Saúde e Bem-Estar

Não é só TPM: entender o ciclo ajuda as mulheres a terem mais qualidade de vida

RBS, por Larisa Roso
18/04/2018 07:00
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Exame causa muito temor entre pacientes, mas risco é baixo e exame ajuda a identificar lesões que podem indicar câncer. Foto: Bigstock

Um dos fenômenos mais característicos da vida feminina, a menstruação acompanha a mulher desde a puberdade até a idade madura, e é fundamental compreender bem o que acontece no organismo para que se possa ler melhor os sinais emitidos por ele e estar sempre em dia com a saúde.
A menstruação é a culminância de um mês inteiro de preparação do corpo para uma possível gravidez. No caso de alguém que não utiliza contracepção, o óvulo é produzido para se encontrar com um espermatozoide e ocorrer, então, a fecundação, gerando um feto. Quando isso não ocorre, processam-se modificações hormonais dentro do útero que fazem com que haja um descolamento da camada que reveste o órgão internamente, chamada de endométrio. Essa descamação do endométrio é o sangue expelido pela vagina durante o ciclo menstrual.
“A menstruação é o apagar das luzes. O endométrio se renova depois, e começa tudo de novo no mês seguinte” explica a ginecologista Maria Celeste Osório Wender, chefe do Serviço de Ginecologia do Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA).
Quando se utiliza algum método contraceptivo, como a pílula, o mais comum deles, também acontece o sangramento, mas programado, provocado artificialmente. A pílula “faz de conta” que o endométrio está se modificando e, quando a ingestão dos comprimidos da cartela é interrompida, o endométrio também se descola e é eliminado, recompondo-se depois outra vez.
Um ciclo menstrual completo normal pode durar entre 21 e 40 dias, explica Maria Celeste, começando no primeiro dia da menstruação e se encerrando na véspera da próxima (no caso de mulheres que não usam contracepção). Costuma-se interpretar como ciclo regular aquele em que ocorre sangramento uma vez por mês, todos os meses – algumas pacientes por vezes consideram, erroneamente, que têm um ciclo irregular porque o início do fluxo não acontece sempre no mesmo dia do calendário.
“O mais comum é que os ciclos sejam regulares. Isso significa que a mulher ovula todos os meses”, diz Maria Celeste.

Os ciclos tendem a ser irregulares nos extremos da vida reprodutiva: caso da pré-adolescente ou adolescente nos dois primeiros anos após a primeira menstruação, chamada de menarca, e da mulher que se aproxima da menopausa.

A bebê já nasce com sua carga completa de óvulos para toda a sua existência, número que vai diminuindo com o decorrer dos anos. As primeiras menstruações da menina, em geral, são anovulatórias (não há ovulação). Quando seu funcionamento hormonal se estabiliza, passa a ocorrer a ovulação e existe a possibilidade de engravidar.
Da mesma forma, quem está na outra ponta, na faixa entre os 40 e os 50, tempos antes da parada total do sangramento, pode ter ciclos anovulatórios – os óvulos dentro dos ovários dessa mulher que está chegando perto do climatério já estão desgastados e em número reduzido, daí a menor frequência de uma gravidez nessa fase. Muitas vezes, em seus últimos ciclos, ela menstrua sem ovular.
Sinais de atenção
No Brasil, a pesquisa mostrou que 74,8% das mulheres precisaram visitar mais de três médicos para receber a confirmação do diagnóstico. Foto: Bigstock
No Brasil, a pesquisa mostrou que 74,8% das mulheres precisaram visitar mais de três médicos para receber a confirmação do diagnóstico. Foto: Bigstock
De acordo com o Ministério da Saúde, estima-se em 10% o índice de mulheres que sofrem com a endometriose no Brasil. A doença, caracterizada pela presença do endométrio (tecido que reveste o útero) fora da cavidade uterina, podendo atingir trompas, ovários, intestinos e bexiga, é marcada por fortes cólicas durante o período menstrual. Mulheres que têm dessas dores superintensas devem procurar orientação de seu ginecologista para uma possível investigação da enfermidade.
A endometriose, capaz de provocar infertilidade, pode aparecer ainda na adolescência e ao longo de toda a idade reprodutiva. Há possibilidades de tratamento medicamentoso e cirúrgico.
Preciso menstruar todos os meses?
Um grande número de mulheres opta pelo regime de uso ininterrupto ou com poucas pausas da pílula anticoncepcional, devido a uma recomendação médica (após o diagnóstico de uma endometriose, por exemplo) ou simplesmente para ter uma rotina mais cômoda, sem as limitações impostas pelo sangramento mensal, que pode ter fluxo intenso, fortes cólicas e inchaço, entre outros sintomas.
Para a ginecologista Carla Vanin, professora da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (UFCSPA), chefe do Departamento de Ginecologia e Obstetrícia da instituição e coordenadora do Ambulatório de Climatério da Santa Casa, o ideal, antes de se fazer essa escolha, seria aguardar que os ciclos se estabilizassem para a menina que está começando a menstruar.
“A irregularidade pode ser normal por um tempo, e depois disso os ciclos se regularizam. Normalmente, essa estabilização acontece entre dois e quatro anos depois da menarca (a primeira menstruação), quando seria o momento mais adequado para começar o uso de anticoncepcional, se for indicado”, aconselha Carla.

