Saúde e Bem-Estar

Geração de crianças que não se exercita precisa de atitude firme dos pais

Felipe Martins, especial para a Gazeta do Povo
08/05/2017 08:00
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(Foto: Bigstock)

O rápido desenvolvimento de crianças e adolescentes com celulares, tablets e computadores surpreende. Cada vez mais cedo os ‘pequenos’ têm acesso aos aparelhos, seja para lazer ou aprendizado. Mas o alto desempenho e acesso aos eletrônicos ao longo dos anos também trouxe consequências desastrosas, reduzindo cada vez mais o interesse dessa geração por atividades físicas, por exemplo. Mas o que o futuro reserva para geração que não é estimulada a se exercitar?
“No período em que as crianças estão na escola, a única oportunidade de exercitar e movimentar o corpo é nas aulas de educação física. Como as turmas são heterogêneas, vemos que algumas crianças são muito estimuladas e outras não têm estímulo algum”, explica Maurício Delattre, professor do grupo Positivo há 23 anos. Ele completa: “O que vemos depois é que crescem crianças com pouca memória motora e, na vida adulta, isso implica em pessoas sem motivação e pouco interessadas em atividade física.”
Falta o exercício de sentar e conversar, de acordo com Moacir Ávila de Matos Junior, professor do curso de educação física da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG). “Hoje você entra em uma festa e ao invés de crianças brincarem e conversarem, elas estão no WhatsApp. Isso gera pessoas inteligentes, mas pouco capacitadas para construir relações pessoais”, completa.
Além do problema social, a falta de exercícios naturalmente afeta a saúde da juventude. Gustavo Aires de Arruda, do curso de educação física da Universidade Estadual de Londrina, pesquisou índices de sedentarismo em jovens durante o doutorado. “Identificamos na pesquisa que muitos jovens até praticam algum esporte rotineiro, por duas ou três horas semanais. Ainda assim, passam entre sete e oito horas diárias entre videogame, computador, televisão, ou sentados mexendo no celular. Ou seja, mesmo com esportes, seguem tento muito tempo do dia com comportamento sedentário, e isso tem implicações para a saúde”, comenta.
Em sua pesquisa — que analisou 265 jovens de 14 anos em média em um intervalo de três anos — 69,8% dos indivíduos não atingiam o ponto de corte utilizado no estudo (150 minutos por semana de exercícios com intensidade moderada). Após os três anos, este número subiu para 73,6% dentro do mesmo grupo.
Além de contribuir para os casos de obesidade infantil, ao lado dos maus hábitos alimentares, a falta de atividade motora também afeta a memória muscular, ou a habilidade de um indivíduo lembrar exercícios simples e naturais do ser humano.
“Aquela habilidade de se abaixar, engatinhar, correr, chutar bola, escalar; tudo isso é afetado. Conforme a criança não se exercita, tudo isso se perde. Ao realizar atividades físicas, as veias expandem. Quem faz pouca atividade tem as capacidades pulmonar e visual menores, equilíbrio prejudicado e perda do arsenal motor”, diz Antonio Branco, presidente do Conselho Regional de Educação Física no Paraná (CREF/PR).
Vendo esses problemas crescendo, algumas tecnologias também têm colaborado no combate à inércia, aliando o lazer aos exercícios, de acordo com o professor Maurício Delattre. “Os próprios jogos eletrônicos e videogames têm versões que exigem movimento físico, como o kinect. O indivíduo tem que se mexer pra conseguir jogar. As empresas perceberam o tamanho do problema”, diz.

“Esta geração não consegue dar cambalhotas”

Marcos Aurélio Iubel, 26 anos, instrutor profissional e coordenador da CrossKids, um studio funcional voltado ao público infantil, relata a partir da sua experiência: pela dificuldade de fazer cambalhotas se vê que as novas gerações têm pouco repertório motor. “Há crianças de 11 anos que não sabem pular com os dois pés”, cita.
Para ampliar esse repertório, a criança deve, o quanto antes, andar de bicicleta, aprender a jogar basquete, jogar amarelinha, rastejar e pular corda. “Quanto menos ela for estimulada, mais difícil realizar alguns movimentos depois”, diz ele, apontando alguns vilões: o medo da violência, a urbanização e a redução dos espaços para brincadeiras.
Tirar os filhos do sofá não é fácil. Segundo Marcos, para os pequenos o ideal é intercalar dias com e sem celular, promovendo atividades físicas periodicamente. Outra dica é estimular o filho pequeno a permanecer em uma atividade por até dois meses, pelo menos. “O pai tem que acompanhar de vez em quando a atividade extracurricular. Mas a criança tem que achar um exercício de que goste”, diz ele.
Há pais que cobram demais e fazem pressão excessiva pela excelência no esporte, e isso desestimula a criança. “Muitas vezes elas só querem se divertir após a aula”, diz Marcos.
Se fixar em apenas um esporte também limita a expansão desse repertório. Na 3.ª infância, de 6 a 10 anos, o melhor é variar. “Discordo da aprendizagem precoce, de criança de 4 a 6 anos ficar só no futsal”, diz ele, lembrando que na Rússia e nos Estados Unidos é só aos 13 ou 14 anos que o adolescente define o esporte que irá praticar com mais intensidade.
*Colaborou Adriano Justino.