Saúde e Bem-Estar

Febre nas redes sociais, vídeos ensinam a relaxar e a dormir em poucos minutos

Amanda Milléo
24/08/2018 13:53
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Sons que funcionam como gatilhos para o relaxamento são a nossa sensação do Youtube (Foto: reprodução / Youtube)

Com a boca bem próxima ao microfone, a locutora inicia o diálogo aos sussurros. Em seguida, passa a emitir sons, ainda em volume baixo, ora passando um pincel no microfone, ora assoprando enquanto acaricia a câmera, ou mesmo batucando as unhas em uma superfície lisa. Os sons continuam, em média,  por 20 minutos. Esse é o roteiro de muitos vídeos ASMR, sensação no Youtube, que visam promover o relaxamento e ajudar o espectador a dormir melhor.
A partir desses sons e imagens, o ouvinte/espectador relata uma sensação única de arrepio e formigamento que começa na região da nuca, couro cabeludo e pode seguir para outras áreas do corpo. ASMR significa autonomous sensory meridian response, ou uma resposta meridiana sensorial autônoma que gera os gatilhos que procuram induzir o espectador ao relaxamento e, eventualmente, ao sono.
Esses gatilhos podem funcionar para algumas pessoas, enquanto para outras, não — embora existam vários vídeos no Youtube para diferentes tipos de triggers: desde quem gosta de ouvir alguém acariciando o microfone a quem prefira ouvir o som do mastigar. 
A técnica é de domínio público, de acordo com Samanta Fabricio Blattes Da Rocha, neuropsicóloga do Instituto de Neurologia de Curitiba e doutoranda pela UFPR, e ainda não há muitos estudos na área médica e da psicologia que descrevam os efeitos reais — sejam eles benéficos ou não. Isso não significa que a técnica não funcione:
“Quem pratica acredita que consegue, através da fala, do sussurro, relaxar a outra pessoa, e esse processo remete a outras correntes de técnicas de indução ao sono. Por exemplo, as técnicas de relaxamento por sons, que usam áudios de barulhos de ondas ou de outros sons da natureza para induzir ao relaxamento físico e mental”, explica a neuropsicóloga.
A especialista também consegue associar a técnica de ASMR com a ideia do mindfulness, que busca melhorar o estado mental da pessoa a partir do princípio de estar presente no aqui, agora, e até mesmo à hipnose. “O mindfulness usa também os recursos de indução criativa, que a ASMR também tem. A técnica remete ainda à hipnose, porque usa de gatilhos e comandos para levar a pessoa a um estado mais profundo de relaxamento”, reforça Rocha.

Sono certo?

Uma vez relaxada com os sons, a tendência é que a pessoa sinta-se tranquila, aproveite o momento de bem estar e consiga se encaminhar para o sono. E esse é o principal objetivo de quem busca (e de quem produz) esses vídeos.
Camila Klein, estudante de 20 anos, criou o canal Gaúcha ASMR há pouco mais de um ano e coleciona, até o momento, mais de 360 mil seguidores. Segundo conta, Klein recebe como feedback dos espectadores muitos relatos de como o ASMR ajudou em momentos de estresse extremo.
“Eu acredito que o ASMR se tornou um refúgio para muitas pessoas. Recebo mensagens do público que dizem que assistem porque se sentem envolvidos e acolhidos. Outros dizem que só conseguem dormir assistindo ou ouvindo ASMR. Para algumas pessoas, ele ajuda como um calmante contra crises de ansiedade e síndrome do pânico”, relata Klein, que diz usar os vídeos para pegar no sono mais rápido e melhor, embora não tenha problemas para dormir.
Pelo Youtube, em uma busca rápida pelo termo ASMR, surgem centenas de vídeos, entre estrangeiros e brasileiros que acumulam diversos seguidores. No Brasil, alguns dos canais com maior número de seguidores são a Sweet Carol agrega mais de 800 mil seguidores, a Gaúcha ASMR com os 360 mil, e a Sabrina ASMR, com 223 mil.

Repulsa e riscos

A resposta de relaxamento, porém, não acontece com todo mundo e muitos, ao invés de se beneficiarem, acabam sentindo repulsa aos vídeos. Para outros, os efeitos podem ser mais impactantes, e exigem cuidado dos espectadores.
“Quando temos contato com algo que parece muito interessante e renovador, é preciso que isso seja estudado com um cuidado maior, para ver a aplicabilidade e eficácia, além dos riscos. Como conhecemos muito pouco do ASMR, há vários relatos de bem-estar, mas e os riscos? Risco de uma sonolência maior, da pessoa ter dificuldades para despertar? Já vi relatos de quem dormiu durante 12 horas depois da ASMR, e esse é um período muito prolongado”, explica Samanta da Rocha, neuropsicóloga.
Da mesma forma, substituir uma medicação para sono, prescrita e orientada por um médico especialista, pelos vídeos do ASMR também não é indicado, por enquanto. “Quando pensamos em programas para dormir, é preciso pensar também nas causas para essa dificuldade do sono, que pode variar de uma apneia a uma roncopatia, síndrome das pernas inquietas, sono fragmentado. São várias situações que os vídeos ASMR não resolvem”, reforça a especialista.
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