existem estudos que comprovam a relação entre o aleitamento materno exclusivo e a redução de doenças crônicas – como obesidade, diabetes e hipertensão na fase adulta –, a melhora do QI e do desempenho escolar.
As fórmulas -p que contêm leite de vaca e açúcar - podem causar alergia e comprometer  o paladar. Foto: Bigstock
As fórmulas -p que contêm leite de vaca e açúcar - podem causar alergia e comprometer o paladar. Foto: Bigstock
As chamadas fórmulas contém proteína do leite da vaca, que podem causar alergia. “Se o leite materno ajuda na proteção de doenças crônicas, a fórmula, ao contrário, prejudica o paladar, que fica mais acostumado ao açúcar, presente nessas formulações. Com isso, o risco de doenças como a obesidade será maior”, diz Cibele. A profissional completa: “Ainda que a ciência evolua e tente imitar a formulação dos componentes, nunca irá chegar à exatidão que é o leite materno.”
Para a mãe, amamentar também é importante para acelerar a recuperação do processo de pós-parto, além de diminuir o sangramento e o risco de hemorragia, ajudar na proteção do câncer de mama e de útero. “Existe, ainda, a questão do fortalecimento do vínculo da mãe com a criança e o reconhecimento de ser mãe por parte da mulher, que é algo que despende tempo”, completa Cibele.
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