Saúde e Bem-Estar

Transtorno bipolar

Denise Drechsel
28/08/2005 17:31
Aos seis anos, o menino acordava o pai às três da madrugada para andar de bicicleta; aos 11 estava fora da escola e ainda sem um diagnóstico para seus momentos de excesso de energia. Aos 35 anos, a empresária torrou 500 mil reais no shopping center. Aos 16 anos, a bailarina teve uma crise de choro dentro de um metrô e passou dias perdida entre gargalhadas e picos de tristeza. Aos 42 anos, o comerciante tentou suicídio após uma fase de bebedeira, promiscuidade sexual e direção perigosa.
Não, as histórias acima, todas reais, não são de “loucos”. Seus protagonistas, pessoas agradáveis, produtivas e com um fino senso de humor, sofrem do transtorno bipolar, distúrbio mental que faz o paciente transitar entre estados de euforia e egocentrismo a graves momentos de depressão, com tendência suicida. “Os altos e baixos são normais na vida. Nos bipolares, no entanto, a alegria e a tristeza atrapalham, causam sérios problemas”, diz o psiquiatra curitibano Sivan Mauer, coordenador do ambulatório de saúde mental da Clínica Heidelberg. “As oscilações de humor são próprias do transtorno bipolar. A mesma doença deixa o paciente deprimido, na cama, sem tomar banho ou comer. Em outros momentos, ele fica extremamente eufórico.”
Histórico
Até cerca de 30 anos atrás, a bipolaridade era entendida como psicose maníaco-depressiva, identificada em cerca de 1% da população. O sobe e desce marcante de humor, facilmente diagnosticável, é hoje classificado como transtorno bipolar tipo 1. Na década de 90, pesquisadores começaram a identificar casos mais sutis de bipolaridade, os de tipo 2 e de ciclotimia, talvez mais perigosos porque são de difícil diagnóstico. No caso da bipolaridade tipo 2, a pessoa fica a maior parte do tempo deprimida, mas tem momentos de euforia branda ou marcante. Já na ciclotimia, o paciente passa longos períodos de euforia com pequenas crises de depressão.
Atualmente, estudos estimam que a bipolaridade – em todos os graus – acometa 5% da população. “São quadros que se caracterizam por uma instabilidade afetiva. A pessoa tem momentos de hiperativação, de aceleração dos processos de pensamento, com uma energia aumentada, produtividade excessiva e uma maior propensão para a interação social. Você acaba de conhecê-la e ela já está te confidenciando coisas íntimas, fora de contexto”, ilustra o psiquiatra Dirceu Zorzetto, coordenador do Protha, Programa de Transtornos do Humor e Ansiedade do Hospital de Clínicas e professor da Universidade Federal do Paraná (UFPR). “Essas pessoas estão sempre em busca de novidades, querem agito, mas rapidamente se cansam daquilo”, continua.
Segundo os médicos, a impulsividade, nos estados em que se interpõe à depressão e à euforia, se torna perigosa, podendo levar ao suicídio. “Cerca de 80% das vezes que procura o médico, o bipolar o faz nos momentos de depressão. Na euforia o paciente não quer sair desse estado, pois tem a falsa idéia de normalidade. E aí é que mora o perigo, eles procuram normalmente um clínico geral, não preparado para os casos bipolares que, diante de um quadro depressivo como esse, prescreve antidepressivos”, descreve Mauer, que continua: “O antidepressivo não resolve a causa, apenas ajuda o paciente a voltar aos momentos de euforia e assim o ciclo continua”.
Conforme o psiquiatra Saint Clair Bahls, professor da UFPR e do UnicenP, além do uso de medicamentos específicos, o tratamento do transtorno bipolar necessariamente passa pela psicoterapia. “A psicoterapia é o diferencial que o ajuda a manejar as situações de estresse, de conflito, do próprio entendimento da doença e do tratamento”, afirma ele.