Misturar elementos da natureza na rotina de corridas está em alta e até tem nome em inglês, wildfitness (como as trail races). Praticá-las descalço ou com calçado minimalista gera mais equilíbrio, menos impacto nos músculos e redução de lesões no quadril e nos joelhos. Mas livrar-se dos tênis não deve ser algo abrupto: a mudança pode levar até seis meses, diz a professora doutora em Biomecânica do Movimento, da Escola de Educação Física e Esporte da USP, Ana Paula da Silva Azevedo. Ela concorda com o autor norte-americano Christopher McDougall, conhecido pelo apoio à causa, que diz que assim o atleta se aproxima da sua ‘natureza animal’. Confira a entrevista com ela:
Correr descalço tem benefícios comprovados?
Percebemos nos praticantes a expansão dos movimentos, fortalecimento muscular, melhora no equilíbrio e no controle do impacto. Há estudos que afirmam que o calçado esportivo convencional reduz o estímulo perceptivo na planta do pé. Como dependemos dos cinco sentidos para melhorar as respostas ao ambiente, se você sentir melhor o pé isso estimula o tato e o repertório motor de resposta do corpo. Uma corrida mais natural estimula os músculos de uma forma diferente da com o calçado tradicional.
O impacto do pé descalço e do calçado no chão são diferentes?
Ao correr ou caminhar descalço, o impacto durante o exercício físico se reduz e até a forma como a pessoa coloca o pé no chão muda. Quem está acostumado a correr usando o calçado tradicional, que é mais alto, o primeiro contato com o solo se dá pelo calcanhar. Com o uso do calçado minimalista ou direto com o pé no chão, uma adaptação natural faz com que o apoio inicial se dê pela região dos dedos.
De que forma a mudança na pisada influencia o restante do corpo?
Não muda tanto o equilíbrio, mas o esforço muscular, principalmente na panturrilha, diminui. Quando adotamos essa estratégia, há uma redução do esforço na articulação do quadril e do joelho e, em compensação, o tornozelo e os músculos relacionados aos dedos dos pés são mais exigidos. Quem quer começar a correr descalço precisa trabalhar mais essas articulações e ter mais cuidado, pois a incidência de lesões pode migrar dos quadris e joelhos para o tornozelo e pés.
A quem é mais indicada a prática de exercícios sem calçados?
Não tem contraindicação, se bem planejada. Para as crianças, ajuda inclusive na formação da marcha e do arco plantar, além da percepção e alteração no impacto do pé ao chão. Adultos que há anos não pisam no chão descalço vão sentir mais impacto no início, e a redução vem com o tempo. Nos idosos, há uma perda natural de flexibilidade e força muscular, que torna a adaptação mais lenta, mas ainda assim é possível adotar a prática.