Não há danos à mulher que decide não menstruar ou menstruar a intervalos de alguns meses.

“Isso não traz prejuízo, nem do ponto de vista geral de saúde, nem para o futuro reprodutivo. Uma mulher que usa esse esquema é igual à que faz a pausa todo mês. Quando as duas pararem de tomar a pílula, vai voltar a função ovariana original delas. É uma opção: se prefere menstruar menos vezes, ela opta por isso. Se prefere menstruar todo mês porque acha que quando menstrua tem a segurança de que não está grávida, tudo bem”, diz Maria Celeste.
Quando a mulher está alcançando a menopausa, na faixa dos 40 aos 45 anos, é comum que os ciclos se tornem mais curtos, ainda que regulares. Aquela que sangrava a cada 28 dias pode ter esse intervalo reduzido para 25 ou 23 dias, por exemplo. Mas a irregularidade também chega – o sangramento pode passar a durar mais dias e a ser mais intenso ou ocorrer no meio do ciclo. Pode se tratar apenas de uma disfunção hormonal do climatério, mas também pode ser a indicação de outro problema, como miomas ou pólipos endometriais. A certo ponto, ela pode menstruar dois ou três meses seguidos e depois passar dois meses sem sangrar, até sangrar de novo. Segundo Carla, apenas um pequeno percentual menstrua regularmente até o final, tendo uma última menstruação e depois nada mais.
TPM: famosa e incoveniente
Dor de cabeça, cólica, irritabilidade, depressão, choro fácil, inchaço, dor nas mamas, constipação ou evacuação mais frequente, apetite aumentado por certos tipos de comida – quem padece de tensão pré-menstrual (TPM) já deve ter se identificado com os sintomas. Os sinais aparecem no período que antecede o sangramento e tendem a desaparecer no primeiro dia em que a menstruação desce. É comum que o mal-estar se repita na maior parte dos ciclos. Quando a depressão ou o sintoma de humor é muito severo, é preciso verificar se a paciente não está sofrendo do transtorno disfórico pré-menstrual.
“Ela fica muito entristecida e não quer sair de casa, não quer cumprir suas tarefas, não quer socializar, não quer ir para o trabalho ou para a aula. Tem casos em que isso acontece todos os meses. E quando ela menstrua, fica ótima”, descreve Maria Celeste Osório Wender, ginecologista do HCPA.  “O melhor tratamento é um antidepressivo, que pode ser utilizado só nos dias que antecedem a menstruação, porque ela não fica deprimida no período pós-menstrual. O resultado é superbom”, avalia.

Alimentação saudável e exercícios físicos regulares – e não apenas na época da TPM – podem amenizar a manifestação dos incômodos. Segundo a ginecologista Daniela Angerame Yela, professora da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), em Campinas (SP), e membro da comissão de Ginecologia Endócrina da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo), o estresse, o sedentarismo e o excesso de sal e gordura tendem a piorar o desconforto. Estudos mostram, segundo Daniela, que alimentos ricos em cálcio, como leite e derivados e vegetais de folhas verde-escuras, proporcionam alívio.

