Saúde e Bem-Estar

Colocar o bebê para dormir em “caixas de papelão” é moda nos países desenvolvidos

New York Times
06/06/2017 09:01
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O Objetivo seria reduzir o número de mortes relacionadas ao sono. Foto: Foto: The Baby Box Company/Divulgação)

Seria melhor para os bebês dormir em caixas de papelão? Há décadas o governo finlandês, que tem uma das menores taxas de mortalidade infantil do mundo, distribui às gestantes uma caixa de papelão com artigos para bebês que também se transforma um berço. Atualmente, hospitais e grupos de saúde pública americanos fornecem caixas de papelão aos pais para os bebês dormirem, com o objetivo de reduzir o número de mortes relacionadas ao sono.
Neste ano, o estado de Nova Jersey anunciou um plano de distribuir mais de 105 mil caixas. Já Ohio vai doar cerca de 140 mil e o Alabama definiu a distribuição de outras 60 mil caixas. Neste mês, o Texas também anunciou que distribuirá até 400 mil. As caixas, que vêm recheadas de itens como roupas, fraldas, absorventes para as mamas e um colchão ajustável, são dadas aos novos pais como parte de uma campanha educacional sobre práticas seguras para o sono dos recém-nascidos. Mas o ritmo acelerado com que essa política foi adotada por estados e hospitais americanos preocupa alguns especialistas.
Eles dizem que ainda não foi constatado se as caixas realmente são um ambiente seguro para o sono dos bebês ou mesmo que elas sejam uma ferramenta eficiente contra a mortalidade infantil. “Estou muito surpresa com todo o entusiasmo em torno desse programa e como as pessoas estão entrando nessa onda”, disse a Dra. Rachel Moon, presidente do grupo de trabalho sobre a síndrome da morte súbita do lactente da Academia Americana de Pediatras (AAP).
É seguro?
“Eles supõem que vai dar tudo certo porque funciona na Finlândia.” Ao contrário de outros produtos para bebês, como berços, as caixas de papelão não são regulamentadas pela Comissão de Segurança de Produto ao Consumidor e tampouco foram testadas a fim de atender às normas de segurança obrigatórias dos produtos destinados ao sono infantil disponibilizados no mercado.
A ASTM International, empresa que desenvolve normas de fabricação e de segurança para uma variedade de produtos, formou uma força-tarefa para propor regras de segurança para as caixas de bebê. Em última instância, os padrões de segurança poderiam ser adotados pela comissão federal de segurança, mesmo assim o processo levaria em torno de um ano para ser concluído.
“Se você observar os produtos de cuidado com bebês, vai perceber que são muito controlados. Temos que trabalhar com bastante cuidado e atenção até que uma decisão seja tomada”, disse Ann Marie Buerkle, presidente da comissão. 
Ela disse que há uma série de questões a serem investigadas sobre as caixas. “Qual o material usado? Quanto ela dura? Se você usa a caixa com três crianças diferentes, ela se deteriora? Mas essas são coisas que serão determinadas no comitê de normas.” A empresa The Baby Box Co., que produz a maioria das caixas distribuídas nos Estados Unidos, declarou que testou voluntariamente a segurança de seu produto com laboratórios independentes e alega que as caixas cumprem normas de segurança semelhantes às dos berços.
Todas as crianças podem usar?
Jennifer Clary, CEO e cofundadora da The Baby Box Co., disse que os pais que participam de algum dos programas gratuitos oferecidos pela companhia devem completar um curso de educação on-line sobre sono seguro, nutrição e cuidados com o bebê, entre outros tópicos. Mas também podem comprar as caixas diretamente on-line, sem a necessidade do programa educacional, com preços entre US$69.99 e US$225 por uma caixa cheia de produtos.
