Comportamento

Eloá Cruz, especial para a Gazeta do Povo

Guardiões das árvores

Eloá Cruz, especial para a Gazeta do Povo
22/06/2014 03:04
Embora alguns se preocupem somente com a sujeira que as folhas e flores fazem no quintal, outros estão empenhados em mostrar a importância da preservação de cada uma dentro da cidade. O empresário Carlos Eduardo Andersen, de 39 anos, ficou indignado quando soube que a velha paineira rosa seria cortada por reclamações da vizinhança. A exuberante árvore localizada na Rua João Havro, no bairro Boa Vista, viu muito casal apaixonado se encontrar debaixo de sua copa, vem abrigando passarinhos nos fins de tarde de verão e sempre encheu os olhos dos moradores mais velhos.
A quantidade de histórias da paineira rosa, uma das mais antigas moradoras do bairro, levou o empresário a lutar por sua sobrevivência. Andersen entrou com uma ação na Justiça em 2012 e alegou que não havia motivo para a retirada da planta. “Para evitar que a prefeitura começasse o corte antes da avaliação do caso pelo juiz, eu me amarrei junto à árvore por 16 horas. As pessoas começaram a apoiar a minha iniciativa, incentivavam, levavam lanche…”, recorda.
Depois de salvar a histórica paineira, Andersen soube de casos semelhantes envolvendo moradores de diversos lugares da cidade. “Ouvi muitos relatos e resolvi juntar todos num blog. Começamos a divulgar as ações da prefeitura e os casos das árvores para tentar quebrar esse ciclo negativo”, conta. Sua causa ganhou adeptos e atualmente dez voluntários participam do movimento Vândalo Verde. “Nós fizemos várias ações: distribuímos cartazes, saímos em grupos tocando músicas para denunciar cortes irregulares, fizemos resgate de mudas de árvores de grande porte e replantamos em lugares em que elas possam ter mais espaço”, resume o ativista.
Um bosque dentro do bar
Preocupado em harmonizar a cidade com a natureza, o proprietário do The Patch Art & Bar (Rua Prof. Brandão, 51 – Alto da XV), Ivo Durante, de 28 anos, resolveu criar uma espécie de pomar nos fundos do espaço cultural. “Há mais ou menos duas semanas eu e mais alguns voluntários, frequentadores do bar, estamos plantando árvores que dão laranja, limão galego, pêssego, mexerica, maracujá e jabuticaba”, revela. Segundo ele, a ideia é montar um espaço em que os visitantes possam ter mais contato com a natureza, com horta de temperos e um pequeno jardim florido. As mudas foram conseguidas com doações de amigos. O bar, administrado por Durante e seus dois irmãos, concentra diversas expressões artísticas, como música, artes plásticas e fotografia.
Jasmim do Imperador
Foi em 1961, escondida na bagagem do empreiteiro Massyuqi Watanabe, que a muda do Jasmim do Imperador, ou Flor de Ouro, veio do Japão para o Brasil, de navio. Ele e a esposa, Massao Watanabe, chegaram a tomar menos água durante a viagem para regar a planta. Ao chegar no Brasil, cujo clima é completamente diferente ao do Japão, Watanabe deu o pequeno Jasmim do Imperador para seu filho Seizo Watanabe, hoje com 89 anos, plantar em casa, na Rua Ana Berta Roskamp, no Jardim das Américas – por receio de que a planta não crescesse no solo quente de Londrina.
A relação com a árvore é afetiva: o Jasmim do Imperador é um símbolo da terra natal da família – a província japonesa de Mianyang. E remete também à época em que os Watanabe sofreram com o tsunami em 1933, que arrasou construções e destruiu cidades inteiras. Além de bela, ela exala um perfume adocicado na floração. Massyuqi Watanabe adorava esse cheiro de tal maneira que resolveu trazer o vegetal para o Brasil.
Os anos se passaram, a família foi crescendo e a árvore também. Massyuqi Watanabe envelheceu, assim como sua esposa, mas o Jasmim do Imperador não florescia. “Meus pais esperavam ansiosos pelo dia em que a árvore florescesse e ele pudesse sentir o cheiro de sua terra. Eles esperaram tanto que os vizinhos e alguns da família diziam que meu pai foi enganado pelo comerciante que vendeu a muda para ele”, contou Seizo Watanabe.
Finalmente, depois de longos anos de espera, a robusta árvore floresceu em agosto de 1975. Mas suas flores chegaram tarde demais: Massyuqi e Massao faleceram alguns meses antes. “Quando a árvore floresceu, a família dizia que foi graças à mamãe”, lembrou Seizo. E o perfume não lhe sai da cabeça: “O cheiro lembra manga, o aroma doce da maçã”, descreve.
Eram tantas flores que o quintal da família ficava forrado. Os moradores da região, quando passavam próximo à casa dos Watanabe, tentavam descobrir de onde vinha aquele aroma. “Muitas pessoas passavam e pediam uma muda da planta, e eu entregava”, lembra. Mas, infelizmente, a árvore não agradava a todos. “O vizinho da casa ao lado reclamou na prefeitura, dizendo que as raízes da árvore estavam prejudicando a estrutura da casa deles. A prefeitura veio até aqui, viu que a árvore estava doente e a cortou”, lamenta. Mesmo assim, Seizo Watanabe se consola por ter distribuído mudas da árvore para amigos e familiares: “Assim a árvore do meu pai vive um pouco em vários lugares do Paraná”.

Confira os guardiões