“Deve-se reduzir o consumo de estimulantes como chocolate e café, apesar de algumas mulheres fazerem bastante uso deles para se acalmar”, indica Daniela.
Para quem tem queixas de agitação e irritação, Maria Celeste sugere que se evite também bebidas como guaraná e chimarrão.
Cólica: o que fazer?
Sintoma mais comumente associado à menstruação, a cólica (dismenorreia) pode ser sentida em diversos níveis, oscilando de um simples desconforto até um nível incapacitante de dor. O que provoca a sensação dolorosa é uma alteração na liberação de prostaglandinas, substâncias existentes dentro do músculo do útero. Os músculos uterinos se contraem mais para a descamação do endométrio, e a redução de sangue no local provoca a cólica.
Existem a dismenorreia primária e a secundária. Na primária, não há nenhuma doença associada. É um desconforto, mesmo que forte, que, em geral, responde muito bem a anti-inflamatórios ou ao uso de pílula anticoncepcional. Aparece com mais frequência entre adolescentes e adultas jovens, na faixa dos 20 e poucos anos, e costuma diminuir a partir daí. No caso da secundária, a dor pode estar associada à presença de endometriose, miomas ou outras patologias.
Aplicar calor na região do abdômen, com bolsa de água quente, é uma medida que funciona. A prática de atividade física também proporciona bem-estar.
PERGUNTAS E RESPOSTAS
Troca de pílula pode provocar escape?
Sim. A resposta do organismo varia de acordo com cada pílula. Ao trocar o medicamento, pode haver um escape no primeiro momento, o que tende a normalizar em dois ou três ciclos.
Quando ocorre um escape, preciso procurar um médico?
Se o escape ocorreu uma vez e depois não mais, pode estar relacionado ao esquecimento da ingestão de uma pílula da cartela ou a uma mudança no horário habitual de tomar o comprimido. Segundo a ginecologista Daniela Angerame Yela, escapes mais frequentes merecem atenção.
“É importante consultar um médico. Primeiro, porque fica uma situação desagradável, segundo, porque pode indicar algum probleminha”, diz.
Pode se tratar de uma não adaptação à pílula anticoncepcional em uso, o que talvez requeira uma troca, ou outras situações, como uma infecção ou a existência de um pólipo.
A cor do sangue menstrual muda ao longo da vida?
Há pequenas diferenças: ciclos normais têm sangue vermelho, enquanto ciclos mais curtos apresentam um sangramento mais escuro (amarronzado), similar àquele típico do final da menstruação. Mulheres que tomam pílula e menstruam poucas vezes ao ano também podem ter um sangramento mais escurecido devido à pouca quantidade de fluxo.
Quanto tempo leva para normalizar o ciclo menstrual após o parto?
A amamentação posterga a menstruação. Se a mãe amamentar o bebê, ela deve ficar sem menstruar durante seis meses, e depois o organismo deve retomar o ritmo anterior à gestação. Mulheres que não amamentam voltam a menstruar normalmente em torno de três a quarto meses após o nascimento do filho.
É possível engravidar estando menstruada?
Uma mulher que tem um ciclo irregular pode engravidar enquanto sangra porque o sangue presente no momento da relação sexual provavelmente não é de menstruação. Ela pode achar que está menstruada, mas o sangue está relacionado a outro motivo – pode ser até um sangramento da fase de ovulação. Se for realmente o ciclo menstrual, ela não vai engravidar.
Estresse e abalos emocionais interferem?
Sim. Uma fase de intensa cobrança e desgosto no trabalho ou a morte de um familiar, por exemplo, têm a força de alterar o ciclo menstrual. Às vezes, a menstruação pode descer antes ou depois do que é esperado. Daniela diz que acontece de pacientes que utilizam corretamente um método contraceptivo acharem que podem ter engravidado, e a preocupação com essa suposta gestação já é suficiente para alterar o ciclo.
“Os hormônios responsáveis pelo estresse vão interferir nos hormônios menstruais e vai haver interferência no ciclo. Vira uma bola de neve, até ela fazer um teste de gravidez e ver que não está grávida”, comenta a médica.
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