Tablets e celulares aumentam casos de miopia em crianças
Carolina Kirchner Furquim, especial para Gazeta do Povo
22/01/2019 12:00
As telas de tablets e smartphones são encaradas constantemente por crianças e adultos. Foto: Bigstock.
Elas estão presentes todos os dias, quase sempre por muito mais tempo do que deveriam. As telas de tablets e smartphones são encaradas constantemente por crianças e adultos. Ainda que sejam considerados um recurso imprescindível no dia a dia, esses eletrônicos também são responsáveis pelo aumento na incidência de doenças oculares, o que tem levado pacientes cada vez mais cedo para a consulta com o médico oftalmologista.
Parte considerável do tempo gasto em frente a uma tela é destinada à visualização de vídeos e outras imagens em movimento (como as de games, por exemplo), especialmente entre crianças e adolescentes. Segundo a médica oftalmologista pediátrica do Pietà Centro Médico e do Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Christie Michelle Graf, a visualização em excesso de vídeos é capaz de prejudicar a visão.
“É praticamente impossível proibir o uso dessas tecnologias, mas deve haver um controle de tempo rigoroso por parte dos pais ou responsáveis. As crianças estão passando cada vez mais tempo em ambientes fechados acompanhadas dessas telas, sempre muito próximas ao rosto. Isso faz com que os olhos focalizem apenas para perto, um mecanismo capaz de alterar o formato do globo ocular”, diz ela.
Essa modificação no formato favorece o desenvolvimento de miopia (que caracteriza a má visão à distância), uma condição cuja incidência já é muito mais elevada em comparação ao que se notava anos atrás. “O comum era diagnosticar pacientes com idades entre oito e 18 anos. Hoje, crianças em idade pré-escolar já apresentam cada vez mais o problema, que surge mesmo nos indivíduos sem a predisposição genética”, comenta a médica.
O médico oftalmologista do Hospital de Olhos do Paraná, Osny Sedano, concorda. “Bebês, crianças e adolescentes compõem um grupo sujeito a diferentes doenças oculares, algumas delas bastante graves. Além das doenças congênitas, o que se tem observado é um aumento nos casos de miopia entre crianças sem histórico familiar. Isso porque desde muito cedo elas estão próximas a livros, celulares, televisão e tablets”, avalia.
Ver vídeos no carro em movimento, ao contrário do que muitos podem pensar, não agrava ou estimula qualquer condição visual, de acordo com a médica. O que é comum é o surgimento de sintomas como náuseas, enjoo, mal-estar e cefaleia (dor de cabeça), mas que não se relacionam com a saúde ocular.
Adultos
Toda a tecnologia dos dispositivos móveis também é responsável pelo aumento de um desconforto visual experimentado, estima-se, por 70% a 90% da população adulta mundial: a fadiga ocular. “Essa condição se caracteriza pelo cansaço apresentado pelos olhos, ocasionado por horas a fio de esforço contínuo e intenso para a execução de uma determinada atividade”, explica Sedano. Segundo ele, os olhos não foram projetados pela natureza para focar e desfocar imagens próximas milhares de vezes seguidamente.
Costumam sofrer com a fadiga ocular pessoas que ficam horas focalizando um único ponto, geralmente telas de computadores, smartphones e tablets. Pessoas que leem materiais em papel regularmente ou são portadoras de problemas de visão não diagnosticados e tratados também estão sujeitas à fadiga. Em resumo, ela se manifesta graças ao estresse das funções oculares, que decorre de ajustes incontroláveis que os olhos precisam fazer para obter foco.
Os sintomas incluem dor nos olhos, olhos vermelhos, secos ou lacrimejantes, visão dupla ou embaçada, sensibilidade à luz e tremores ou contrações involuntárias das pálpebras. Cefaleia e estresse geralmente acompanham as queixas e a secura é fruto da diminuição no número de piscadas. “As telas dos celulares “pulsam” em uma frequência que nos deixa em alerta. Como resultado, piscamos menos, o que favorece a secura dos olhos”, explica o médico. Crianças também sofrem com os olhos secos, condição denominada síndrome pediátrica do olho seco, caracterizada pela evaporação do canal.
“Bebês, crianças e adolescentes compõem um grupo sujeito a diferentes doenças oculares, algumas delas bastante graves. Além das doenças congênitas, o que se tem observado é um aumento nos casos de miopia entre crianças sem histórico familiar. Isso porque desde muito cedo elas estão próximas a livros, celulares, televisão e tablets”.
Osny Sedano, médico oftalmologista do Hospital de Olhos do Paraná.
O tratamento da fadiga ocular depende da causa, mas, mudanças nos hábitos são obrigatórias. “Para prevenção, inclusive, a cada hora a recomendação é que os olhos descansem por dez minutos. Também é preciso diminuir a luminosidade da tela e posicioná-la a uma distância de 60 centímetros, abaixo do nível dos olhos, e condicionar-se a piscar de 15 a 20 vezes por minuto”, orienta Sedano. Usar colírios lubrificantes, óculos, lentes de contato e, eventualmente, se submeter a cirurgia para correção de grau também fazem parte do tratamento.
Condutas para a saúde ocular
Há um movimento chamado 20-20-20 Rule, da The Canadian Association of Optometrists (CAO), que recomenda que, a cada 20 minutos, se faça uma pausa de 20 segundos e focalize o olhar em um objeto localizado a 20 pés de distância (em torno de 6 metros). Outro hábito importante, segundo a oftalmologista Christie Michelle Graf, diz respeito ao aproveitamento da luz natural. “O fato de as crianças estarem muito dentro de casa também colabora com o surgimento ou piora da miopia. O sol é um importante fator de bloqueio na progressão da condição. Além disso, ambientes externos estimulam o olhar para longe, algo essencial na prevenção e controle”, assinala. A exposição solar deve ser sempre segura e a visita anual ao médico oftalmologista é indicada.
Preocupada com os altos índices de miopia entre crianças, a China desenvolveu carteiras escolares com barras que mantêm a cabeça dos estudantes a uma distância saudável dos livros e cadernos. O que não se pode negar é que o uso constante e abusivo de telas vem inaugurando uma nova era na saúde visual. “Impor limites é sempre recomendado. A Sociedade Brasileira de Oftalmologia Pediátrica (SBOP) preconiza que o uso de eletrônicos entre crianças não ultrapasse os 30 minutos diários e não aconteça antes dos dois anos de idade”, frisa Christie.