Ensinamentos do ioga

No mesmo sentido, a autoanálise é destacada pela professora de ioga Daniela Reis, do Gaya Yoga Spa. “O ioga transforma hábitos, que são reações inconscientes, em escolhas conscientes. No início essa autoanálise acontece durante a prática do ioga, mas com o tempo isso vai sendo levado para o dia a dia, naturalmente”, diz. Mas há quem se matricule no ioga sem grandes pretensões espirituais, apenas pelos benefícios físicos, o que, segundo Daniela, muda rapidamente. “Tem gente que chega falando que não quer nada de teoria e que veio apenas pelos exercícios. Mas a curiosidade aparece. E logo a pessoa se vê analisando pensamentos, reações e praticando a autoanálise.”

Apesar de o ioga ser fruto de uma filosofia indiana milenar, não dá para entrar em uma sala esperando que o professor surja com todas as respostas. Daniela conta que é interessante os alunos receberem, aos poucos, algumas doses de fundamentação filosófica, “caso contrário o ioga fica reduzido a apenas uma prática de academia.” Mas, entre as várias linhas de ioga disponíveis, cabe a cada pessoa procurar a que mais combina com seu estilo de vida ou propósito.

Mesmo tendo entrado no ioga depois de muitos anos de trabalho corporal, especialmente com a dança clássica, a comunicadora Mariana Branco, 35 anos, ficou surpresa com tudo o que aprendeu e não sossegou no tapetinho da sala. “Fiquei altamente ligada a esse tipo de movimento que é bastante completo para o corpo, a mente e o espírito. Mas, comecei a me intrigar, percebi que aquilo ia além e aí quis conhecer mais o que era o ioga, que funções ele trazia, que linhas ti­­nha”, conta. A curiosidade le­­vou Mariana longe, e hoje ela tem sua própria escola de ioga, a Corpotai. “Conhe­­cendo mais, senti a necessidade de poder passar essas técnicas milenares para as pessoas, pois elas trazem grandes benefícios tanto externos quanto internos. Um exemplo é a aprendizagem da respiração, ferramenta fundamental que promove saúde e vitalidade, abre a criatividade e as emoções, controla o humor e desenvolve a concentração”, diz.

As consequências de uma lesão na coluna cervical, causada por um acidente de trânsito, fez Vanderlei Antônio Weschen­­felder Grützmann, 41 anos, na época sargento do Exército, decidir mudar de vida. Depois de dois anos de fisioterapia e uma cirurgia, ele ainda sofria com as dores intensas. “Me disseram que deveria fazer uma nova cirurgia. Essa notícia me abalou e cresceu uma necessidade de entender o que se passava com o meu corpo. O livro Autoperfeição com Hatha-Yoga, do professor Hermógenes me levou ao ioga”, diz. Praticante há três anos, Vanderlei Grütz­­mann conta que com um ano de prática já fazia movimentos com o corpo que não imaginava ser possível e não passa um dia sequer sem seus exercícios. “Logo após os primeiros movimentos já senti diferença no meu corpo, apenas o fato de me colocar em uma postura e observar as sensações e a respiração já me fizeram dormir melhor. Hoje meu padrão mental mudou, antes sentia muita pena de mim e as dores me causavam grande sofrimento. Compreendi que muitas vezes a dor é inevitável, mas o sofrimento é opcional. Sou uma pessoa muito mais consciente de mim mesmo e do meio em que convivo. Isso foi importante também para a melhora dos meus relacionamentos”, conta.

O sentimento de união, promovido pelo ioga, fez muita diferença na vida do empresário Eduardo Sokoloski Junior, 53 anos. Ele, que pratica há 19 anos, depois de uma plaquinha em uma casa discreta ter chamado a sua atenção quando ia ao trabalho, levou a família inteira para o ioga. “Foi um divisor de águas. Eu era um executivo que dirigia seis empresas e não tinha tempo para mais nada. Hoje trabalho na minha própria empresa e o ioga é uma técnica que está incorporada na minha vida como escovar os dentes ou tomar banho”, diz. Ao lado da mulher Andréia, 42 anos, e da filha Ana Laura, 6 anos, Eduar­­do conta que a família toda mudou com a filosofia indiana. “Minha filha me vê meditar desde que nasceu e fica muito feliz praticando. O ioga ajudou na harmonia da nossa casa e ensinou que se queremos que o mundo mude, temos que começar por nós mesmos”, conta.

