Saúde e Bem-Estar

Da redação

Estrela de “Girls”, Lena Dunham revela sofrer de endometriose; conheça a doença

Da redação
10/02/2016 15:19
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A atriz e criadora de "Girls" revelou estar sofrendo da doença. (Foto: AFP)

A atriz Lena Dunham, criadora e estrela da série “Girls”, da HBO, revelou à imprensa norte-americana estar sofrendo de endometriose, uma condição que faz o tecido crescer do lado de fora do útero e que pode levar à infertilidade. A atriz de 29 anos já avisou aos fãs que não será capaz de promover a próxima temporada da série por conta da doença.
Em um post em seu Instagram, Lena escreveu: “Eu só queria avisá-lo que, embora eu esteja tão animada com o retorno de Girls no dia 21, eu não estarei dando entrevistas e participando de eventos para promover a nova temporada. Como vocês sabem, eu sofro de endometriose, uma condição crônica, que afeta a vida reprodutiva de 1 em cada 10 mulheres”.
Algumas mulheres passam anos sem saber que têm endometriose. São, em média, sete anos e cinco médicos diferentes antes do diagnóstico, conforme o ginecologista Mauricio Abrão, especialista na doença. “É uma janela longa de sofrimento permeada pelo desconhecimento”, resume o médico responsável pelo setor de endometriose da Clínica Ginecológica do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP).
Uma vez por mês, os hormônios do ciclo menstrual fazem com que a camada interna do útero, o endométrio, aumente de tamanho para esperar uma possível gravidez. Se isso não ocorre, o endométrio descama e é eliminado em forma de menstruação. Só que, em alguns casos, suas células pegam o caminho errado e se alojam na cavidade abdominal, grudando-se, por exemplo, no intestino, nos ovários, nas trompas e na bexiga – o que provoca um processo inflamatório que caracteriza a enfermidade.
Doença camaleônica
O sintoma mais comum é a cólica forte e prolongada, muitas vezes tida como um sinal normal da menstruação. Por isso, pouca gente decide investigá-la. Abrão estima que entre 40% e 50% das adolescentes com cólicas fortes, “aquelas que têm de ser buscadas na escola porque não aguentam a dor”, sofrem de endometriose.
Mas a intensidade da dor pélvica, explica o especialista em reprodução humana Nilo Frantz, depende de onde estão localizados os focos de endométrio dentro do abdômen: se estiverem perto de áreas muito enervadas, como os ligamentos do útero, o desconforto pode ser muito sério, até incapacitante. “Em situações mais severas, a mulher pode sentir, também, dor durante o sexo e desconforto intestinal. Mas a endometriose é um camaleão: pode se apresentar de várias formas ou até mesmo não ter sintomas”, compara o médico que, semana passada, organizou um simpósio em Porto Alegre para discutir a enfermidade e a sua relação com a infertilidade.
De acordo com Frantz, a doença, além de alterar o sistema imunológico, interfere na anatomia das trompas, estruturas responsáveis por transportar o óvulo até o útero, dificultando a gravidez. Apesar de ser uma condição benigna, a endometriose, se não for tratada, pode comprometer os órgãos abdominais a ponto de a mulher perdê-los.
Desafio
A endometriose tem um apelido entre a comunidade médica: a doença da mulher moderna. Isso porque uma de suas principais causas é o fato de que, hoje, as mulheres preferem engravidar mais tarde e optam por ter menos filhos. Menstruam mais, portanto: cerca de 400 vezes durante toda a vida reprodutiva. No início do século 20, esse número era 10 vezes menor.
O estresse também é um fator que colabora para o desenvolvimento da doença, pois provoca picos de adrenalina, uma substância associada à liberação de estrógeno – o hormônio feminino que alimenta as células do endométrio, aumentando sua velocidade de crescimento. Não por acaso, os médicos observam mais casos de endometriose nas grandes cidades.
O desafio atual para os pesquisadores em endometriose e infertilidade é encontrar uma forma de diagnóstico que não seja a laparoscopia, procedimento considerado invasivo. A prática para ressecar os focos “fujões” de endométrio permite o acesso ao interior da pelve por meio de uma microcâmera, de bisturis pequenos e uma cânula de sucção, inseridos por pequenos “furinhos” no abdômen. “É algo bem agressivo, tive de ficar uma semana internada só para descobrir o que eu tinha”, relembra Gislaine.
Segundo o médico Mauricio Abrão, que também é coordenador dos cursos de pós-graduação em Ginecologia Minimamente Invasiva e Reprodução Humana do Hospital Sírio Libanês, em São Paulo, o Brasil está no topo das pesquisas que buscam o diagnóstico da endometriose por meio da boa e velha ultrassonografia, em uma técnica desenvolvida por ele e pelo grupo de endometriose do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP. “Para aplicar a técnica, é preciso treinar os radiologistas e solicitar à paciente um preparo intestinal simples. Apenas isso”, afirma Abrão, que considera a novidade uma “revolução” por diminuir o número de cirurgias.
Cura na menopausa
A cura da endometriose, segundo o ginecologista gaúcho Nilo Frantz, ocorre com a menopausa. “Mas não faz sentido esperar mais de 30 anos em sofrimento, sob pena de diminuir muito a qualidade de vida da mulher. É inaceitável que ela se acostume com a dor”, afirma.
Além das injeções de hormônio e da cirurgia para retirar os focos de endométrio dos órgãos pélvicos, anti-inflamatórios e analgésicos também podem ser administrados como tratamento, mas com cuidado: eles aliviam os sintomas, mas não tratam a doença em si. A pílula anticoncepcional de uso contínuo, por inibir a menstruação, é outra forma de tentar anular os sintomas da endometriose. No entanto, sob uma perspectiva cultural, essa alternativa não parece ter uma aceitação boa no Brasil, de acordo com as observações do ginecologista francês Charles Chapron, chefe do departamento de Obstetrícia e Ginecologia do Hospital Universitário Cochin, de Paris: “A maioria das mulheres brasileiras associa a menstruação ao feminino. Quando elas não menstruam, há uma sensação de perda de feminilidade”.
Conforme Frantz, a estratégia de tratamento é traçada com base no que a mulher deseja para o seu futuro: ter (mais) filhos ou não. A cirurgia, por exemplo, pode comprometer a reserva ovariana e piorar o estado reprodutivo da paciente. A fertilização in vitro surge como uma possibilidade de reprimir a endometriose: “A gravidez é um dos melhores tratamentos, pois confere um estado hormonal em que a endometriose ‘hiberna’, já que não há menstruação”.