Porém, Moon alega que as normas de segurança precisam ser decididas por peritos imparciais, não pelas empresas que fazem o produto. Além disso, conta que ela própria tem muitas perguntas ainda sem respostas sobre as caixas, incluindo: Quais serão a idade e o peso limites para as caixas feitas nos Estados Unidos? É seguro carregá-la com o bebê dentro? Qual é a qualidade do fluxo de ar lá dentro? É seguro colocar a caixa, com o bebê dentro, no chão ou em outra superfície? Em grande parte, o entusiasmo ocorre porque elas são populares na Finlândia, onde a taxa de mortalidade infantil – 1,7 mortes por mil recém-nascidos – é um terço menor do que a dos Estados Unidos. Lá, a caixa do bebê é gratuita para todas as novas mães que passaram pelos cuidados pré-natais a partir do quarto mês de gravidez.
Pensando fora da caixa
Mas a caixa é apenas um dos cuidados de saúde prestados às novas mães no país. Anita Haataja, pesquisadora da Kela, empresa que supervisiona o desenvolvimento e a entrega dos pacotes de maternidade na Finlândia, disse que não há nenhuma pesquisa provando que são as caixas as responsáveis por evitar mortes infantis. A maioria dos pais finlandeses não utiliza as caixas como uma cama para o bebê.
Um estudo recente concluiu que apenas 37 por cento das famílias as utilizam como cama, disse Haataja. “A caixa usada como berço é uma questão menos relevante; a saúde do bebê está associada com o sistema de cuidados de saúde que a mãe recebe. Nossa taxa de mortalidade infantil é baixa devido ao acesso gratuito e de alta qualidade aos serviços de saúde maternal e infantil e ao serviço de orientação de cuidado infantis.” 
O Dr. James Greenberg, diretor de Neonatologia e codiretor do Instituto Perinatal no Hospital de Medicina Infantil de Cincinnati, disse que as baixas taxas de nascimento prematuro na Finlândia são o principal motivo da baixa mortalidade infantil em comparação aos Estados Unidos.   “A ideia de que a caixa reduz a mortalidade infantil não faz muito sentido. Não é plausível que ela consiga resolver o maior problema da mortalidade infantil nos Estados Unidos, que é o nascimento prematuro”, disse ele. 
A Universidade Temple lançou uma pesquisa mostrando que os programas relacionados à caixa do bebê podem influenciar as práticas de sono dos novos pais. Mães de primeira viagem participantes do programa da universidade que, antes de deixar o hospital receberam uma caixa de bebê e aula presencial sobre o sono com enfermeiras, mostraram, nos primeiros oito dias de vida do recém-nascido, uma taxa de compartilhamento de cama com o bebê 25 por cento inferior àquelas mães que apenas receberam as instruções da enfermagem e nenhuma caixa.
Riscos
O compartilhamento de cama é tido como um fator de risco para asfixia e outras mortes relacionadas ao sono. A AAP recomenda que os bebês durmam sozinhos, de costas, em uma cama que não seja solta e nem muito macia. A Dra. Megan Heere, diretora médica do berçário Well Baby, no Hospital da Universidade Temple e principal autora do estudo, disse estar otimista quanto ao uso das caixas do bebê e seu potencial papel na promoção do sono seguro. “Até agora, não temos nenhuma razão para acreditar que as caixas sejam perigosas.
Acreditamos que elas podem apenas ajudar”. Mas a proporção de distribuição das caixas nos Estados Unidos já atingiu tal nível que fazem as 35 mil unidades doadas anualmente na Finlândia parecerem pouca coisa. Assim, alguns especialistas dizem que não é possível supor que o programa terá o mesmo impacto com as centenas de milhares de bebês americanos.
A Dra. Rachel Moon, da AAP, observou que muito estudo ainda é necessário antes que os pais possam ter certeza de que o produto é seguro. “Se fosse meu filho, eu arranjaria uma alternativa que atendesse aos padrões estabelecidos pela Comissão de Segurança de Produto ao Consumidor”, disse ela. The New York Times News Service/Syndicate – Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito do The New York Times.