Essa mudança se torna possível pelo autoconhecimento proporcionado pelo ioga, segundo Maria Angélica Sanches, professora da Yoga Ativa. “Quando a pessoa aumenta a percepção de si mesma, ela torna-se capaz de realizar as mudanças necessárias em sua vida”, conta Angélica, que deixou de lado a carreira de estilista para se dedicar ao ioga. “A demanda de trabalho era intensa, exigia um excesso de dedicação e horas extras. Foi uma atuação que me deu muita realização criativa e muito aprendizado no desenvolvimento de produtos de moda, mas também um alto grau de desgaste físico, mental e emocional. Na época isto me levou a procurar o ioga, pois sabia que era bem recomendado para altos níveis de estresse. Nos primeiros meses de aula eu costumava chorar muito durante as práticas físicas e respiratórias, eu aceitava as sensações, pois entendia que precisava limpar todo desgaste que havia gerado em meu corpo, em minha mente e no âmbito emocional. Criei coragem e resolvi seguir a fundo no autoconhecimento. Com passar do tempo fui resgatando minha saúde e meu bem-estar, além de perceber que não foi exatamente meu trabalho que me gerou o estresse, mas sim como eu me relacionava com ele”, conta.

É dessa percepção que o ioga trata e voltamos a mais um de seus ensinamentos. O autoconhecimento atenua o sofrimento causado pela ignorância, ou seja, pela falta de discernimento ou de clareza. Que sua busca esteja apenas começando aqui, ao final desta matéria. Como diz Bks Iyengar, “se sua abordagem é sincera e você tem fé em si mesmo, a orientação virá de seu interior.” Na­­mastê.

A Sabedoria e a Prática da Ioga, de BKS Iyengar (Publifolha).

Ioga Além da Prática, de Ruth Barros e Mario Américo (Integrare).

Yoga para Nervosos, de Hermógenes (Nova Era).

Yoga Ativa, Rua Coronel Dulcídio, 2281, Água Verde, fone (41) 3044-0207. Gaya Yoga Spa, Rua São Pedro, 479, Cabral, fone (41) 3013-1115. Corpo Tai, Rua Visconde do Rio Branco, 1.630, sala 1.803, fone (41) 3016-4008.

Comecei a praticar ioga e meditação há 20 anos. Com o ioga aprendi que o corpo é um reflexo do nosso interior e, com a meditação, que é essencial limpar a mente (que chamo de “tagarela confusa”) e mantê-la sob controle, para que ela não exerça domínio sobre as nossas emoções e atitudes. Fui para a Índia com um roteiro de 20 dias elaborado por uma agência especializada, já constavam sete dias no Ashram Dayananda Saraswati, em Rishikesh (Norte do país). O que mais me tocou durante o tempo que permaneci no ashram, foi a forte devoção, a simplicidade e o desapego das pessoas, que acima de tudo agradecem e se entregam apenas como um instrumento ao divino que habita dentro de cada um (seja ele Krishna, Jesus ou Maomé).

Fiquei hospedada em um alojamento simples, com uma biblioteca repleta de livros – em sânscrito e inglês –, sala de estudos, salão de refeições e um templo às margens do Ganges. Os rituais começavam às quatro e meia da manhã, com orações e a purificação no rio sagrado. O chá com leite era servido às sete horas. O almoço – arroz integral, “dal”(sopa) de lentilhas e batatas – era servido ao meio dia, em bandejões. Não existia café e toda a região era vegetariana – ou seja, para mim, o sacrifício estava completo.

Passava o dia descalça, lavava minha roupa e louça, era responsável pelos meus (poucos) pertences, acompanhava a distribuição de comida e remédios à comunidade, consultava os livros e me entregava à oração, à meditação e aos mantras no templo. O silêncio era quase absoluto. A verdade, para os santos ‘swamis’, não podia ser ensinada ou expressa em palavras.

Acredito que tudo o que fica pronto na vida foi construído antes, na alma. E para manter esta alma (essência divina) acordada, descobri que é necessário cessar o turbilhão da mente(confusão), pela meditação (clareza), conservando-a pura através do equilíbrio entre corpo, mente e espírito, que se atinge com o ioga (união).