Por não cuidar corretamente da voz, professora fica afastada da função por quatro anos
Guilherme Grandi
27/02/2018 17:00
(Foto: Bigstock)
Não é apenas pelo conteúdo que a sala de aula é um desafio para alunos e professores. A saúde também conta, principalmente quando está relacionada à voz. A professora de literatura Rosane Decolin, de Curitiba, sabe muito bem dessa questão. Ela dá aulas de manhã e a tarde para alunos de diversas faixas etárias, principalmente do ensino fundamental, e diz que o mais difícil é quando as salas são muito grandes e sem equipamentos de som. “Já tive vários problemas com as cordas vocais por causa disso”, contou a professora ao Viver Bem.
O problema foi tão complicado que ela teve de passar por uma cirurgia nas cordas vocais: “fiquei fora de sala por quatro anos”, conta. O médico otorrino Paulo Mendes Junior explica que professores como a Rosane, que dependem muito do uso da voz, podem sofrer mais frequentemente de alterações vocais.
“Estes problemas são decorrentes do abuso vocal, que é quando o professor fala por muito tempo sem o devido repouso. Mas, pode ser também quando eles precisam falar muito alto nas aulas por algum motivo”, explica ele ressaltando que alguns profissionais não possuem uma técnica vocal para suportar um número maior de aulas.
Já o professor de matemática Ednei Leite de Araújo também já precisou correr para o otorrino tratar de uma grande inflamação na garganta. Hoje em dia ele está com uma carga menor de aulas, mas teve um tempo em que lecionava em dois colégios de dia e uma universidade à noite. “Emendava um turno no outro e tinha muitas dores de garganta. Chegou uma hora que não deu mais, e precisei diminuir”, explica.
Além disso, os professores também podem sofrer mais frequentemente de dores de garganta, gripes e resfriados, principalmente aqueles que trabalham com crianças. “Nesta idade é muito comum as crianças terem de seis a oito infecções virais por ano, e assim transmitir aos professores pelo contato próximo que eles possuem”, completa o otorrino.
Quando o problema não vem dos alunos, ele pode surgir na própria sala de aula. O giz usado no quadro negro, o ar condicionado sem limpeza dos filtros e a má higiene da sala de aula também podem afetar o trabalho dos professores. Paulo Mendes explica que eles “podem apresentar sintomas de rinite como obstrução nasal, coriza, espirros e coceira de nariz e olhos, pois muitos profissionais têm alergia ao pó que sai do giz”.
Giz costuma ser um dos vilões da voz. Foto: Bigstock.
E se a voz piorar?
Muitas vezes, os constantes problemas respiratórios acabam comprometendo de vez a voz, e aí não adianta protelar: o professor precisa procurar um fonoaudiólogo.
De acordo com a fonoaudióloga, mestre e doutora Carla Maffei, há alguns sinais que podem indicar que as cordas vocais foram afetadas, como a rouquidão frequente, a dificuldade na hora de falar ou sensação de garganta coçando.
“Sempre que atendemos um paciente ‘professor’ com problemas de voz, fazemos sondagens mais amplas aferindo a audição, analisando o ambiente de trabalho, se é muito barulhento, se fala alto demais, etc”, conta. Ou seja, é um trabalho multidisciplinar que envolve, muitas vezes, o fonoaudiólogo, o otorrinolaringologista e em alguns casos até o psicólogo, e que precisa de um diagnóstico mais preciso.
Ela explica, ainda, que o otorrino faz a avaliação e analisa as questões mais patológicas do ouvido, nariz e garganta. Em cima destes resultados é que o fonoaudiólogo fará uma avaliação com o paciente, levando em consideração os antecedentes patológicos e traçando um plano de tratamento. “A gente busca equilibrar os ajustes motores e melhorar os aspectos de deglutição e voz, por exemplo”, resume.
Como evitar e tratar os problemas
A prevenção é o melhor caminho para se evitar problemas com a voz. Alguns professores sabem bem como proceder. Ednei Araújo, por exemplo, aprendeu que não pode abusar, mas, se isso não for possível, “é preciso beber muita água para não pagar um preço mais caro depois”.
Tentar uma abordagem diferente nas aulas também pode resolver, e aí depende muito da instituição em que o professor trabalha. “Precisa pensar em buscar outras estratégias de aula, para não ficar só na aula expositiva”, conta Rosane Decolin.
Já o médico otorrino Paulo Mendes Junior explica que até mesmo as roupas precisam ser bem pensadas na hora de dar aula, com a escolha de peças “não tão apertadas, principalmente na região da barriga e do tórax, para não prejudicar a respiração”. Ele aconselha, também, a ter uma alimentação balanceada e evitar o consumo de bebidas gaseificadas ou à base de cafeína. E a recomendação maior: “se hidratar várias vezes ao dia”.
DICAS
Tome bastante água
Faça exercícios de aquecimento
Não use roupas que apertem a região abdominal
Faça intervalos entre tempos muito longo em que é preciso usar a voz
Se for necessário, use o apoio de equipamentos de som
Peça ajuda dos alunos: é preciso respeitar e escutar o professor para que a aula seja bem aproveitada para todos.
Evite oscilações de temperatura
Procure o médico em caso de dor na garganta ou falha constante na voz