Paraná tem mais de 150 mil crianças com obesidade grave, e a culpa é dos pais
Amanda Milléo
08/06/2018 12:00
(Foto: Bigstock)
Ao olhar para os dados sobre obesidade infantil disponibilizados pelo Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional (SISVAN) do Ministério da Saúde, a nutricionista e pesquisadora Carolina Bulgacov Dratch se assustou com o que viu no Paraná.
Entre 2008 e 2015, a quantidade de bebês (entre 0 a 5 anos) e crianças (entre 5 a 10 anos) que apresentavam sobrepeso, obesidade e obesidade grave só aumentou – chegando a quase 400 mil meninas, entre 5 a 10 anos, diagnosticadas com sobrepeso, em 2015.
Em 2016 (último ano com os dados completos no sistema durante a coleta da pesquisadora), houve uma leve redução, mas que não deixa nenhum especialista mais tranquilo. Naquele ano, 150 mil crianças, entre 5 e 10 anos, tinham obesidade considerada grave.
A condição é calculada pelo IMC (se estiver em dúvida se seu filho está com sobrepeso ou obesidade, faça a consulta aqui).
As informações foram compiladas na dissertação de mestrado de Carolina, desenvolvida na PUCPR, e transformada em um informe temático do CADÊ Paraná, plataforma de dados sobre os direitos humanos de crianças e adolescentes do Centro Marista de Defesa da Infância, com o tema “Obesidade Infantil: questões preliminares de um problema de Saúde Pública“.
Ultraprocessados em excesso
Além dos números, os dados coletados pela nutricionista também dão conta sobre os hábitos alimentares das crianças nas 399 cidades do Paraná. Nesse tópico, não houve muita surpresa:
“O que chamou bastante atenção foi o consumo alimentar das crianças, com presença dos ultraprocessados. Crianças estão ingerindo precocemente macarrão instantâneo, biscoitos, bebidas açucaradas, e isso acarreta no aumento de peso”, explica a nutricionista.
Custos para o SUS
Além do impacto na saúde da criança e da família, a quantidade crescente da obesidade infantil também acarreta em um maior gasto ao sistema público de saúde. “A criança que não recebe o tratamento na infância, porque hoje não há um número de nutricionistas adequado nos postos de saúde, leva a obesidade para a fase adulta, onde surgem diabetes, pressão alta”, diz Dratch.
Falta, na visão da pesquisadora, políticas públicas específicas para tratar a obesidade infantil. “A nutricionista no posto de saúde poderia acompanhar a alimentação da criança, mas também de toda a família, que deve ser incluída. A criança não tem autonomia na escolha alimentar, ela só consome o sanduíche, o macarrão instantâneo porque alguém dá”, reforça.
A culpa não é só dos ultraprocessados
Quando se trata de obesidade infantil, a médica endocrinologista Rosângela Réa, do hospital Pequeno Príncipe, não esconde a multiplicidade dos “culpados”. Pais longe de casa e das cozinhas são um deles, pois fazem com que as crianças não consigam imitar os hábitos de uma alimentação saudável.
“Ninguém controla a criança em casa para o que ela come, hoje. Se ela está sozinha, ela escolhe o que quer comer. E mesmo quando os pais estão junto, ela continua escolhendo. Trocaram a merenda no colégio por frutas e legumes que a criança não tem o hábito de comer em casa. Logo, ela não vai se alimentar daquilo. Ela imita os pais e se eles não dão o exemplo, não tem como cobrar“, explica a médica, que também faz parte do serviço de endocrinologista do Hospital das Clínicas, da Universidade Federal do Paraná (SEMPR/UFPR).
Os números destacados na pesquisa, segundo Rea, servem principalmente como um alerta aos pais – visto que esse cenário tem sido cada vez mais comum nos consultórios médicos. “É um problema que afeta todos os níveis. Não tem um que não mostre esse aumento na obesidade entre as crianças. É um alerta para que os pais prestem mais atenção, acompanhem as crianças e dar o exemplo”, reforça a especialista.
Meu filho é só gordinho
Existem crianças com sobrepeso e com exames médicos bons? Sim, segundo a médica endocrinologista Rosângela Réa. Isso não significa, porém, que o excesso de peso não possa estar causando, de forma silenciosa, um dano maior ao organismo.
“Para as crianças com fatores de risco para obesidade, doenças do coração, diabetes, é importante tentar diminuir esses riscos. Tratando cedo, você diminui o risco de ela vir a apresentar uma doença grave no futuro. Não vemos, mas provavelmente o excesso de peso está causando pequenas alterações difíceis de captar no momento”, explica Réa.